Joseph Stálin: Quebrando Mitos
Stálin e sua filha Svetlana
Quando Stálin foi eleito secretário geral do Partido Comunista Russo pelo Comitê Central em 3.4.1922 ele já era um velho e experimentado dirigente revolucionário.
Seus primeiros contatos com as ideias marxistas se deu de forma clandestina no Seminário Espiritual de Tíflis, instituição da qual foi expulso em abril de 1899 pelo seu comportamento rebelde.
Já a partir de 1900 é procurado pela polícia tzarista por sua atividade revolucionária, ingressando por quase duas décadas na clandestinidade.
Fazendo jus à caracterização de um velho bolchevista, no ano de 1901, Stálin é eleito para o comitê de Tifílis do Partido Operário Social Democrata Russo, que havia sido fundado em 1898 por Lênin, Plekhanov e outros.
Sua primeira dentre várias prisões na Sibéria ocorreria já em abril de 1902.
Segundo o depoimento de Joseph E. Davies (“Como Eu Vi Stálin”, 1943), se por um lado a polícia política tzarista era eficiente para espionar e prender opositores, o regime era desestruturado e desorganizado ao ponto de permitir a fuga com relativa facilidade dos presos remetidos para a Sibéria. Consta episódios cômicos da velha guarda bolchevique exilada na Sibéria, lendo capítulos do Capital para soldados tzaristas que reagiam com bocejos de sono.
Além disso, nestes exílios longínquos, Stálin e outros militantes tinham acesso à literatura marxista também com alguma facilidade – o futuro dirigente georgiano intercalava a militância clandestina na prisão com a leitura de obras marxistas e a prática de esportes.
No contexto da primeira Revolução Russa de 1905, Stálin organizou e dirigiu milícias operárias para combater os Centúrias Negras. Já em 1906 Stálin era inequivocamente a principal liderança bolchevique na Georgia, sua terra natal. Também ficou conhecida na história a participação do futuro marechal vermelho em ações diretas como assaltos a banco e roubos armados para providenciar fundos ao partido.
Neste sentido relata o embaixador Joseph E. Davies:
“Entre os métodos violentos a que recorreram os radicais, estava o de obter dinheiro para fins partidários por meio do roubo. O mais famoso desses roubos a mão armada foi levado a efeito pelo próprio Stálin. No dia 26 de Junho de 1907, houve uma súbita explosão de tiros de revólver e bombas no principal boulevard de Tiflis, homens e cavalos ficaram mortos no asfalto e $ 175.000,00, dinheiro do Estado, tinham desaparecido de um auto. Esse processo era conhecido por “expropriação” ou “ex” simplesmente, e já tinha sido praticado, com êxito outras ocasiões. (...) Stálin, que era membro de alta categoria do partido, representou o mesmo papel de um general numa batalha; planejou e preparou o ataque, e levou-o a efeito com oito camaradas, dois dos quais era mulheres e pertencia ao Partido Social Democrático”.
Em 1912 Stálin assume a direção do jornal PRAVDA (“A Verdade”) e um ano depois escreve o seu livro mais importante, trabalho elogiado por Lênin à Gorki, chamado “O Marxismo e o Problema Nacional”. Sobre este mesmo tema podemos fazer menção ao artigo “A Revolução de Outubro e a Questão Nacional”, trabalho redigido para o PRAVDA e publicado em 19.11.1918. Aqui, Stálin demonstra como a questão nacional assume diferentes contornos a depender das etapas burguesa e proletária da revolução Russa.
Em fevereiro de 1917 o movimento nacionalista russo assumia uma caráter de luta contra o regime tzarista, não resolvendo, mas agudizando os conflitos nacionais:
“O movimento nacional nas regiões periféricas tinha um caráter de movimento burguês. As nacionalidades da Rússia, durante séculos oprimidas e exploradas pelo antigo regime, pela primeira vez tiveram a sensação de sua força e se lançaram à luta contra seus opressores. Liquidação da opressão nacional era a palavra de ordem do movimento. Com a rapidez de um relâmpago, nas regiões periféricas da Rússia multiplicaram-se instituições nacionais. (...) Tratava-se de libertar-se do tzarismo, causa fundamental da opressão nacional, e de formar estados nacionais burgueses. O direito das nações à autodeterminação era interpretado como o direito da burguesia nacional das regiões periféricas a tomar o poder em suas mãos e a utilizar a Revolução de Fevereiro para formar um Estado nacional “próprio”.
