quinta-feira, 26 de setembro de 2013

“O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann” – Karl Marx


Resenha Livro # 75 “O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann” – Karl Marx – Ed. Paz e Terra – 7ª Edição



A presente edição da editora Paz e Terra oferece-nos a tradução, coordenada pelo marxista carioca Leandro Konder, de dois conjunto de textos de fundamental importância. O 18 de Brumário trata do Golpe de Estado dado por Luís Bonarparte (sobrinho de Napoleão I) em 02.12.1852. O fato em si reveste-se de importância menos no que se refere às especificidades da história política francesa do séc. XIX e mais pelo sentido histórico que toda aquela movimentação política representou e que casualmente estabeleceu um regime político que verdadeiramente (e não apenas aparentemente) “pairasse” sobre as classes sociais. O que interessa acima de tudo é colocar em relevo o método científico de Marx em sua análise da história e nesta perspectiva o leitor se deparará com uma breve e poderosa síntese do desenvolvimento da luta de classes na França, desde a queda de Luís Felipe nas jornadas revolucionárias de 1848, passando pela eleição do sobrinho de Napoleão em 10.12.1848, a dissolução posterior da Assembleia Constituinte e o Golpe de Estado (18 de Brumário), fazendo com que a história se repetisse, primeiro como tragédia (Napoleão I) e depois como farsa (Napoleão III). À farsa, segue-se a narração de uma comédia e Marx verdadeiramente pinta Luís Bonaparte como uma caricatura do tio.

A segunda parte do livro traz ao público as cartas enviadas por Karl Marx ao seu amigo alemão Kugelmann entre 28 de Dezembro de 1862 e 10 de Agosto de 1874. Lênin foi um dos primeiros a chamar a atenção para a importância do estudo destas correspondências. Além de informações pessoais acerca das dificuldades financeiras e problemas de saúde que acompanharam Karl Marx durante boa parte de sua vida adulta, as cartas revelam alguns detalhes importantes acerca dos trabalhos dirigidos por Marx à frente da Associação Internacional dos Trabalhadores (I Internacional), a luta contra as manobras e divisionismo dos aliados de Bakunin dentro da associação, além de outras impressões breves da conjuntura política europeia da segunda metade do séc. XIX. Certamente, a carta que mais nos causa comoção foi escrita no calor dos acontecimentos da Comuna de Paris, quando Marx saúda a disposição revolucionária daquele movimento, censurando-o apenas no sentido de, por honestidade excessiva, não ter desferidos os golpes mortais e necessários a tempo contra a reação.

Muitas das cartas tratam das dificuldades na elaboração e posterior publicação e divulgação de sua obra magna, “O Capital”. Como se sabe, este grande projeto de análise da economia política sobre bases críticas não pôde ser efetivamente concluída por Marx. Dos quatro volumes da obra, apenas o 1º foi publicado quando Marx ainda estava vivo: as demais, incluído o chamado volume “inédito”, foram organizados e lançados após a morte do autor sob os auspícios de seu amigo Engels e da filha mais velha de Marx (Jenny Marx).

18 de Brumário

“Os homens fazem sua própria história, mas não fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado. A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”.

Marx escreveu sua história política da França ainda no calor dos acontecimentos. Nesse sentido, chega a ser assombroso como é capaz de colocar em justos termos o movimento histórico, os posicionamentos das classes sociais (burguesia, proletariado, grandes proprietários de terra e campesinato) e suas respectivas frações (burguesia industrial, burguesia financeira, lumpem-proletariado, etc.) sempre em movimento, pintando um quadro dinâmico em que os acontecimentos ou fatos históricos estão necessariamente dotados de sentido. O que isso significa? Trata-se de um relato do golpe de estado de Luís Bonaparte partindo-se das premissas do materialismo histórico, ou seja, neste ensaio importa, mais do que os eventos narrados em-si, os pressupostos teórico-metodológicos aplicados na interpretação da história que, ao ser dotada de sentidos, deixa de ser uma mera sistematização de datas, fatos e pessoas, sem o necessário esforço crítico de interpretar os sentidos históricos dos acontecimentos e mesmo para onde a história deve seguir o seu rumo.

Os homens fazem a história, mas não a fazem como querem. Desde este ponto, Marx afasta-se de certa perspectiva idealista (muito voga na filosofia alemã em decorrência de Hegel) segundo a qual as ideias conduzem as mudanças materiais. Os homens certamente não escolheram as condições históricas legadas pelo passado e pode-se dizer que têm portanto uma autonomia relativa frente aos rumos dos acontecimentos. Entretanto, a história persiste sendo feita pelos homens: se assim não fosse, Marx não seria marxista, ao não oferecer a possibilidade das classes surgirem como sujeitos históricos (avançando de classe-em-si à classe-para-si), bem como eliminando qualquer possibilidade da iniciativa histórica destes sujeitos, particularmente no que se refere aos eventos revolucionários.

