Resenha Livro #82 “Introdução ao Estudo do Direito” – Alysson Leandro Mascaro – Ed. Atlas – 4ª Edição
Advertimos o eventual leitor deste texto que os propósitos deste
espaço virtual têm maior caráter político do que acadêmico. As resenhas são
análises críticas de diversas espécies de obras literárias, análises voltadas à
denominada “batalha das ideias”, à luta contra-hegemônica desde uma perspectiva
anti-capitalista.
Isto significa que o leitor que chegou a este blog interessado num
resumo do livro de Alysson L. Mascaro, infelizmente terá de continuar fazendo
sua legítima busca, seja para preparo de trabalhos acadêmicos, seja para
estudos para provas universitárias. Certamente, para tais fins seria necessária
não uma resenha crítica, mas um relato, capítulo, por capítulo, de todos os
temas abordados pelo autor (a norma jurídica,
o ordenamento jurídico, as antinomias, as lacunas, a hermenêutica,
etc.). Nossa proposta de trabalho aqui, todavia, é outra. Interessa-nos fazer uma
reflexão analítica e mais geral deste livro de Introdução ao Estudo do Direito,
sempre se orientando pelas premissas do marxismo, o que, aliás, também é o caso
da obra do professor Mascaro.
Via de regra, “Introdução ao Estudo do Direito”, como o nome já
sugere, é disciplina ministrada no 1º e/ou 2º semestres dos cursos
universitários de direito. Esta disciplina busca delinear os institutos mais
essenciais do ordenamento (ou sistema) jurídico. Reflete-se sobre o que é o
direito, qual a sua origem histórica, como se deu sua evolução na história, as
principais correntes de pensamento jurídico filosófico ao longo desta evolução.
Também se estudará aqui temas eminentemente “jurídicos” como a definição de norma jurídica e da lei,
o problema da validade, da vigência, do vigor e da eficácias normativas, a
hermenêutica (interpretação) com suas sub-espécies, como a interpretação
gramatical (que parte da literalidade da lei) ou a interpretação teleológica
(que parte dos fins a serem atingidos pela lei), e etc.
Neste manual de Introdução ao Estudo do Direito o aluno do 1º ano terá
acesso a todos estes itens fundamentais com um acréscimo decisivo. O autor
diferencia-se, por exemplo, de um manual estritamente juspositivista como “Introdução
à Ciência do Direito” de André Franco Montoro já que não se limita a definições
formais (ou “jurídicas”) dos institutos basilares do direito, mas sim,
privilegia as relações sociais e de produção, as estruturas que engendram o
direito, o estado e as suas instituições, conforme às exigências de produção e
reprodução capitalista. Trata-se da perspectiva crítica que se delimita dentro
do que Mascaro chama dos três caminhos do pensamento jurídico contemporâneo
(tema também abordado em seu curso de “Filosofia do Direito”, com mais
profundidade).
As três grandes linhas mestras são as correntes juspositivistas,
expressas em Hans Kelsen (autor do séc. XX identificado com o liberalismo
clássico), correntes não juspositivistas como o decisionismo de Carl Smitt
(este tendo sido simpático ao regime nazista) e, finalmente, a perspectiva
crítica, que atingirá o nível de
compreensão mais profundo do fenômeno jurídico.
A reflexão sobre a definição do que é Direito, o provável ponto de
partida de qualquer curso de Introdução ao Estudo do Direito, só pode ser
melhor encaminhada pelo pensamento crítico e histórico.
Ao contrário do pensamento positivista, que limita o fenômeno jurídico
à norma jurídica (num esforço de “purificar” o direito da história, da
política, das relações de força das classes sociais), o pensamento crítico
delimita o direito como um fenômeno que não é “a-histórico” ou que, de certa
forma, evoluiu constantemente desde os mais primórdios da civilização. Não é
possível comparar o direito da antiguidade e da idade média com o direito da
era moderna e contemporânea, que só ganha contorno e especificidade com a
conformação do capitalismo e dos estados modernos. O direito até a modernidade
é um misto de religião, moral e arte. É só com o capitalismo, com suas
exigências de previsibilidade para a consecução das trocas comerciais ou com
sua necessidade de criar contratos para viabilizar a venda da força de trabalho
no mercado, que vão criar as figuras jurídicas correspondentes (e edificantes
do atual ordenamento/sistema) como “sujeito de direito” ou “direitos subjetivos”.
Antes o direito assimilava-se à arte, correspondia a um ato de poder
direto (e não mediado pelo estado) e se dava a partir da aplicação do direito ao
caso concreto, sem qualquer uniformização como as codificações legais que
surgiriam por exemplo com o Código Civil Napoleônico. A emergência da burguesia
como classe dominante com o desenvolvimento capitalista engendrou por assim o
direito, que, portanto, em última análise, serve para a reprodução da ordem de
dominação burguesa.
Isto não deve levar o jovem estudante do direito movido pela
utopia/esperança de um mundo menos injusto a abandonar o curso de direito, dada
o alinhamento inevitável do estado, das suas instituições e do direito que os
regram às exigências da sociedade capitalista (transações comerciais,
exploração do trabalho, contenção da luta de classes, etc.).
O último tópico do livro tem o belo nome de “Das esperanças do Jurista”.
Neste capítulo, Mascaro traça um panorama histórico do conceito de justiça na
história. No capitalismo, com a conformação do estado com seus três poderes a
emanar, especialmente, mas não só, pelo legislativo, normas jurídicas, dada a
necessidade da segurança jurídica, da exigência da previsão da resolução dos
conflitos sociais por uma norma unificadora, o justo confunde-se com o que é
legal, com o que está na norma jurídica. Assim, um morador de rua faminto que
furta um pão, pela ótica do justo enquanto o que se extrai da norma, teria que
considerar correta a perpetuação da fome de milhões sob as custas da extrema
fartura de muito poucos. A justiça estaria na punição do faminto pelo crime de
furto e aplicação de pena já que o justo é o que está subsumido na norma. Daqui
se extrai um caso de aberrante injustiça material e social, mas legitimada pelo
justo legal. Ocorre que é justamente o jurista que não abandona de vista a
busca pela justiça (não só formal, mas pelo justo concretizado na realidade)
aquele mais necessário para se somar às luta sociais e dos trabalhadores por
transformações. Existem muitas trincheiras de lutas a serem abertas e
defendidas por aqueles que lutam pela sociedade igualitária, sem classes
sociais, pós-capitalista por meio do Direito. E assim termina o livro do prof.
Mascaro:
“O jurista médio, frio e
tecnicista, só tem olhos às normas jurídicas estatais. O grande jurista tem os
olhos voltados à esperança de um mundo justo”.
amigo poderia fazer uma resenha do cap 9 desse mesmo livro ate terça feira?
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