Helenira Resente e a
Guerrilha do Araguaia
“Apesar de esquecido pela
maioria, o nome de Helenira está gravado na memória do povo pobre de Faveira,
Caianos e Gameleira, municípios localizados no Estado do Pará e no médio
Tocantins, onde se desenvolveu a Guerrilha do Araguaia, o maior foco de
resistência à ditadura no Brasil. Helenira Resende foi uma das mais conhecidas
combatentes desse movimento que atuou na selva amazônica e travou três grandes
combates contra as tropas do governo. Sua coragem, disciplina e bravura fizeram
com que ela chegasse a ser vice comandante de um destacamento guerrilheiro.
Helenira ressaltou também o papel da mulher brasileira na luta pela liberdade”.
Bruno Ribeiro
A guerrilha do Araguaia, situada
no sul do Pará no meio da floresta amazônica, foi o mais longo episódio de enfrentamento
armado à ditadura militar brasileira, constituída no ano de 1964.
O PCdoB realizou o seu IV congresso
já no ano de 1966, quando a maioria do partido apoiou a tese da luta armada
para derrubar a ditadura.
Os principais dirigentes
do PCdoB eram João Amazonas e Maurício Grabois.
João Amazonas foi feito
comandante em chefe da guerrilha: quando morreu em 2002 foi feita a sua vontade
de ter suas cinzas depositadas no Araguaia. Maurício Grabois, que já havia participado
do levante comunista de 1935 e foi deputado constituinte em 1946, participou pessoalmente
da guerrilha, já sexagenário, e tombou
com armas nas mãos no dia 25 de Dezembro de 1973.
Participaram da Guerrilha
do Araguaia 69 militantes do PCdoB e 30 camponeses apoiadores do movimento. Dos
participantes, apenas três saíram vivos, entre eles o futuro dirigente petista
José Genoíno. Do lado do exército foram 16 o número de baixas oficiais.
Enquanto grupos como a ALN
de Marighella, o MR-8, a VPR e VAR-Palmares optaram pela luta nos centros urbanos,
o PCdoB tinha uma tática diferente: acreditavam que o melhor caminho era
iniciar uma luta de longa duração, numa área de difícil acesso, afastada dos
grandes centros urbanos.
É importante lembrar que a
Revolução Cubana, baseada na guerrilha camponesa desde a Sierra Maestra, promovia
uma significativa influencia na consciência daqueles militantes de esquerda. A
experiencia vietnamita, também baseada na guerrilha rural, também contava
bastante. A ideia não era propriamente a de desencadear desde o início uma luta
armada contra o estado desde as distantes florestas amazônicas. Os militantes PCdoB
tinham a noção de que deveriam começar se instalando nesta região e desenvolver
um trabalho paciente de mobilização e esclarecimento da população local, de
forma a ganha-la aos poucos para a guerrilha.
Outro ponto a ser destacado:
as guerrilhas foram o resultado direto da violência do regime e não o
contrário.
O local escolhido pelo
partido era inóspito, distante e habitado por camponeses extremamente pobres. Os
militantes acreditavam que nestas circunstâncias seria mais fácil conquistar o
apoio do povo para uma luta que viria a seguir.
“A concepção que orientava
o Partido era de que a guerra revolucionária só seria possível se um trabalho
em longo prazo fosse feito com as massas. Ho Chi-minh, o grande revolucionário vietnamita,
era citado nas reuniões: ´É preciso comer, trabalhar e viver com o povo”. Só
assim, acreditavam os companheiros, eles conquistariam a confiança da
população. Uma confiança que entre os camponeses só podia vir de ações
concretas de exemplos diários, e não de discursos ideológicos. Apesar de se
diferenciarem dos moradores locais pela aparência e pelo modo de falar, os
guerrilheiros – chamados de “paulistas” pela população – não demoraram a se
adaptar à vida no interior”. Bruno Ribeiro
Helenira Resende foi uma
das primeiras militantes a chegar na região designada pelo partido, em 1969.
Tinha então 25 anos de idade e alguma experiencia militante atrás de si. Foi
eleita vice presidente da UNE no histórico congresso de Ibiúna no ano de 1968.
Dois dias após o início do congresso, a polícia cercou a fazenda onde ocorria o
evento e prendeu 800 estudantes, entre eles, Helenira. Foi transferida para o
odioso Departamento de Ordem Política e Social (DOPs), na região da Luz, em São
Paulo. Foi interrogada e torturada pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, o mesmo
que chefiou a captura e assassinato de Carlos Marighella.
Saiu da prisão e ato contínuo
entrou na clandestinidade.
Um livro que marcou aquela
geração de jovens dispostos a pegar em armas contra a ditadura foi o “Mini
Manual do Guerrilheiro Urbano” de Carlos Marighella. Como se sabe, trata-se de
um período posterior à ruptura do dirigente baiano com o PCB: igualmente
influenciado pelas vitoriosas revoluções em Cuba e China (Marighella esteve
pessoalmente nos dois países), rompeu com a direção do maior partido de
esquerda brasileiro da época, suscitando críticas relacionadas ao alinhamento
irrestrito dos comunistas com figuras burguesas como Goulart, bem como denunciando
a confiança despropositada na legalidade
e no dispositivo militar.
Palavras como estas eram
marcantes para Helenira e outros jovens de sua geração:
“O guerrilheiro urbano não
é um homem de negócios em uma empresa comercial, nem é um artista numa obra. A
guerrilha urbana, assim como a guerrilha rural, é uma promessa que o guerrilheiro
se faz a si mesmo. Quando já não pode fazer frente às dificuldades, ou
reconhece que lhe falta paciência para esperar, então é melhor entregar seu
posto antes de trair sua promessa, já que lhe faltam as qualidades básicas
necessárias para ser um guerrilheiro”. Carlos Marighella.
Como dizíamos, a intenção dos
guerrilheiros era instalar bases nas áreas rurais e desenvolver um trabalho
local de conscientização antes de iniciar o enfrentamento armado com a ditadura.
Era certo para os militantes e para a direção do partido que não seria possível
uma vitória sem o apoio das massas. Contudo, o processo de trabalho junto ao
povo estava apenas no seu início quando o movimento foi descoberto pelos
militares. Tiveram que iniciar a luta em condições desfavoráveis.
Em 12/04/1972 o exército
chegou no Araguaia. Foram ainda assim necessárias 3 grandes ofensivas até o
completo aniquilamento da guerrilha, contando com helicópteros e aviões que
bombardeavam a área com napalm fornecido pelos EUA. Na terceira campanha de
setembro de 1973 a março de 1975 as tropas desencadearam uma forte repressão
contra as massas, prendendo todos os homens da região, deixando nas roças
apenas as crianças e mulheres. Muitos
inocentes foram torturados e mortos.
Helenira foi morta em 29/09/1972
pouco antes da terceira ofensiva, enquanto montava guarda na floresta –
resistiu aos policiais a bala, matando
um soldado e ferindo um segundo na perna. Foi barbaramente torturada e
assassinada com golpes de baioneta na cabeça. Desde então, os seus restos mortais,
como o de seus companheiros, jamais foram encontrados.
Sua história, como a da
guerrilha do Araguaia, aguarda ser contada ao nosso povo e inserida em
definitivo nos livros de história do Brasil. A pequena biografia escrita pelo
jornalista Bruno Ribeiro, pela editora expressão popular, é um passo decisivo
neste sentido.
Bibliografia
RIBEIRO, Bruno. “Helenira
Resende e a Guerrilha do Araguaia”. Ed. Expressão Popular . 2007.
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