Resenha Livro #87 “Imperialismo, Estágio
Superior do Capitalismo” – V. I. Lênin – Ed. Expressão Popular
Este ensaio
econômico de Lênin foi publicado pela primeira vez em 1917. Trata-se de uma
síntese extremamente sólida e coerente do sistema capitalista mundial das três
últimas décadas do séc. XIX até o início imediato do século XX, momento de
apogeu da nova fase monopolista do modo de produção capitalista.
Lênin serve-se
de um vasto arsenal de pesquisas quantitativas e dados numéricos sobre a
produção industrial e sua associação ao capital bancário, a nova partilha do
mundo com o aumento das possessões territoriais e populacionais das potencias
imperialistas bem como análises mesmo de economistas burgueses que, diante dos
fatos, são obrigados a reconhecer a mudança qualitativa da natureza do sistema
capitalista decorrente daqueles novos números.
É bom pontuar
que a própria noção de “Imperialismo” não é original de Lênin. O conceito já
era moeda comum dentre os analistas contemporâneos do dirigente da revolução
russa, com a diferença – aí sim fundamental – quanto ao sentido dado àquele
fenômeno histórico. Para Lênin o imperialismo é uma fase superior e transitória
do capitalismo.
O fenômeno é
marcado pela transformação do capitalismo da livre-concorrência pelo
capitalismo monopolista dos cartéis. Pela transformação do capitalismo voltado
ao comércio ao capitalismo voltado à exportação de capitais. (E aqui, cabe um
comentário perspicaz citado por Lênin que vem da boca de um economista burguês.
O imperialismo engendra uma relação de dominação ainda mais intensa sobre as
colônias entre outros justamente pelo fato da relação credor e devedor ser mais
duradoura e premente do que a relação entre comprador e vendedor).
Outro traço
específico do Imperialismo é a fusão do capital bancário e do capital
industrial, subordinando o segundo ao primeiro. Lênin dedica um capítulo inteiro
para análise dos bancos e revela como estes – por meio do controle da concessão
de créditos – foram paulatinamente obtendo hegemonia tanto no âmbito da
produção industrial quanto mesmo no âmbito da política. Há a conformação de uma
“oligarquia financeira” em que os mesmos diretores dos cartéis de bancos ocupam
simultaneamente cadeiras em conselhos administrativos da indústria, do comércio
e dos governos. Isto só foi possível com a concentração da produção e do
capital num grau jamais visto na história. Desempenham papel decisivo em
especial nos investimentos que demandam larga quantia de dinheiro, como as
linhas de trem ou a exploração do aço. E, aqui, entra o papel da partilha do
mundo e do novo colonialismo. (Imperialismo). A concentração de capitais
volta-se aos países periféricos em busca de matérias primas – e a partilha
territorial do mundo entre as potências capitalistas, longe de caminhar para um
equilíbrio, conforme as teses dos economistas burgueses, é fonte constante de
deslocamento das relações de forças e agudização de conflitos.
Estados Unidos
e Japão disputam a hegemonia no extremo oriente. Os Japoneses direcionam sua
atenção para a conquista da China. Se em meados do séc. XIX, menos da metade do
território africano está dividido entre os imperialismos, ao final do mesmo século,
9/10 de todo aquele território já estaria sob o domínio de Alemanha, França,
Inglaterra e Itália. A América Latina teria inicialmente a Inglaterra como a
principal credora: a partir do séc. XX tal hegemonia seria contestada pelos
EUA, em que pese as supostas boas intenções da denominada “Doutrina Monroe”
Numa breve
síntese, Lênin destaca as cinco características fundamentais do imperialismo:
(i) a concentração da produção e do capital alcançou um grau tão elevado de
desenvolvimento que criou os monopólios; (ii) a fusão do capital bancário com o
capital industrial e a criação, baseada nesse capital financeiro, da “oligarquia
financeira”; (iii) exportações de capitais se sobrepondo a exportações de
mercadorias; (iv) formação de associações internacionais monopolistas de
capitalistas que partilham o mundo entre si; (v) conclusão da partilha
territorial do mundo entre as potências capitalistas mais importantes.
Um último
aspecto decorrente da análise econômica diz respeito especificamente ao
movimento operário, qual seja, a conformação da “aristocracia operária” dentro
dos países imperialistas. Trata-se de um setor corrompido do proletariado que,
remunerado pela nova oligarquia financeira, irá buscar submeter o movimento
operário aos interesses imperialistas. A falência da II Internacional em 1914
expressaria de forma definitiva o papel da “aristocracia operária”, abandonando
o movimento socialista o princípio do internacionalismo e fazendo capitular os
partidos socialistas aos interesses chauvinistas das burguesias imperialistas.
Lênin faz aliás menção a Engels que já observava o fenômeno no final do séc.
XIX no movimento operário inglês.
Se de um lado,
o capitalismo monopolista representa a mais completa socialização da produção,
esta mesma passa a ser propriedade de um grupo cada vez mais restrito de
capitalistas. Isto significa que o imperialismo acentua as contradições sociais,
acentua a luta de classes e para Lênin, tratar-se-ia de um estágio transitória
que poderia abrir caminho para o socialismo. Outra tendência seria a da
acentuação dos conflitos pela partilha do mundo, que efetivamente resultou na
primeira Guerra Mundial.
A
originalidade do estudo de Lênin não diz respeito tanto ao esgotamento da
análise econômica do capitalismo europeu e mundial de fins do Sec. XIX e começo
do XX. Rosa Luxemburgo já o fez num estudo de maior extensão. O que caracteriza
o pensamento de Lênin é o esforço de sempre relacioná-lo com a ação política. E
aqui, as tendências imperialistas do capitalismo mundial servem ainda hoje de
base para saber interpretar o sentido das mobilizações e das lutas da periferia
capitalista, assim como delinear, conforme observado, nos próprios países
imperialistas, movimentos no sentido de cooptação do movimento operário – “aristocracia
operária”.
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