domingo, 8 de março de 2015

“A Década Neoliberal e a Crise dos Sindicatos no Brasil” – Adalberto Moreira Cardoso

“A Década Neoliberal e a Crise dos Sindicatos no Brasil” – Adalberto Moreira Cardoso 



Resenha Livro #157 - “A Década Neoliberal e a Crise dos Sindicatos no Brasil” – Adalberto Moreira Cardoso – Ed. Boitempo 

Adalberto Moreira Cardoso é doutor em sociologia pela USP, professor da IUPERJ e especialista em sociologia do trabalho. E foi no âmbito da Instituição carioca que pesquisou e produziu os artigos que compõe este trabalho. A pesquisa tem como fio condutor a relação entre o movimento sindical brasileiro e as políticas neoliberais que redesenharam tanto o mundo do trabalho quanto as perspectivas de organização, confiança e legitimidade que os trabalhadores dariam aos sindicatos a partir dos anos 1990. 

O que se observa na verdade é que a década neoliberal abre o momento de crise no movimento sindical brasileiro que vinha de uma importante ascensão política desde os anos finais da ditadura. 

Nos anos 1980, há a emergência da CUT que ganha densidade política e apelo junto aos trabalhadores diante da crise econômica e da insatisfação da população e dos trabalhadores diante dos sucessivos planos econômicos fracassados. A estratégia Cutista então de se posicionar como uma oposição irrestrita aos governos da ordem, além de outros elementos como a baixo índice de desemprego (que favorece o desenvolvimento das greves ao não intimidar os trabalhadores à luta) e as altas taxas de inflação associadas às políticas de contenção de salários foram alguns dos elementos constitutivos do protagonismo político do sindicato (centralmente da Central Única dos Trabalhadores)  no período anterior ao advento neoliberal. 

A partir da década de 1990, com as privatizações, as pressões do mercado mundial por mudanças nas empresas no sentido de maior competitividade exigindo corte de custos (leia-se diminuição de direitos laborais) que se culmina na desregulamentação do mercado de trabalho e flexibilização de leis trabalhistas, demissões e fechamentos de postos de trabalho diante do desemprego estrutural e do uso de novas tecnologias, estes e outros elementos passam a ser investigados pelo pesquisador em suas interfaces com o mundo do sindicato, com o direito sindical e com o direito do trabalho. Neste último caso, Cardoso demonstra como nosso modelo de pacificação estatal entre capital e trabalho se baseia no modelo legislado (e não no negociado partindo da Negociação Coletiva) constatando ademais que o “alto custo” celetista é resolvido pelos empregadores brasileiros simplesmente não adimplindo as suas obrigações legais para depois estabelecer acordos junto à Justiça do Trabalho – a racionalidade econômica do empresário leva-o a tal prática que lhe sai mais em custo do que o respeito literal à norma legal levando, a partir dos anos 1990, à uma explosão das demandes individuais na justiça do trabalho. 

O Plano Real e suas repercussões no mundo do trabalho como não poderia deixar de ser também seriam parte da crise sindical. A abertura comercial e financeira expôs o mercado de capitais e de bens à pressão competitiva internacional engendrando as pressões sobre os trabalhadores supracitadas. O resultado ademais foi o de aumento das terceirizações, sub contratação  e criação de mecanismos internos de solução de conflito fora da esfera jurisdicional. 

Dentro deste ambiente, os Sindicatos deixam de ser atores políticos e referências de negociação coletiva através de ações políticas em que a greve é a principal arma de defesa dos trabalhadores (modelo dos anos 1980) para atuar centralmente como um órgão assistencialista, inclusive oferecendo advogados aos seus filiados para litigarem em ações individuais do trabalho. Neste contexto neoliberal, portanto, pode-se falar numa despolitização dos sindicatos ou mesmo em sua crise. 

Em termos mais amplos esta crise se enquadra dentro do contexto da reestruturação industrial com suas mudanças no mercado de trabalho. Há se observar aqui a destruição de empregos formais, uma tendência que caminha pari passo com o enfraquecimento dos sindicatos. E talvez mais importante: “(...) os sindicatos e as centrais sindicais perderam uma parcela importante de sua capacidade de funcionar como galvanizadores, promotores ou representantes de identidades coletivas de caráter político”. 

Quanto a este último ponto, uma das chaves explicativas é investigada pelo sociólogo a partir de pesquisas quantitativas envolvendo o grau de confiabilidade dos trabalhadores junto aos sindicatos. Dentre as instituições democráticas como um todo, as pesquisas demonstram uma tendência de baixa confiabilidade. E o Sindicato não escapa com números de 27,13% de confiança para não filiados e 37,12 para filiados. A título de comparação, no universo de trabalhadores filiados, temos em grau de confiabilidade Igreja (60,49), Associação de Pais (58,16), Imprensa (34,89) e Polícia (20,67).

A conclusão da vasta e minuciosa pesquisa de Adalberto Moreira Cardoso é a de que a década neoliberal promoveu um período de letargia dentro do movimento sindical brasileiro. Sua análise tem como ponto de partida dados objetivos da economia, levantamentos estatísticos e de opinião da população e dos trabalhadores e números acerca de processos e pedido em varas trabalhistas de modo a buscar compreender com tais dados da realidade explicam a atual situação dos sindicatos hoje. 

Um outro momento seria o de avaliar as responsabilidades políticas dos dirigentes sindicais (em particular da CUT) que igualmente fizeram escolhas diante desta conjuntura e que têm supostamente sua parcela de responsabilidade para a atual situação de paralisia e defensiva do movimento sindical brasileiro. Ademais, a pesquisa de Cardoso pouco avança no que tange o denominado “sindicalismo de resultado” que iria mesmo se manifestar no governo posterior ao governo FHC como o exemplo da proposta de lei do Acordo Coletivo Especial pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC da CUT. Ou seja, a pesquisa, ainda que excelente, já parece estar desatualizada diante de alguns novos movimentos que ocorreram desde os governos do PT e que não repercutiram, como esperado, em maior combatividade dos sindicatos.  

Atualização - resenha escrita antes do Golpe de Estado perpetrado contra governos do PT e em momento em que graves reformas trabalhistas, incluindo o negociado sobre o legislado, terceirização irrestrita e retirada de demais direitos da CLT se vislumbram numa nova etapa, bastante diferente da conjuntura anterior.     

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