Resenha
livro # 116“Estado e Forma Política” – Alysson Leandro Mascaro – Ed. Boitempo
Advertimos
o eventual leitor desta resenha que o objetivo deste estudo não envolve
qualquer preocupação de tipo acadêmico: não encontrará aqui um resumo geral desta
obra do professor Mascaro desde que o objetivo deste blog não diz respeito aos trabalhos
da universidade: o objetivo deste blog é o de servir como uma pequena
trincheira virtual da luta de classes, discutindo livros e incentivando sua leitura, e não o contrário.
Faremos
aqui um breve relato geral do “Estado e Forma Política” e destacaremos uma passagem
a partir da qual proporemos algumas reflexões.
Considerações
Gerais
Alysson
Mascaro é filósofo e jurista, professor da Faculdade de Direito da USP e da Pós-Graduação
da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Publicou os livros “Filosofia do
Direito” e “Introdução ao estudo do direito”(resenhado por este blog) pela
Atlas e “Utopia e direito: Ernt Bloch” pela Quartier Latin. Prefaciou,
finalmente, “Em defesa das Causas Perdidas” do renomado filósofo esloveno Slavoj
Zizec.
Neste
livro o tema abordado é a relação entre o Estado e a sua conformação na
história diante das distintas fases do modo de produção capitalista.
Mascaro
parte de um ponto de vista original e que, aqui, se distingue de um certo senso
comum no âmbito da esquerda segundo o qual o estado seria o mero “órgão ou
aparelho gestor” das classes dominantes que o utilizam como mera forma de
dominação sobre as classes dominadas.
Avançando
sobre tal perspectiva rudimentar, Mascaro irá detalhadamente analisar as
relações entre Estado e reprodução capitalista, a forma política e as
instituições políticas, a relação entre a forma política e a forma jurídica, o
problema da autonomia do estado (fenômeno que ocorre apenas nas sociedades
capitalistas com a efetiva separação entre economia e política), o estado e sua
especificidade histórica e o estado e a luta de classes; enfim, Mascaro irá destrinchar
de maneira pormenorizada o tema da forma política estatal tanto na história
como na sua concretização no capitalismo na sua forma jurídica. Há o objetivo
de demonstrar como o estado tal qual o conhecemos é um fenômeno típico da
sociedade capitalista, uma tese que não é consensual, mesmo dentro do marxismo.
Obviamente
existia estado em sociedades pré-capitalistas. Mas, alerta Mascaro, a forma
política estatal tal qual conhecemos hoje com as figuras do sujeito de direito
(que permite pela primeira vez capitalistas e trabalhadores transacionarem as
forças de trabalho), a separação do estado em relação às classes possuidoras e
sua relativa autonomia como momento necessário para o regular funcionamento do
capitalismo, proteção da propriedade, delimitação de fronteiras, etc., esta
forma política é necessariamente capitalista: e, outra conclusão importante
aqui, dentro desta forma ou dentro deste estado, não é possível pensar alternativas
societárias distintas em que pesem todas as ilusões dos setores reformistas da
esquerda que alimentam esperanças em construir o socialismo por meio do estado.
Os
dois últimos capítulos do trabalho de Mascaro tratarão de temas mais
específicos ao universo dos operadores do direito: o penúltimo “pluralidade de
estados” discutirá a questão das relações internacionais e introduzirá a noção
de imperialismo dentro do sistema de estados. E aqui temos uma analogia entre
como a forma política se materializa e como ela se dá em sua aparência.
Formalmente os estados tem sua soberania reconhecida e são supostamente iguais,
com direitos garantidos perante as organizações internacionais. Materialmente é
o poder econômico internacional (imperialismo) que determina as relações de
dominação e subordinação. Já o último capítulo aborda um tema novo e pouco
discutido na esquerda que é o da regulação e estado, qual seja, a busca dos
ciclos de crise e dos elementos comuns dentro das distintas fases do
capitalismo.
A
regulação também é estudada no âmbito da economia, mais comumente pelas escolas
não marxistas, que buscam soluções para as crises cíclicas do capital. No
âmbito do marxismo, o estudo dos fenômenos cíclicos da crise são importante
para se identificar os impactos ou efeitos dos problemas econômicos nas
instituições políticas: identificar relações entre o desemprego em massa e o ascenso
de partidos de direita, como ocorre neste momento na Europa, por exemplo. Temos
aqui um recorte de estudos que aparenta ser mais estudado por aqueles que se
colocam do lado do mundo do trabalho.
Destaques
“Não
é porque determinado instituto político já tenha existido antes do capitalismo
que ele seja o embrião causal do Estado. A forma estatal nasce da produção
capitalista, da exploração do trabalho assalariado, da conversão de todas as
coisas e pessoas em mercadorias. Os institutos sociais e políticos do
capitalismo são criados ou transmudados num processo de convergência à forma. É
possível que se vejam vestígios históricos dos atuais corpos de magistrados e
promotores de justiça em antigos inquisitores da igreja. É possível que até
mesmo os ritos, as nomeclaturas, as vestimentas, os locais e as práticas
simbólicas dos administradores do Poder Judiciário moderno sejam transplantados
de instituições de julgamentos religiosos medievais. Mas a forma moderna de
tais instituições se constitui a partir
de específicas modalidades de reprodução social, que se valem dos ritos e das
nomeclaturas para objetividades de prática social próprias e específicas. Não é
porque os romanos chamam a uma instituição política sua por Senado que a
moderna instituição do Senado nos Poderes Legislativo seja, material,
estrutural e funcionalmente, igual à do passado. As instituições são
reconfiguradas pelas formas sociais, num entrelaçamento estrutural”
E
esta forma social ou forma política dará ao termo o conteúdo do tipo de relação
social que se estabelece na infra-estrutura. Pode-se ter como exemplo dois
sujeitos. O primeiro ordena que o segundo corte o capim do primeiro. Apenas com
estas informações não temos como descobrir qual o tipo de relação social ou
qual o modo de produção perpassa a relação entre os dois sujeitos. Mas com a
forma política ou a sua expressão jurídica contratual, podemos decifrar a
infra-estrutura (modo de produção). Assim, se o primeiro ordena que o segundo
corte o capim caso contrário será o segundo morto, temos o modo de produção escravagista.
Se o primeiro ordena que o segundo corte o capim caso contrário o segundo será
expulso de suas terras e não terá direito aos benefícios de proteção temos uma
relação do tipo feudal. Se o primeiro ordena que o segundo corte o capim por
que o segundo assim o quis (consoante um contrato de trabalho) temos uma
relação do tipo capitalista. Daqui vemos claramente a importância da forma
política como elemento que irá talhar e determinar a relação de exploração. Daí
a centralidade do direito, visto aqui numa nova perspectiva, que vai muito além
do mero “gestor dos interesses imediatos da classe dominantes”.
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