Outro ponto do 18 de Brumário que remete à teoria ou filosofia da história e que costuma ser bastante observado pelo público é justamente a famosa frase com que abre seu trabalho.

“Hegel observa em uma de suas obras que todos os fatos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira como tragédia e a segunda como farsa”.

Esta passagem sintetiza o próprio significado do golpe de estado no contexto tanto da Revolução Francesa de 1879 como do fracasso das jornadas revolucionárias após 1848. O sobrinho Napoleão foi certamente uma espécie de “desvio de rota” e pode ser tratado como uma farsa ou, talvez, como comédia. Não há em Luís Bonaparte a grandeza pessoal, bem como os feitos históricos de seu tio, que, até Waterloo, praticamente dominou toda a Europa continental. Entretanto, os traços de personalidade não subsidiários na análise marxista. A farsa aqui se dá em torno dos desdobramentos finais da luta de classes na França. Luís Bonaparte foi eleito após as jornadas revolucionárias de 1848 pela maioria camponesa da França – um setor político atrasado, ainda apegado às tradições, ao conservadorismo e que esperava ver na figura do sobrinho a mesma grandeza perdida da França na era de Napoleão I.

O resultado do golpe de estado pode ser explicado como uma situação muito atípica e particular em que, na luta de classes, todas as principais classes e frações saem de alguma forma derrotadas. Nem a burguesia industrial ou financeira e muito menos o proletariado urbano residual tinham condições de impor a sua política, o seu representante político. Assim, o bonapartismo em Marx surge como uma força política que paira por assim dizer sobre todas as classes. E na prática, Marx bem caracteriza a base política de Luís Bonaparte, basicamente comporta pela enorme burocracia estatal que vive às custas da corrupção e da arrecadação brutal de tributos, o lupem-proletariado e os setores mais atrasados do campesinato – e aqui é bom destacar que Marx, como posteriormente Lênin, não joga o camponês num único campo exclusivamente reacionário, lembrando que ao lado destes, havia também setores mais pauperizados com vocação para a luta social.

Aqui seria importante um parênteses. Já tivemos a oportunidade de lermos em alguns materiais da organização política trotskysta “Negação da Negação” uma caracterização inusitada dos governos Lula como regimes bonapartistas. Certamente tal “bonapartismo” só pode partir de critérios estranhos ao pensamento de Marx. Não há como comparar as situações extremamente particulares na França (o medo de uma nova onda revolucionária e uma burguesia completamente hesitante além de uma maioria de base social dentre os camponeses, a burocracia e o lumpesinato) com o que foi o Brasil durante os dois mandatos do governo do PT. É certo que é parte do próprio discurso ideológico de sustentação do estado a ideia de que o mesmo “pairasse” sobre as classes sociais.

Mas não é apenas isso o que caracteriza o bonapartismo. É bastante discutível, por outro lado, qualificar a base social beneficiada pelo bolsa família e pelas políticas de crédito como “lupemproletariado”. E mais importante de tudo, o Lulismo implicou em verdadeira capitulação do governo e do Partido dos Trabalhadores aos interesses do capitalismo financeiro e ao imperialismo (para quem Lula é ou era “o cara”). Ou seja, os trotskystas da “Negação e da Negação” estão inteiramente equivocados em qualificar o governo Lula ou o governo Dilma como “bonapartista”. Poderia-se argumentar que a expressão bonapartismo aqui decorreria de sua utilização por Leon Trótsky. Frente à flagrante pequenez deste autor e da qualidade duvidosa das obras teóricas de tal “marxista”, optamos aqui por manter a ortodoxia e ficarmos com o conceito de bonapartismo consagrado por Marx em 18 de Brumário. Em tempos de “ecletismos” cuja resultante, no marxismo, é a desfiguração da perspectiva revolucionária, torna-se ainda mais importante seguir o exemplo de Lênin que definitivamente demonstrou na prática a importância da ortodoxia no marxismo.   

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

“Tratado de Materialismo Histórico” – N. Bukharin


Resenha Livro #74 “Tratado de Materialismo Histórico” – N. Bukharin – Ed. Laemmert – 1970



Bukharin escreveu este tratado de filosofia marxista no início dos anos 1920. Antes de abordarmos a obra, é importante discorrer sobre quem é o seu autor. Nascido em Moscou, filho de professores do ginásio, Bukharin foi importante político, teórico e dirigente revolucionário. Formou-se em Economia e, durante a juventude, participou ativamente da primeira revolução Russa de 1905, considerada por Lênin como “ensaio geral” da Revolução de Outubro de 1917. Em 1906 ingressou no Partido Operário Social- Democrata Russo e a partir de 1912 aproximou-se politicamente de Lênin, ainda que ocasionalmente tenha entrado em atrito com o grande dirigente da revolução – em geral, seu nome é associado ao agrupamento dos “comunistas de esquerda”. Participou ativamente da insurreição de Outubro como dirigente do levante em Moscou e posteriormente ocupou cargos políticos importantes, como redator-chefe do órgão de imprensa do partido bolchevique (“Pravda”, a verdade, em Russo) e posteriormente membro da direção nacional (politburo) do Partido Comunista da União Soviética. Teve importante papel na história da revolução russa  como mentor junto de Lênin da NEP, Nova Política Econômica, que reintroduziu alguns elementos da economia de mercado, na perspectiva de combater a fome e desenvolver a produtividade de um país extremamente atrasado economicamente. Como membro eminente e respeitado do partido bolchevique, certamente provocava preocupação, após a morte de Lênin em 1924,  como eventual rival na disputa pela liderança do partido e do estado soviético.  E foi assim que em 1937 foi preso a mando de Stálin e morto no ano posterior.

