“A História Me Absolverá” – Fidel Castro
Resenha Livro #137 - “A História Me Absolverá” – Fidel Castro – Ed. Alpha-Ômega
Em 26 de Julho de 1953, 165 homens, liderados pelo jovem
advogado Fidel Castro, atacaram o Quartel de Moncada, fortaleza militar
localizada em Santiago de Cuba, província ao oriente da Ilha.
A ação corresponderia à primeira etapa da vitoriosa revolução cubana que teria como desfecho final o 31 de Dezembro de 1958 com a fuga do sanguinário ditador Batista da Ilha e a efetiva tomada do poder político pelas forças revolucionárias em 1º de Janeiro de 1959.
“A História Me Absolverá” por sua vez é a defesa de Fidel Castro
dentro do processo crime instaurado após a ação do 26 de Julho. Não se tratava
evidentemente de uma mera peça jurídica: desde 10 de Março de 1952 com o Golpe
Militar de Batista, Cuba vivia sob um estado de exceção, com todas as garantias
constitucionais suspensas, sendo aquele processo e especialmente o tratamento
bárbaro dado pelos militares tanto à população civil de Santiago de Cuba quanto
aos homens do movimento do 26 de Julho o maior testemunho de que não havia em
Cuba nada semelhante a uma situação de normalidade democrática.
Sabe-se que o exército de Batista conseguiu apenas reprimir
a ação dos revolucionários diante de sua enorme maioria em homens e armas –
ainda assim a vantagem moral dos revolucionários fizeram com que o exército
tivesse 3 vezes mais baixas nos conflitos do assalto de Moncada. Diante disso,
nos três dias subsequentes à ação dos homens de Fidel, ordens superiores deram
instruções para que, após o conflito e da forma mais covarde, se executasse
dentro da prisão e mesmo nos hospitais, arrancando das camas os feridos, pelo
menos 70 deles combatentes do Moncada – tudo para não macular a “imagem” do
exército. A população de Santiago de Cuba igualmente sofreu dos abusos do
exército, com muitos presos e mortos confundidos com revolucionários.
Quanto ao processo judicial, tentaram de todas as formas
calar Fidel Castro, inclusive manobrando para que ele não comparecesse à
audiência sob suposta existência de enfermidade inexistente.
Observa-se pelo pronunciamento que àquele momento a
revolução cubana tinha um caráter anti-latifundiário, lutava contra a corrupção
na política e buscava maior justiça social, ainda não possuindo caráter socialista
– este apenas decorre de momento posterior à tomada do poder com as
contradições frente ao imperialismo norte-americano em 1961.
São basicamente as seguintes tarefas colocadas pelos
revolucionários de Moncada: (i) restituir a soberania ao povo e proclamar a
constituição de 1940 como a verdadeira lei suprema de Cuba – e aqui vale
ressaltar que Batista editou leis que se sobrepunham a esta constituição dando
poderes a conselho de ministros que a qualquer momento podiam modificar
cláusulas consideradas pétreas num estado democrático como regime de governo
(monarquia, república), separação de poderes, etc. , revelando o mais absoluto
arbítrio; (ii) concessão da propriedade da terra desimpedida e intransferível a
todos os colonos, subcolonos, arrendatários, parceiros e posseiros que
ocupassem cinco ou menos caballerias ( 5 x 13 430 m) de terra, indenizando o
estado a seus antigos proprietários à base da renda média das referias parcelas
no curso de dez anos; (iii) concessão aos operário e empregados de direito à
participação de trinta por cento dos lucros de todas as grandes empresas industriais,
mercantis e mineiras, inclusive açucareiras, exceto exclusivamente agrícolas;
(iv) todos os colonos teriam direito de participar de 55% do rendimento da cana
e a cota mínima de 40 mil arrobas a todos pequenos colonos; (v) confisco total
de todos os bens dos corruptos, coniventes e herdeiros.
Ademais aqui o movimento já sinalizava sua vocação
internacionalista, nas palavras de Fidel:
“Além disso, a
política cubana na América seria de estreita solidariedade com os povos
democráticos do continente, e os perseguidos políticos pelas tiranias
sangrentas que oprimem as nações irmãs não encontrariam, como hoje, na pátria
de Martí, perseguição fome e traição, mas sim asilo generoso, fraternidade e
pão. Cuba deveria transformar-se em baluarte da liberdade e não símbolo vergonhoso
de despotismo”.
A defesa de Fidel Castro como se observa é antes um
julgamento histórico da recente trajetória política de Cuba que teve como ponto
de partida as lutas de resistência, em particular a partir do 10 de Março de
1952 e que culminariam posteriormente na vitória do 1º de Janeiro de 1959.
Outrossim, o discurso não deixa de fazer referência ao
histórico de lutas de Cuba, a José Martí, herói cubano de independência
Nacional, aos dois movimentos de libertação nacional cubanos, à resistência dos
estudantes que sempre tiveram um papel importante na história de Cuba, já desde
o período colonial espanhol. E se é certo que a história absolveu Fidel Castro,
deu-se o fato não pela lógica meramente instrumental de argumentos jurídicos,
mas pela prática na história que, consoante Lênin, sempre será o critério da
verdade.
“Senhores Juízes, ao
julgardes um acusado por roubo, não lhes perguntais quanto tempo está sem
trabalho, quantos filhos tem, em que dias da semana comeu; não vos preocupais
em absoluto, pelas condições sociais do meio em que vive; o enviais ao cárcere
sem maiores contemplações. Para lá não vão os ricos que queimam armazéns e
lojas para cobrar as apólices de seguros, ainda que também sejam queimados
alguns seres humanos. Eles têm dinheiro
de sobra para pagar advogados e subornar magistrados. Enviais ao cárcere o
infeliz que rouba de fome, mas nenhum das centenas de ladrões que roubarão
milhões ao Estado jamais dormiu uma noite no xadrez. Ides cear com eles no fim
do ano em restaurantes aristocráticos. Merecem vosso respeito. Em Cuba, quando
um funcionário se torna milionário da noite para o dia e entra para a sociedade
dos ricos, pode ser recebido com as mesmas palavras daquele opulento personagem
da Balzac, Taillefer, quando brindou em honra do jovem que acabava de herdar
imensa fortuna: “Senhores, bebamos ao poder do ouro! O Senhor Valentim, seis
vezes milionário, acaba atualmente de ascender ao trono. É rei, pode tudo, está
por cima de tudo, como acontece com os ricos. Daqui por diante, a igualdade
diante da lei, consignada no frontispício da Constituição, será um mito para
ele. Não estará sujeito às leis, ao contrário, as leis se submeterão a ele.
Para os milionários não existem tribunais nem sanções”. Fidel Castro
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