quinta-feira, 3 de abril de 2014

"Luiz Carlos Prestes: o combate por um partido revolucionário (1958-1990)" - Anita Leocadia Prestes

Resenha Livro #109 - "Luiz Carlos Prestes: o combate por um partido revolucionário (1958-1990)" - Anita Leocadia Prestes - Editora Expressão Popular



Anita Leocadia Prestes é historiadora de formação, segue orientação teórico-metodológica (e política) marxista e é filha de Luiz Carlos Prestes e Olga Bernário. Provavelmente, aquele casal seria mais conhecido pelo grande público através do filme "Olga" uma produção cinematográfica da Rede Globo, muito pouco preocupada, como é de se supor, com o legado e a tradição do movimento comunista, bem como a importância específica do dirigente Luiz Carlos Prestes. Trata-se antes de filme bastante comercial, que em seus destaques dos encontros e desencontros amorosos de Prestes e Olga, bem como o trágico fim do casal, mais parece com uma novela global.

Este relato histórico de Anita Leocádia Prestes em nada se assemelha com o filme supracitado. Esta advertência aliás já surge na introdução, quando a autora comenta a sua referência historiográfica e sua proposta metodológica. Anita tem como objetivo descrever a trajetória política de Prestes e do PCB do período que vai da Declaração de Março de 1958 até a morte do cavaleiro da esperança em março de 1990. O que há de se destacar aqui é que Anita busca fontes oficiais do partido e da imprensa partidária: não está interessada numa narrativa "jornalística" que irá dissertar acerca de detalhes da vida privada. Sua orientação é muito mais objetiva pois tem como escopo oferecer informações objetivas sobre a trajetória política de Prestes, em que pese todas as falsificações e calúnias, dos inimigos de classes e dos adversários políticos.

O estudo tem como ponto de partida um momento já de plena adesão de Luiz Carlos Prestes ao marxismos-leninismo, quando já era secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro, em 1958. Tratava-se de momento em que JK presidia o Brasil, e, no âmbito internacional a bipolarização internacional da Guerra Fria acentuar-se-ia (em especial com o progresso da URRS, com a revolução chinesa e em 1959 com a revolução cubana). Diante daquela conjuntura, a direção nacional do PCB iria firmar um entendimento etapista da revolução brasileira, tendo aqui bastante influência com por um lado Revolução antiimperialista na China e por outro a voga desenvolvimentista e remotamente nacionalista dos anos JK.

Assim discorria o PCB:

"A revolução no Brasil, por conseguinte, não é ainda socialista, mas anti-imperialista e antifeudal, nacional e democrática. A solução completa dos problemas que ela apresenta deve levar à inteira libertação econômica e política da dependência para com o imperialismo norte-americano; à transformação radical da estrutura agrária, com a liquidação do monopólio da terra e das relações e das relações pré-capitalistas de trabalho; ao desenvolvimento independente da economia nacional e à democratização radical da vida política".

Havia então um entendimento dominante dentro da esquerda e no partido comunista de que a revolução no Brasil não poderia ser imediatamente socialista, mas anti-imperialista, antifeudal, nacional e democrática. Nestes marcos, pensava-se ser aceitável e até oportuno aliança política com frações da burguesia nacional em suposta contradição com os monopólios estrangeiros. No fundo, tratava-se de uma luta pelo desenvolvimento de uma via autônoma e democrática do capitalismo na periferia do sistema, o que se mostraria na prática, inviável. A tal fração "progressista" da burguesia nacional debandou-se para a reação em 1964 e ajudou a esmagar a esquerda e os comunistas na ditadura militar. O que ocorria era que não havia uma contradição entre o desenvolvimento do capitalismo no brasil e resquícios "feudais" decorrentes do subdesenvolvimento. Autores perspicazes como Caio Prado Júnior observaram como o capitalismo vai se desenvolver no Brasil  a partir daquelas estruturas arcaicas e a chamada burguesia nacional ao invés de estar em choque com o imperialismo, estaria com os seus interesses materiais associados aos monopólios estrangeiros. Isto explica o apoio civil e empresarial ao golpe de estado engendrado especialmente pelo imperialismo norte-americano em 1964.

Anita Leocádio Prestes irá continuar sua narrativa, descrevendo a intervenção e a luta de Prestes por um partido revolucionário no tumultuado governo de Jango, na luta pelas reformas de base e contra a conciliação junto ao imperialismo. Após a ditadura militar, na luta pela reorganização partidária. No exílio e no retorno ao Brasil, quando sentimo-nos tocados com o triste destino de Prestes, octagenário, e ainda lutando, com todas as forças, contra os desvios oportunistas e reformistas da direção nacional do PCB, coincidindo com o seu afastamento da secretaria geral do partido.

Na verdade, os anos de 1980 seriam um momento de ofensiva brutal do capitalismo contra o socialismo e a tradição comunista e, nesta ofensiva, os partidos comunistas não sairiam ilesos. Muitos "comunistas" relegariam a segundo plano a perspectiva revolucionária e o horizonte socialista em detrimento de uma "democracia" que, na prática, implicava a conciliação junto à burguesia e o reformismo exacerbado. Como comunistas, ao lermos o relato de Anita, sentimo-nos tocados, sensibilizados pela grandeza de Prestes, que a todo momento, na prática (e não apenas no discurso) demonstra sua fidelidade ao marxismo leninismo, mesmo diante de reiteradas mostras de traição do comitê central do Partido Comunista Brasileiro, especialmente durante a chamada redemocratização. Enquanto a direção do PCB conciliava junto a Figueredo e chamava o voto em Tacredo Neves, Prestes rebelava-se e chamava boicote às eleições de fachada. Quando a municipalidade do Rio de Janeiro lhe concede uma pensão vitalícia, Prestes recusa prontamente o benefício, considerando-o inoportuno por princípio. Podemos criticar Prestes por algumas opções táticas - por exemplo, em 1989, chamou voto nas eleições presidenciais em Leonel Brizola e apoiou Lula no segundo turno. Todavia, o que fica claro é que até a sua morte, aos 90 anos de idade, Prestes demonstrou ser fiel ao marxismo-leninismo: como tal, dedicou todas as suas forças até a morte pela construção do partido da revolução brasileira.

É uma pena que no Brasil, hoje, predominem organizações trotskystas. São vários os problemas decorentes da hegemonia do trotskysmo dentro das nossas organizações de esquerda. Uma delas é o deliberado esquecimento de dirigentes do nosso movimento comunista - caracterizados por PSTU, PSOL, LER, MNN, PCO, etc - como "estalinista". Luiz Carlos Prestes é um caso destes dirigentes que precisam ser resgatados:sua história precisa ser contada e confrontada diante das falsificações e calúnias da direita e daqueles trotskystas desonestos.

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