Segundo o próprio Bukharin, o seu Tratado corresponde a uma continuação de uma obra anterior, mais conhecida, denominada “O ABC do Comunismo”. Nestes dois trabalhos o autor apresenta o compromisso de oferecer os elementos da teoria marxista de maneira a mais didática e clara possível. Não deixa de ser sugestivo que no “Tratado”, obra que esmiúça diversos aspectos do materialismo histórico e da filosofia marxista de maneira geral, Bukharin sempre busca demonstrar o seus raciocínios teóricos por meio de exemplos práticos, relacionados ao contexto de vida do trabalhador ou do camponês. Assim, mesmo se tratando de um tema intrincado, os exemplos ilustrativos acerca das diferenças entre materialismo e idealismo ou acerca dos fatores fundacionais da sociedade e do seu movimento histórico, fazem com que boa parte dos temas pudessem ser assimilados pelo mais simples mujique.

Um tratado de materialismo dialético não só deve oferecer uma visão panorâmica da filosofia marxista, com suas diversas dimensões na história, na sociologia e na economia política, mas contrapor a perspectiva marxista tanto às análises dos pensadores burgueses quanto de pensadores relativamente próximos do marxismo, mas que ora falsificam ora não compreendem a real dimensão e alcance do materialismo histórico. No que se refere aos pensadores burgueses, suas análises são particularmente ilustrativas quando Bukharin analisa a questão da ideologia e da psicologia das classes: às análises segue-se os interesses de perpetuação da lógica capitalista, o que implica na naturalização das relações de dominação e na negação da revolução e da ditadura do proletariado.

 Há de se constatar que a concepção de “Ideologia” em Bukharin não podia ser a mesma daquela que ficaria consagrado pelo marxismo a partir da obra “A Ideologia Alemã”. Isto porque esta obra filosófica de Marx apenas foi publicada em 1932, após a redação e publicação do “Tratado”. Assim, enquanto em Bukharin a ideologia corresponde a uma sistematização mais ou menos organizada da percepção de mundo, da cultura e da ética correspondente às distintas classes, em Marx a ideologia passa a ser um esquema de dominação: a ideologia como uma “nuvem de fumaça” em que os interesses particulares da classe dominante são dados como se fossem interesses gerais de toda a sociedade. Em Bukharin a ideologia mantém uma íntima relação com a chamada psicologia de classe, correspondendo a uma sistematização maior e mais racionalizada das psicologias das distintas classes. Assim, haveria tanto uma ideologia burguesa, quanto uma ideologia proletária. E qual é a origem da ideologia e da psicologia das classes? Responde Bukharin:

“Dissemos que a psicologia das classes é determinada pelo conjunto das condições de vida de cada classe, condição que tem a sua base na situação econômica de cada classe. (...) É absolutamente justo que o interesse de classe determina essencialmente a luta de classe. Mas a psicologia de classe não se limita a isso. Já vimos mais acima que, na época de decadência do império romano, filósofos da classe dirigente pregavam o suicídio e que esta propaganda obtinha sucesso porque concordava com a psicologia desta classe dirigente, que era uma psicologia desta classe dirigente, que era uma psicologia de homens saciados e por conseguinte fartos de viver. Podemos perfeitamente explicar a formação de semelhante psicologia; vemos que ela tem sua raiz no parasitismo de uma classe dominante que nada fazia, e cuja existência inteira se limitava a consumir sem cessar, a experimentar de tudo até se enfastiar”.

