REVISITANDO O CONCEITO DE ATO ADMINISTRATIVO
Os atos administrativos discricionários se sujeitam ao controle do poder
judiciário? De que forma pode ser elidida a presunção de legitimidade e
veracidade dos atos administrativos? A validade do ato administrativo se
vincula aos motivos indicados como seu fundamento?
Estas são algumas das perguntas que são analisadas pelo Direito Administrativo
no capítulo relativo aos atos da
administração.
O assunto é do interesse do estudante de direito, do bacharel que se
prepara para as provas da OAB e do candidato dos concursos públicos a carreiras
jurídicas, administrativas e policiais.
DEFINIÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS
JOSE CRETELLA JÚNIOR define o ato administrativo como “a manifestação
de vontade do Estado, por seus representantes, no exercício regular de suas
funções, ou por qualquer pessoa que detenha, nas mãos, fração de poder
reconhecido pelo Estado, que tem por finalidade imediata criar, reconhecer,
modificar, resguardar ou extinguir situações jurídicas subjetivas, em matéria
administrativa”.
CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO define o ato administrativo como a “declaração
do Estado ou de quem lhe faça as vezes, expedida em nível inferior à lei – a título
de cumpri-la – sob o regime do direito público e sujeita a controle de
legitimidade por órgão jurisdicional”.
As definições do conceito na doutrina suscitam alguns elementos comuns:
(i) o ato administrativo constitui em declaração/manifestação do Estado ou de
quem lhe faça as vezes; (ii) o ato administrativo se sujeita ao regime jurídico
administrativo e, portanto, possui todas as prerrogativas e restrições próprias
do poder público; (iii) produz efeitos jurídicos imediatos, sujeita-se à lei e é
passível de controle judicial.
Quando ao ponto “iii”, a professora MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO entende
que os atos da administração que não produzem efeitos imediatos
não se enquadram no conceito aqui analisado. São os atos de opinião como
pareceres e laudos, os atos enunciativos ou de conhecido como atestados,
certidões e declarações, e os atos materiais como a reforma de um prédio ou a
limpeza de uma rua.
ATRIBUTOS DOS ATOS ADMINISTRATIVOS
Os atributos dos atos administrativos distinguem estes atos dos atos de
direito privado, o que permite afirmar que se submetem ao regime jurídico de
direito público.
Há a PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE dos atos administrativos que se refere à
conformidade do ato com a lei. Em decorrência desse atributo, presume-se até
prova em contrário que os atos administrativos foram emitidos com observância
da lei.
Há igualmente a PRESUNÇÃO DE VERACIDADE dos atos administrativos, que diz
respeito aos fatos: presumem-se verdadeiros os fatos alegados pela
administração, o que ocorre com certidões, atestados, declarações e informações
dotadas de fé pública.
As justificativas dadas pela doutrina para atribuir a presunção de
legitimidade e veracidade aos atos da administração envolvem a soberania do
poder estatal, a necessidade de se assegurar celeridade aos atos
administrativos e a sujeição da administração ao princípio da legalidade.
A IMPERATIVIDADE é outro atributo dos atos administrativos e por meio
dele os atos do ente estatal se impõem a terceiros, independentemente de sua concordância.
Note que a imperatividade também é uma das características que distingue o ato
administrativo do ato privado já que este último não pode criar qualquer obrigação
para terceiros sem a sua concordância.
Finalmente, a AUTOEXECUTORIEDADE é o atributo pelo qual o ato
administrativo pode ser posto em execução pela própria Administração, sem a
necessidade de intervenção do Poder Judiciário.
PODER DISCRICIONÁRIO E PODER VINCULADO
Os atos administrativos podem se dividir em atos discricionários e atos
vinculados.
Quando o poder da administração é vinculado a lei não abre opções ao ente
estatal. Diante de determinados requisitos a Administração deve agir de tal ou
qual forma. Ademais, diante de um poder vinculado, o particular tem um direto
subjetivo de exigir da autoridade a edição de determinado ato, sob pena de, não
o fazendo, sujeitar-se à correção judicial. É o caso da edição de uma portaria
de aposentadoria de um servidor que atingiu os requisitos legais.
Há outras situações em que a lei deixa certa margem de liberdade de
decisão ao administrador diante do caso concreto. Neste caso os poderes da
administração são discricionários porque a adoção de uma ou outra solução é
feita segundo critérios de oportunidade, conveniência, justiça, equidade,
próprios da autoridade, porque não definidos pelo legislador.
Note que discricionariedade não é o mesmo que arbitrariedade. A discricionariedade
implica liberdade de atuação nos limites traçados pela lei e quando a
administração ultrapassa esses limites a sua decisão passa a ser arbitrária e
contrária à lei. Exemplos do poder discricionário são a autorização para o
porte de armas e a exoneração de um ocupante de cargo em comissão.
Tradicionalmente se afirma que o controle judicial dos atos administrativo
se dá apenas no caso dos atos discricionários quando o juiz ou tribunal
analisará exclusivamente a legalidade do ato. Já os atos administrativos discricionários
não comportariam análise de mérito do poder judiciário, já que a escolha
baseada nos critérios de oportunidade e conveniência são exclusivos da
administração, sob pena de violação ao princípio da separação de poderes.
Esta posição foi evoluindo nos tribunais: entende-se hoje que o judiciário
deve verificar se, ao decidir discricionariamente, a autoridade administrativa
não ultrapassou os limites da discricionariedade, devendo ser invalidados
judicialmente atos promovidos com vício de desvio de poder, por irrazoabilidade
ou desproporcionalidade, por inexistência de motivação, por infringência dos
princípios da moralidade, segurança jurídica e boa fé.
Não se confunde portanto controle de mérito dos atos administrativos pelo judiciário
(indevido) e controle dos limites legais da discricionariedade no ato
administrativo (devido).
BIBLIOGRAFIA
DI PIETRO, Maria Sylvia. “Direto Administrativo”. Ed. GEN Forense. 34ª
Edição.
Imagem: Dois Índios em uma canoa - Two Indians in a Canoe Biard, François-Auguste
Óleo sobre tela | (sem data) Musée du Quai Branly | Paris - França Dimensões da obra: 50,2 x 61,0 cm Século XIX
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