Contudo, já no contexto da Revolução de Outubro, qual seja, na etapa socialista da revolução, alguns governos nacionais burgueses das regiões periféricas se ergueram junto à contrarrevolução. Conflitos neste sentido ocorreram na Polônia, na Finlândia e na Ucrânia. O que Stálin realça e conclui é que não é possível ao final a libertação nacional sem o rompimento com o imperialismo e com a dominação burguesa. Neste sentido, a questão nacional do ponto de vista revolucionário envolve a luta contra o imperialismo e pela libertação das colônias.
É certo que o internacionalismo dos bolcheviques teve de ser repensado à luz da ruína da expectativa de uma revolução socialista vitoriosa no ocidente. Alguns biógrafos e comentadores, incluindo o diplomata Joseph E. Davies, defendem que Stálin, ao contrário de Lênin e Trótsky, não alimentou grandes esperanças de que o socialismo sairia vitorioso na Alemanha e demais países adiantados, já cogitando de forma prematura a necessidade da URSS evoluir com as suas próprias pernas.
Esta pode ser uma forma inicial de se compreender a tão mal falada tese do “revolução de um só país”. Outro mito a ser quebrado. É certo que a oposição entre esta tese e o internacionalismo proletário que decorre pelo menos desde 1848 com o Manifesto Comunista foi, na maioria das vezes, muito mal colocada. Não existe nacionalismo grão russo em Stálin ou se quisermos em Lênin, que, ainda em atividade pelo menos até 1922, teve notícia da derrota da revolução alemã e da necessidade de uma mudança de expectativa.
Socialismo num só país significa fortalecer as bases da construção do socialismo na Rússia e desde lá estabelecer um polo que pudesse disseminar a revolução mundial – lutar pela vitória do socialismo na Rússia não se contrapõe na luta pela disseminação mundial da revolução, mas, pelo contrário, se complementa. Vejamos o que diz Stálin em seu “Balanço do XIII Congresso do PC da Rússia” de 17 de Junho de 1924:
“Acusam-nos de desenvolver na Europa Ocidental a propaganda contra o capitalismo. Devo dizer que essa propaganda não nos faz falta. A própria existência do Poder Soviético, o seu desenvolvimento, os seus progressos materiais, o seu indubitável fortalecimento constituem a propaganda mais eficiente entre os operários que tenha vindo ao país soviético e observado a nossa ordem de coisas proletária, terá podido ver o que representa o Poder Soviético e do que é capaz a classe operária, quando se encontra no Poder. É justamente esta a verdadeira propaganda, uma propaganda de fatos, que tem eficiência muito maior entre os operários do que a propaganda verbal dos jornais. Acusam-nos de fazer propaganda no Oriente. Isto também são tolices. Não temos necessidade de propaganda no Oriente. Basta que qualquer cidadão de um país dependente ou de uma colônia venha ao país soviético e veja como negros, brancos, russos e não russos, homens de todas as raças e nacionalidades, impulsionam, estreitamente unidos, a obra do governo de um grande país, para convencer-se de que este é o único país onde a fraternidade dos povos não é uma frase mas uma realidade”.
Stálin faleceu em 5.3.1953. Três anos depois, na ocasião do XX Congresso do Partido, teria início uma operação de longo prazo de restauração capitalista na URSS concluída entre 1988-1991. A primeira etapa do projeto anti-comunista era nada mais nada menos do que a campanha antiestalinista. O fato é que, se houve um momento em que os capitalistas estiveram em apuros no último século, isto ocorreu em 1945 com o fim da Segundo Guerra Mundial, com o gigantesco respeito granjeado pelo exército vermelho perante o proletariado mundial diante da destruição militar do nazi-fascismo. Num período mais recente, com o enfraquecimento do discurso anticomunista e uma nova bibliografia da URSS oriunda da abertura de arquivos, cresce o interesse pelas ideias e pela obra de Joseph Stálin.
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