Este importante conceito de psicologia de classe terá no “Tratado” desdobramentos importantes nas distintas passagens em que Bukharin analisa o movimento e a luta das classes na história. Ainda sendo certo que Marx e Engels iniciam seu manifesto dizendo ser a história da humanidade, a história da luta de classes, deve o intérprete crítico analisar tal passagem desde o ponto de vista do que a historiografia francesa chamará de história de média e longa duração. Todavia, alerta Bukharin, existem em primeiro lugar momentos de paz social e equilíbrio ou estagnação social; existem momentos em que classes com interesses antagônicos unem-se em torno de um inimigo comum, sendo este o caso do terceiro estado da Revolução Francesa, dentro do qual estava a classe dos burgueses e a incipiente classe proletária. Ademais, Bukharin certamente está a frente de um certo marxismo eminentemente teleológico e dogmático segundo o qual o desenvolvimento das forças produtivas diante dos limites institucionais, jurídicos e políticos do capitalismo fatalmente levaria à luta vitoriosa do proletariado. Esta luta encarniçada entre burgueses e proletários não tem seu resultado pré fixado pela história: e o próprio Marx o afirma, quando diz que a luta de classes pode levar a aniquilação mútua das classes e/ou a um processo de decadência/retrocesso histórico. Mesmo a vitória do proletariado implica numa destruição parcial das forças produtivas frente à guerra civil (situação sentida de maneira premente na Rússia durante o chamado “Comunismo de Guerra”).
Em síntese, o “Tratato” merece ser lido com atenção diante de seu grandioso projeto de sistematizar a filosofia marxista desde um método que irá analisar teoricamente e por meio de exemplos práticos muitas das dimensões decorrentes do materialismo histórico. Discute-se o que são classes sociais e como se diferenciam de grupos e profissões, discute-se o que é a sociedade e qual é a sua origem e seu fundamento histórico (correspondendo ao grau de desenvolvimento das forças produtivas e seu correspondente modo de produção). Discute-se o papel do indivíduo na história, a questão do partido e seu vínculo com a classe, para além de sua importância prática. Faz-se uma análise crítica acerca das relações entre estrutura e superestrutura, demonstrando-se como o marxismo, ao contrário do que prega seus difamadores burgueses, não descarta a importância da política, da cultura, da arte ou da religião, mas coloca tais elementos em seu devido lugar, explicando-os desde relações causais decorrentes do mundo do trabalho e da economia política. Por todos estes debates introduzidos por Bukharin, certamente o seu “Tratado” mereceria uma nova edição no país, de forma a melhor contemplar a tarefa da formação política dos marxistas revolucionários brasileiros.

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

“V. I. Lênin- Pequena Biografia” – Edições Avante


Resenha Livro # 73 “V. I. Lênin – Pequena Biografia” – Cadernos de Iniciação Ao Marxismo Leninismo - Edições Avante! Nº14



Esta pequena síntese da vida, da produção intelectual e da atividade política de Lênin foi preparado pela “Edições Avante!”. Trata-se de editora ligada ao PCP, Partido Comunista Português.

Por suposto, a análise desta e de qualquer obra referente à vida do dirigente da Revolução Russa de 1917 deve partir de um olhar crítico. Como se sabe, não existe neutralidade quando lidamos com os distintos ramos de conhecimento das ciências humanas. O olhar crítico ou a crítica radical (que vai até a raiz das questões analisadas) encontra nos pressupostos teórico-metodológicos do marxismo o seu melhor ponto de apoio. No caso concreto, uma análise crítica da obra acerca do controvertido e muitas vezes mal compreendido Lênin deve ter como ponto de partida a posição prática das distintas vozes narrativas no âmbito da Luta de Classes.

Assim, como pudemos estudar na análise da obra “Marxismo no Ocidente”, escrita nos anos 1960, durante a fase de maior tensão entre as duas potências (URSS e EUA) na Guerra Fria, aquele livro redigido por distintos expoentes acadêmicos do mundo capitalista só podia partir de grosseiras falsificações, sendo muito fácil observar a intenção permanente de desmoralizar a principal liderança do movimento comunista mundial depois de Marx e Engels. Naquela obra, Lênin é pintado como um homem “maníaco” – um “obsessivo”, um louco, autoritário, grosseiro nos tratos pessoais, indiferente aos conselhos de seus companheiros de partido e, pior, dos operários e camponeses. Já neste trabalho da Edição Avante! é possível encontrar uma versão um pouco mais verossímil da figura de Lênin – afinal, fica muito difícil de acreditar como um “maníaco-obsessivo” granjou o respeito, admiração e carinho de enormes massas proletárias e camponesas, sinalizada, por exemplo, nos momentos em que teve graves problemas de saúde (após tomar 3 tiros com balas envenenadas por uma agente da reação) ou mesmo após sua morte, em 1924, quando todo o país comoveu-se e peregrinações vieram de todo canto a Moscou vê-lo. Aliás, o Mausoléu do Lênin continua até os dias de hoje disponível para visitas gratuitas, na Praça Vermelha. Mesmo após a brutal restauração capitalista daquele país, ainda hoje ainda é possível ver nos metrôs de Moscou e nas ruas de São Petersburgo monumentos e referências a V. I.   E como se diz ainda hoje, “Lênin viveu, Lênin vive, Lênin viverá”.

