domingo, 15 de dezembro de 2013

“A Greve” – Sergei Eisenstein

Resenha Filme #2 – “A Greve” – Sergei Eisenstein (1924)



Como ponto de partida, torna-se necessário situar historicamente “A Greve” sob duas perspectivas: em primeiro lugar no que se refere ao contexto histórico em que esta produção foi realizada e em segundo lugar quanto ao contexto histórico do filme em si, desde que “A Greve” baseia-se em fatos da história Russa, do movimento grevista ocorrido naquele país sob o czarismo em 1914.
Este filme foi filmado em 1924, trata-se do primeiro longa-metragem de Eisenstein, que, então, contava com apenas 26 anos. 1924 é a data da morte de Lênin: a revolução bolchevique de outubro de 1917 e a guerra civil subsequente, que duraria até 1921, certamente eram eventos ainda marcantes naquela conjuntura. Aliás, o cineasta russo comumente convidava operários, homens e mulheres que participaram diretamente da revolução russa a fazer parte do elenco de seus filmes.

Esta produção conta ainda com a participação do Proletakutur, uma organização soviética destinada justamente a promover a educação e a cultura na nova nação que estava sendo construída. A participação daquele órgão sinaliza de qualquer forma certo caráter pedagógico por de trás da produção. Como não podia deixar de ser num contexto de construção do estado operário, há no filme nítida pretensão de não só relatar um episódio da história da Rússia, mas também conscientizar politicamente os telespectadores. Neste enredo, há um corte nítido entre patrões, polícia e setores operários comprados de um lado, e de outro os operários que se levantam em luta. Os primeiros são os vilões do filme e os últimos os seus heróis.
No que se refere à trama, trata-se de uma história comovente de uma greve operária num pequeno distrito russo. Antes da eclosão do movimento, percebe-se que os patrões de então já contavam  com espiões dentro das fábricas, responsáveis por denunciar qualquer atividade política no local de trabalho e, posteriormente, encarregados de entregar os líderes do movimento. A situação de trabalho não era diferente da situação da classe operária da Inglaterra muitos anos antes, de quando sua revolução industrial. Mulheres e crianças somavam-se aos homens no trabalho na fábrica. Os trabalhadores dependem dos patrões para comprar em seus armazéns alimentos e outros produtos básicos.

Os bolcheviques igualmente atuavam clandestinamente fazendo agitação política. Entretanto, o estopim do movimento ocorreria de maneira espontânea. Um aparelho de produção denominado "micrômetro" foi furtado. Um operário é injustamente acusado do delito pelos capatazes e, sem ter meios de defender sua honra, suicida-se dentro da fábrica. Os colegas que já o encontram morto descobrem a história por meio de sua carta de suicídio. E diante de uma revolta já acumulada frente aos capatazes que tratavam brutalmente os operários, decidem parar a produção. Reivindicavam jornada de 8 horas de trabalho; tratamento humano dos capatazes; aumento salarial de 30% e plano de carreira.
Um aspecto muito interessante neste momento é observar como os trabalhadores aparecem no filme como uma espécie de coletividade capaz de adquirir consciência e agir politicamente coordenadamente. Isso se revela, no filme, em momentos em que o impulso do movimento espontâneo não reduz a capacidade daquela coletividade saber identificar em todos os momentos quem são os adversários, o que é uma provocação e como reagir diante da repressão. Ao final, a medida que aquela coletividade é brutalmente reprimida e morta pela polícia, Eisenstein combina poeticamente imagens da policia baleando os operários e imagens de um touro forte e robusto sendo abatido, enquanto resiste até a morte. Naquele momento, a classe operária mostrava a sua força (equivalente a de um touro), mesmo que ao final daquele movimento tivesse sido a derrota.
A história daquela greve, ainda que derrotada, certamente interessava naquele momento de afirmação do estado operário. Ainda longe da etapa do culto à personalidade (algo que certamente não teria sido tolerado por Lênin), a Greve torna-se ainda mais bela na medida em que valoriza menos as lideranças e mais a atuação conjunta dos operários. Fazer com que os trabalhadores e o povo confiassem nas suas próprias forças pode ter sido um dos objetivos de Eisenstein ao filmar esta obra.      

Nenhum comentário:

Postar um comentário