sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

“História do Marxismo no Brasil” – Vários Autores


“História do Marxismo no Brasil” – Vários Autores



Resenha Livro - “História do Marxismo no Brasil: o impacto das revoluções” – João Quartim de Moraes e Daniel Aarão Reis (Org.) - Editora Unicamp

“Nos últimos anos do século XIX e na primeira década do XX muitos outros autores poderiam ser lembrados como propagandistas, maiores e menores, das ideias de Marx, tal como Vicente Avelar, Estevam Estrela e Evaristo de Moraes. Num folheto do fim do século XIX, desenganava-se o primeiro com a República, mostrava a miséria do trabalhador nacional e prestava homenagem indiscriminadamente a vários doutrinadores da reforma social, de Bellamy, Oliveira Martins, Kropotkin, Lassale, terminando em Engels e Marx. Da bem ideia da confusão e do despreparo doutrinário que reinava entre os nossos possíveis teóricos do socialismo. Na verdade, ninguém havia lido profundamente, estudado ou se dedicado ao marxismo”. EVARISTO DE MORAES FILHO.

Este primeiro volume do História do Marxismo no Brasil antecede outros 5 volumes dedicados ao tema através de artigos de professores universitários e mesmo militantes que presenciaram pessoalmente esta trajetória. Neste volume trata-se da proto-história do marxismo no Brasil desde o século XIX quando o vocabulário marxista não raro vinha associado às ideias do positivismo e do evolucionismo. Marx, Spencer, Darwin e Haeckal advinham não raro de uma mesma ordem de ideias. Euclides da Cunha fez citações de Marx: mesmo preso a certas noções deterministas, o mais provável é que o cenário de miséria absoluta que presenciou em Canudos deveria despertar no escritor alguns aspectos da crítica social.

Pode-se dizer que no Brasil houve um movimento de desenvolvimento do marxismo distinta do que ocorreu em França ou Rússia. Naqueles países europeus, as ideias de Marx antecederam a problemática do comunismo enquanto no Brasil a problemática do comunismo antecede o marxismo. Serão as revoluções em Europa de 1848[1] e, principalmente, a Comuna de Pais que repercutiram num primeiro momento a ideia de Marx e outros reformadores sociais. Inicialmente, a reação advém da crítica parlamentar. De fato a intervenção do deputado Joaquim Serra constitui a primeira menção direta de Marx no parlamento brasileiro, no contexto da Comuna de Paris. Nessa mesma orientação, a chamada Escola de Recife, de forte conteúdo cientificistas, determinista e materialista, igualmente produz manifestações contrárias ao Marx e seu sistema de ideias. São precursores todavia ao dialogar com as ideias de Marx o Tobias Barreto e o Sílvio Romero. Vale apontar que estas primeiras leituras o mais das vezes não decorreriam da leitura direta do velho mouro mas de artigos de terceiros, em especial Ferri.

No Brasil, diante do ocaso da escravidão e da vinda de imigrantes há difusão de ideias anarcosindicalistas. Poderíamos descrever três vertentes políticas que remontam a este período originário da esquerda no Brasil. Há os anarquistas, que igualmente têm maior peso em países retardatários quanto à revolução industrial, como Espanha, Portugal e Itália. Outra vertente é socialista, de tipo reformista, organizada no Partido Socialista e em círculos operários. E, especialmente a partir do advento da revolução russa, o fortalecimento da orientação marxista-leninista que irá culminar na fundação do PCB em 1922, dirigido por Astrogildo Pereira e Octávio Brandão. Na verdade, o impacto da vitoriosa revolução dos soviets e o acirrado cerco militar a que a URSS viu-se envolvida na guerra civil engendrou a criação de núcleos de apoio à revolução no Brasil. Grupos de apoio à Rússia soviética e que pautavam a criação de um partido revolucionário. Muitos anarcosindicalistas sob o impacto da revolução aderiram ao bolchevismo. Anarquistas que restaram ficaram contra a construção do partido e com o tempo contra a própria revolução russa – mas seriam a partir de 1922 cada vez mais minoritários.

Outros temas abordados neste primeiro volume foi o influxo do movimento comunista vitorioso na China em 1949 e em Cuba em 1959 na trajetória do marxismo do Brasil e das organizações. Parece-nos que o caso de Cuba foi ainda mais impactante por configurar hipótese de êxito revolucionário na América Latina, a 90 milhas dos EUA. Muito influenciado pela experiência cubana Carlos Marighella romperia com o PCB defendendo o modelo da luta armada. Criticou-se muito na esquerda a análise do partido comunista acerca da questão nacional: defendia-se uma aliança política junto à burguesia nacional, em contraponto ao imperialismo (norte americano) em aliança com o latifúndio (feudal ou semi-feudal). Esta solução por etapas desafiou os acontecimentos de Cuba que já em 1961 definiu como socialista sua revolução.

Além da ANL, houve outro racha do PCB, o PCBR que previa a luta armada sem com isso abandonar o marxismo leninismo. Adveio a Ação Popular decorrente do movimento universitário católico. Mesmo as Ligas Camponesas de Francisco Julião invertiam a tática reformista pela via guerrilheira, também influenciados por Cuba. Mais um exemplo nítido da influência da Revolução de 1959 no país.

Não poderíamos estar de acordo com algumas opiniões dos articulistas, especialmente quando se referem a Stálin, “stalinismo” e o sentido real do XX Congresso do PC(us). Inegavelmente as chamadas revelações de Kruschov repercutiriam gravemente no movimento comunista internacional. Mas deve-se levar em conta que a satanização de Stálin em 1956 foi o primeiro passo efetivo para o aniquilamento da própria URSS. Stálin e seu movimento implicou nos momentos de maior potência do movimento socialista, situação capaz de efetivamente desafiar a ordem capitalista mundial. Foi o desmantelamento político da URSS um movimento passo a passo com o obscurecimento vulgar de Stálin.




[1] Mesma data da revolução Praieira de Pernambuco.

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