Infância e juventude

V. I Uliánov (Lênin) nasceu em 1870 numa pequena cidade camponesa às margens do rio Volga. Seu pai, Ilia Nikoláevitch, veio de uma pobre família camponesa, mas com grande esforço conseguiu alcançar e concluir os estudos secundários e superiores e tornou-se professor e educador geral de Simbisrk e outras pequenas cidades, onde abria e ajudava a organizar novos estabelecimentos de ensino, atuando como diretor. A vida no campo correspondeu a uma fase de aprendizagem para Lênin, aprendizado que levaria para o resto da vida. Após a conclusão do curso de Direito, pôde atuar junto aos trabalhadores pobres do campo, orientando-os e aprendendo sobre as suas condições de vida. Este aspecto da vida de Lênin é importante, pois teria desdobramentos importantes na luta revolucionária e posteriormente na consolidação do Socialismo. Ao contrário de León Trótsky, que nunca foi capaz de entender completamente as especificidades da luta de classes na Rússia, Lênin sempre soube que uma revolução socialista num país como a Rússia czarista (de industrialização recente, ainda que em ritmo acelerado) só poderia triunfar com o apoio das massas de camponeses pobres. Tróstky, caracterizado pelo próprio Lênin em sua carta testamento como um militante bruocrático apenas voltado ao trabalho meramente administrativo, não soube entender a importância do campesinato para a revolução. E de fato foi a aliança efetiva entre o proletariado urbano os camponeses pobres a força social e imbatível que derrotou a contra-revolução, apoiada com tropas e armas por diversas potências ocidentais, como Estados Unidos da América, França, Inglaterra, entre outros. Após a vitória da Revolução de Outubro, os camponeses seriam novamente requisitados, desta vez para garantir os mantimentos nos fronts da guerra revolucionária e na cidade, sendo, até a NEP, necessárias expedições de bolcheviques da cidade ao campo para, pela força das armas, garantir a distribuição do trigo, frente aos especuladores.

O chefe da Revolução de Outubro

Algo interessante desta obra da editora Avante! é a preocupação em relacionar a história e trajetória de Lênin com sua respectiva evolução intelectual. Cada uma das principais obras de Lênin, da polêmica com os “Amigos do Povo” (1884), aos pronunciamentos junto aos congressos do Partido Comunista Russo após a consolidação da vitória pelos bolcheviques (1919-1924), sua produção intelectual vai sendo confrontada com as exigências de cada conjuntura histórica.

Após o triunfo da etapa burguesa da revolução em Fevereiro, Lênin, que estava no exílio na Finlândia, se organiza para voltar à Rússia e dirigir pessoalmente a revolução socialista. E, a despeito da vacilação de alguns, mesmo no interior do partido bolchevique, a palavra de ordem colocada por Lênin era “todo poder aos soviets”, contra o governo provisório burguês. Viu antes de muitos a possibilidade do triunfo da revolução socialista e lançava-se inteiramente na luta política, contra a vacilação e insegurança de certos setores do partido, no sentido dos revolucionários prepararem-se o quanto antes para a insurreição: dizia que naquela conjuntura revolucionária não havia tempo para meias palavras e por isso combatia com todas as suas forças os setores vacilantes. Após o assalto ao poder em Outubro de 1917, viria a guerra civil e a dura fase do Comunismo de Guerra. A luta revolucionária só viria a ser concluída em 1919, com a vitória final das massas trabalhadoras e camponesas contra a reação, burguesia e o imperialismo.  

Sínteses

Logo no início de sua obra “O Esquerdismo, a Doença Infantil do Comunismo”, Lênin começa dissertando como, apesar de certas particularidades, a experiência da revolução russa oferecia ensinamentos universais, aplicáveis, portanto, aos demais países. A revolução estourou não, conforme previam Marx e Engels, nos países centro do capitalismo, mas na sua periferia, em um de seus elos mais fracos. Este fato inusitado por explicável, acima de tudo, lançava luz aos revolucionários dos demais países, especialmente frente à capitulação da II Internacional à Guerra Imperialista. Nesse sentido, é impossível compreender as lições de Outubro sem se ater às intervenções de Lênin – foi ele quem dirigiu o partido, desde as fases de luta contra o tzarismo até após o triunfo e consolidação da revolução. E este caderno da Edições Avante! pode ser um bom ponto de partida para um estudo sistematizada da vida e do legado intelectual de V. Ilich Lênin.         

domingo, 8 de setembro de 2013

"A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado” – Friederich Engels

Resenha Livro #72 “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado” – Friederich Engels – Ed. Centauro



Este estudo de Engels parte das análises mais avançadas até então (1884) das sociedades primitivas (destacando-se os estudos do norte-americano Morgan) para construir uma poderosa síntese da origem do estado, bem como da propriedade privada e da família monogâmica. Partindo de um ponto de vista marxista da análise da evolução histórica, as grandes transformações que impulsionam o desenvolvimento do homem diz respeito  essencialmente ao grau e capacidade de domínio da natureza pelo homem. Assim, dos estágios pré-históricos da cultura até a civilização vai-se revelando um gradual e ascendente controle do homem sobre seus meios de produção e reprodução natural.
No estado selvagem, a fase inferior corresponde aos homens que ainda viviam nas árvores e se serviam de frutos, nozes e raízes como alimento; a fase média do período selvagem envolve já o emprego do fogo e a pesca, fenômenos complementares, já que o “peixe só pode ser plenamente empregado como alimento graças ao fogo”. Engels identifica nesta fase a ocorrência de antropofagia: ademais, o consumo de carne implicava no desenvolvimento da inteligência e outros atributos, pelo incremento da dieta. A fase inferior da barbárie é contada a partir da invenção  do arco e da flecha “graças aos quais os animais caçados vêm a ser um alimento regular e a caça uma das ocupações normais e costumeiras” (P. 28) “O arco e a flecha foram, para época selvagem, o que a espada de ferro foi para a barbárie e a arma de fogo para a civilização: a arma decisiva” (P.29)
A fase inferior da barbárie passa pela introdução a cerâmica, com sua utilização nas construções e como substituto da madeira,  arriscando o grupo menos a incêndios.  A fase superior da barbárie inicia-se com a fundição de ferro e o emprego da pá e do machado de ferro no cultivo do solo. É só com o ferro que é possível empregar a exploração da terra em grande escala, pela primeira vez. Assim, com a agricultura há um aumento ilimitado à época de meios de subsistência, implicando em aumento populacional. Uma síntese geral até a civilização é apresentada mais a frente por Engels: “Estado selvagem: período em que predomina a apropriação de produtos da natureza, prontos para serem utilizados; Barbárie: Período em que aparecem a criação de gado e a agricultura e se aprende a incrementar a produção da natureza com o trabalho humano. Civilização: Período da indústria propriamente dita e da arte”.
Ao lado do desenvolvimento histórico decorrente da maior capacidade de controle e apropriação dos meios de vidas da natureza pelo homem, modificam-se de forma correspondente as organizações pré e sociais propriamente ditas, bem como a transformação da família.
Nas chamadas famílias consanguíneas há o predomínio do casamento entre irmãos e parentes colaterais e posteriormente com as famílias punaluana casamentos coletivos também dentro de grupos consanguíneos. Há todo um programa marxista do debate sobre opressões de gênero neste estudo de Engels, justamente quando discutirá a evolução familiar. Afinal, observa-se que as sociedades marcadas pelo casamento grupal, típicas daquele comunismo primitivo, implicava papeis muito superior aos das mulheres da civilização. A monogamia é apenas a última forma familiar, correspondendo à consolidação do domínio do homem sobre a mulher e, no âmbito da produção, a constituição da propriedade privada.
Nas famílias mais primitivas os casamentos coletivos e os hábitos sexuais que envolviam diversas formas de poligamia tornavam incertas as origens paternas dos filhos. Como o parentesco só era possível de ser percebido pela linhagem feminina, foi por meio desta linhagem que se consolidava a gens, implicando em um reconhecimento social muito maior da mulher. Dentro das questões sucessórias, bem como para a articulação das gens, a mulher cumpria um papel de centralidade, falando Engels de um “Direito Materno” que gradualmente, conforme a família caminhasse para as fechadas unidades monogâmicas, foi transformando-se em “Direito Paterno”.
Engels vai até as origens do termo família de forma a expor as suas contradições decorrentes da sua conformação na história.
“Em sua origem, a palavra família não significa o ideal – mistura de sentimentalismo e dissensões domésticas – do filisteu e nossa época; - a princípio, entre os romanos, não se aplicava sequer ao par de cônjugues e aos seus filhos, mas somente aos escravos. Famulus quer dizer escravo doméstico e família é o conjunto de escravos pertencentes ao mesmo homem.  Nos tempos de Gaio, a família “id est patrimoniu” (isto é, herança) era transmitida por testamento. A expressão foi inventada pelos romanos para designar um novo organismo social, cujo chefe mantinha sob seu poder a mulher, os filhos e um certo número de escravos, com o pátrio poder romano e o direito de vida e morte sobre todos eles. ‘A palavra não é, pois, mais antiga que o férreo sistema familiar das tribos latinas, que nasceu ao introduzirem-se a agricultura e a escravidão legal, depois da cisão entre os gregos e latinos arianos’. E Marx acrescenta ‘a família moderna contém, em germe, não apenas a escravidão (servitus) como também a servidão, pois, desde o começo, está relacionada com os tempos da agricultura. Encerra, em miniatura, todos os antagonismos que se desenvolvem, mais adiante,  na sociedade em seu estado”.
Tanto o desenvolvimento geral das forças produtivas sociais quanto as distintas formas de arranjos familiares, correspondentes aos grandes períodos da pré-civilização caminham num sentido de aumento gradual da desigualdade na distribuição dos excedentes. Ao lado da agricultura e dos excedentes, vem o desenvolvimento do comércio e com ele, a criação de uma nova classe social, os comerciantes. O dinheiro é criado e a distribuição e circulação de pessoas e bens põe por terra o antigo regime gentílico. Se dentro das ordens mais primitivas havia algum igualitarismo, como revela Engels ao descrever sociedades indígenas norte-americanas, povos celtas e bárbaros em geral, que mantinham, dentro do arranjo gentílico, formas hirperdemocráticas de poder, com participação irrestrita dos membros sociais e ausência de um poder coercitivo externo à sociedade (polícia).
Já o estado aparece na medida em que a crescente desigualdade vai se expressando com o fim da apropriação comunista primitiva e o início da apropriação privada das terras e  demais riquezas , consolidando uma classe dominante e exploradora, e uma classe explorada – inicialmente, o escravismo, posteriormente a servidão e finalmente o assalariamento. O estado nasce da necessidade de conter a luta de classes e surge, emerge como algo “acima das classes” – o que é uma ilusão, ilusão que atende os interessas da classe exploradora e que detém o controle do estado. Um instrumento de dominação de uma classe pela outra, isto é, em síntese, o estado na perspectiva de Marx e Engels. Uma lição importante ao analisarmos as sociedades pré-estatais é a de justamente afastar a tese da inafastabilidade de um poder externo e controlador da sociedade, a tese hobbesiana na inevitabilidade do estado. Já Engels se opõe a esta perspectiva na sua conclusão do livro:
“Portanto, o Estado não tem existido eternamente. Houve sociedades que se organizaram sem ele, não tiveram a menor noção do estado ou do seu poder. Ao chegar a certa fase do desenvolvimento econômico, que estava necessariamente ligada à divisão da sociedade em classes, essa divisão tornou o Estado uma necessidade. Estamos agora nos aproximando, com rapidez, de uma fase de desenvolvimento da produção em que a existência dessas classes não apenas deixou de ser uma necessidade, mas até se converteu a um obstáculo à produção da mesma. As classes vão desaparecer, e de maneira tão inevitável como no passado surgiram.  Com o desaparecimento das classes, desaparecerá inevitavelmente o Estado. A sociedade, reorganizando de uma forma nova a produção, na base de uma associação livre de produtores iguais, mandará toda a máquina do Estado para o lugar que lhe há de corresponder: o museu de antiguidades, ao lado da roca de fiare do machado de bronze”. (P. 180)            


quarta-feira, 4 de setembro de 2013

“A Revolução Antes da Revolução” – Friederich Engels


Resenha Livro # 71 – “A Revolução antes da Revolução – As guerras camponesas na Alemanha. Revolução e Contra-Revolução na Alemanha” –Friederich Engels - Ed. Expressão Popular

 


A “Revolução antes da Revolução” é um bom título para os ensaios de F. Engels organizados pela editora Expressão Popular.  O título parece sintetizar o significado das insurreições camponesas do séc. XVI e dos levantes dos anos 1848-1849 na Alemanha, no que se refere às relações entre uma revolução da burguesia e uma futura revolução do proletariado.

Desde o ponto de vista marxista, a história dos homens é a histórica da luta de classes: as revoluções implicam numa agudização radical dos conflitos entre as classes sociais e podem ser explicadas por fatores objetivos e subjetivos. Os fatores objetivos das revoluções correspondem às relações entre o desenvolvimento das forças produtivas frente ao modo de produção historicamente determinado, com suas respectivas instituições e expressões do poder político que passam a andar em descompasso com o desenvolvimento da sociedade e da economia. Os fatores subjetivos envolvem o grau de maturidade histórica e organização das classes, desde a coesão e conformação da independência da classe (a sua “autonomia”), até a existência de homens e mulheres capazes de dar uma direção consequente e resoluta aos dilemas da crise revolucionária. “Revolução antes da Revolução” diz respeito ao exame, por parte de Engels, de revoluções e levantes em que a classe trabalhadora, ainda que participante dos levantes, especialmente em 1848, não tinha ainda o grau necessário de experiência e maturidade política, bem como uma organização independente para se apoiar, de forma a ir além dos interesses da burguesia em sua luta contra o Feudalismo. Os trabalhadores se armaram e estiveram por de trás da burguesia em sua luta revolucionária – e, conforme os interesses entre capital e trabalho também são antagônicos, a ascensão burguesa passa a ser acompanhada da luta contra seus antigos aliados.

Engels com enorme maestria analisa a história dos levantes e insurreições ora camponesas, ora burguesas, desde a perspectiva dos interesses de classe em jogo e da composição de forças e organização das mesmas, o que viria a decidir a sorte daqueles dois movimentos revolucionários. O livro contêm dois trabalhos distintos de Engels. A primeira parte do livro aborda as revoluções e levantes camponeses nos territórios alemães no séc. XVI. Àquela altura, o capitalismo ainda vivia a sua fase comercial (ou seja, não industrial). A manufatura e a classe dos artesãos nas cidades faziam as vezes de um embrionário proletariado que passaria a se conformar como classe especialmente após a revolução industrial. Ademais, o movimento camponês do início da era moderna tinha forte conotação religiosa – por detrás da crítica protestante de Lutero e do ainda mais radical Thomas Müntzer, surgiam as demandas contra o esmagamento do camponês por tributos e pela igualdade entre os homens. Este último, de teólogo reformador, virou líder revolucionário e apoiador dos anabaptistas, a “ala radical” da reforma protestante, tendo se virado inclusive contra Lutero, aqui considerado como “moderado”.

Engels, como historiador, não comete o erro de analisar o passado e seus personagens desde o ponto de vista do que aquele movimento revolucionário e aqueles pensadores entendiam de si próprios, mas interpreta o passado a partir do que os agentes e movimentos efetivamente fizeram.  Levando em consideração não a justificativa religioso mas os aspectos políticos daquela conjuntura. Atrás das teses religiosas estavam cobertos discursos e ações voltadas ao igualitarismo, ao fim da riqueza concentrada no 1º estado, a construção de uma sociedade igual materialmente, enfim, a derrota do feudalismo. Portanto, ainda que tal perspectiva surgisse no levante camponês com um viés religioso, o que é decisivo, aqui, são os interesses de classe em disputa, bem como o ponto de partida de uma longa batalha na Europa contra o feudalismo.

E foi ainda contra o feudalismo, o poder concentrado da burocracia real, as tarifas alfandegárias e as dificuldades de fazer circular suas mercadorias que a burguesia, tendo atrás de si, agora, o proletariado urbano, se envolve na revolução que ocorreria na Alemanha 300 anos depois dos levantes camponeses. Enquanto a Revolução Francesa de 1789 e as revoluções industriais inglesas já haviam implicado na eliminação dos entraves para o desenvolvimento do capitalismo, bem como da burguesia como classe dominante, na Alemanha, havia um enorme atraso entre as instituições políticas e o desenvolvimento das forças produtivas, contradição a partir da qual emergem as lutas políticas burguesas. Um ponto importante a ser considerado, todavia, é que a contra-revolução foi exitosa e derrotou todas as insurreições na Prússia e na Áustria (principais estados alemães de então) e a derrota sinalizava já o duplo caráter da revolução burguesa: ainda que houvessem interesses de classe pressionando pela unificação alemã, por um regime parlamentar e constitucionalista, pelo fim dos tributos abusivos e pela abertura comercial, ao chegar ao poder (como ilustrou bem na história a “Assembleia de Frankfurt”), a burguesia e os pequenos comerciantes passam a ter uma posição vacilante, quando não contra-revolucionária: atrás de si havia agora (ao contrário do séc. XVI) a classe trabalhadora em armas, o que poderia significar um passo em frente na luta revolucionária a partir do atendimento dos interesses dos trabalhadores que estão em oposição aos interesses econômicos burgueses. Não só a vacilação, bem como inúmeros exemplos de traição de elementos burgueses à luta revolucionária facilitaram o trabalho da repressão da reação feudal. E a repressão das forças reacionárias, ligadas ao primeiro estado, é descrita por Engels revelando a brutalidade com que os revolucionários foram submetidos. Ao re-tomar as cidades, a reação matava a maior parte dos rebeldes, amputava dedos e membros de alguns e mandava outros para o exílio e prisão (este último caso, aliás, foi o de Bakunin, citado por Engels).

A vacilação e traição da burguesia às revoltas dos anos de 1848 na Alemanha foram fatais a todo o movimento, dada a conjuntura revolucionária. A guiza de conclusão, reproduzimos aqui uma bela passagem de Engels, comentando acerca de tal conjuntura e dos efeitos das vacilações burguesas. Aqui, o companheiro de Marx fala sobre a “arte da insurreição”.

“Ora, a insurreição é uma arte, tanto quanto a guerra ou qualquer outra, sujeita a certas regras de procedimento que, se forem descuradas, produzirão a ruína do partido que as descurar. Essas regras, deduções lógicas da natureza dos partidos e das circunstâncias com que tem de se lidar num tal caso, são tão claras e simples que a curta experiência de 1848 tornaram os alemães bem familiarizados  com elas. Em primeiro lugar, nunca provocar uma insurreição a não ser que se esteja completamente preparado para encarar suas consequências. (....) Em segundo lugar, uma vez iniciado o movimento insurrecional, agir com a maior determinação e na ofensiva. A defensiva é a morte de todo levantamento armado; está perdido antes de ele próprio se medir com o inimigo. Surpreender os antagonistas enquanto suas forças estão dispersas, preparar novos êxitos, ainda que pequenos, mas diários; manter o moral ascendente que o primeiro levantamento vitorioso forneceu; reunir, desse modo, do nosso lado, aqueles elementos vacilantes que sempre seguem o impulso mais forte e que sempre procuram o lado mais seguro; obrigar os inimigos a se retirarem antes de poderem reunir as suas forças contra nós; das palavras de Danton, o maior mestre da política revolucionária até hoje conhecido: “de l’audace”, “de l’audace”, encore de l’audace (Audácia, audácia e mais audácia – francês)”.