sábado, 1 de agosto de 2020

150 ANOS DO NASCIMENTO DE VLADIMIR ILITCH LÊNIN




“Temo que as Marcas ao mausoléu

Com o estatuto de reverências

Inundem com o doce fel

A simplicidade de Lênin” (Vladimir Maiakovski - 1924)

 

Em 22.4.2020 completou-se 150 anos do nascimento de Lênin, teórico e dirigente do partido bolchevique, principal liderança do agrupamento comunista no contexto das revoluções de fevereiro e outubro de 1917 na Rússia.

 

Estamos de acordo com Gyögy Lukács que considerou Lênin “o único teórico à altura de Marx até agora produzido no interior da luta de libertação proletária[1]”, assertiva que subsiste até os dias de hoje.

 

Os relatos daqueles que conhecerem Lênin revelam um estudioso e militante revolucionário incansável, disciplinado e ortodoxo no marxismo.

 

Nesse sentido, Lênin dedicou boa parte de sua militância em polêmicas em face de revisionistas que deturparam o conteúdo revolucionário do pensamento de Marx.

 

A polêmica com Kautsky no “A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky” escrito em novembro de 1918 é representativa da defesa do marxismo ortodoxo por Lênin. A deturpação do conceito de ditadura do proletariado pelo ideólogo da social democracia alemã essencialmente retira do estado e da democracia, entendida na sua forma “pura”, o conteúdo de classe da política. Como se a assunção formal de democracia, na forma de “uma cabeça um voto”, tivesse que ver com a forma de democracia proletária suscitado por Marx e Engels em seus textos sobre o problema de transição, nitidamente sobre a Comuna de Paris. Se Marx e Engels censuram a comuna foi por ela não ter radicalizado no sentido de esmagar a resistência burguesa com maior violência. Marx por exemplo condenou a Comuna por sua hesitação em não expropriar o Banco de França, e não pelos excessos de violência revolucionária do movimento.

 

Nesse sentido, preleciona Lênin:

 

“Marx e Engels analisaram muito pormenorizadamente a Comuna de Paris e mostraram que o seu mérito consistiu na tentativa de quebrar, demolir a “máquina de Estado pronta”. Marx e Engels atribuíram tal importância a esta conclusão que em 1872 apenas introduziram esta emenda no programa “obsoleto” (em algumas partes) do Manifesto Comunista. Marx e Engels mostraram que a Comuna suprimiu o exército e o funcionalismo, suprimiu o parlamentarismo, destruiu a “excrescência parasitária que é o Estado”, etc., mas o sapientíssimo Kautsky, tendo enfiado o barrete de dormir, repete aquilo que os professores liberais disseram mil vezes: as fábulas sobre a “democracia pura”.

 

O trabalho teórico de Lênin foi de temas em maior nível de abstração, como seus cadernos filosóficos acerca da filosofia de Hegel, até as polêmicas em torno de questões objetivas, como o papel do campesinato na revolução e a natureza política da Guerra Imperialista.

 

Ainda do século XIX, Lênin, ligado ao então minoritário agrupamento marxista na Rússia, polemiza com os populistas, posteriormente organizados no partido dos socialistas revolucionários nos primeiros anos de 1900. É o caso de “Quem São Os Amigos do Povo” publicado em 1894. Os populistas viam na mir, na tradicional comunidade agrária russa, o embrião do socialismo. Os populistas não viam o desenvolvimento do capitalismo na Rússia como um processo necessário do desenvolvimento histórico, mas como uma anomalia que poderia ser contida pela ação política. Nesse sentido, os populistas, ao contrário dos marxistas, não viam o proletariado urbano como o setor social protagonista da revolução. Lênin desenvolveu trabalhos analisando o desenvolvimento do capitalismo na Rússia, bem como polemizou com os socialistas revolucionários suscitando o protagonismo operário na Revolução. Muitos trabalhos de Lênin se voltam para a questão agrária, especialmente destacando a diferenciação de classe entre os camponeses, dos camponeses pobres e assalariados, aliados naturais dos trabalhadores urbanos, aos latifundiários associados aos capitalistas.   

 

Na obra “O Que Fazer” (1902), Lênin desenvolveu uma teoria de organização partidária diferente da desenvolvida ao tempo de Marx e Engels. Em Lênin se trata já de um partido de vanguarda, do núcleo mais decidido e mais avançado politicamente, que introjeta a consciência política social democrata “de fora para dentro”. A necessidade da organização política diz respeito a não se limitar à consciência política espontânea oriunda das lutas sindicais, que jamais conseguirá ir além da luta por demandas pontuais. A teoria da organização política de Lênin nos demonstra que se os revolucionários “economistas” atuarem como o melhor dos melhores sindicalistas, será uma tragédia para a revolução, já que a renúncia da luta política permitirá que o czarismo se perpetue ad infinitum.  

 

As análises de Lênin sobre a natureza política da Guerra Imperialista também são fundamentais para aqueles que querem estudar o pensamento do dirigente da revolução russa. Os cadernos de Lênin mostram que ele leu 148 livros e 213 artigos em inglês, francês, alemão e russo para esclarecer o seu pensamento sobre o imperialismo contemporâneo. O imperialismo em Lênin se refere ao desenvolvimento desigual e combinado do capitalismo em escala global e ao uso da força para manter a desigualdade.

 

A era do imperialismo é a era de crises, guerras e revoluções.

 

A Guerra Imperialista em curso é uma decorrência da nova etapa do capitalismo imperialista, baseando na hegemonia dos monopólios e na partilha do mundo pelas potências da época, nitidamente Inglaterra, França e Alemanha. A Rússia, subordinada aos interesses do capital anglo-francês, permaneceu na Guerra mesmo após a Revolução de Fevereiro quando o governo provisório ratificou os tratados secretos firmados pelo Czar. Os bolcheviques travaram uma luta duríssima em face das demais organizações socialistas da Europa que adotaram uma linha ora o social-chauvisnismo ora centrista, que apenas se colocava contra a guerra nos discursos, enquanto na prática defendiam seus respectivos governos na guerra.  

 

No que se refere ao temperamento de Lênin, consta que era tanto um revolucionário incansável quanto um estudioso em tempo integral. Casado desde jovem com Nadejda Krupskaia, não teve filhos. Gostava de crianças e tinha predileção por gatos. Era extremamente organizado, mantinha sua mesa de trabalho sempre em ordem e os lápis sempre afiados. Gostava de praticar esportes, como natação, caminhadas e ciclismo e consta que no exílio em Paris, cidade que Lênin não gostava, foi atropelado enquanto pilotava sua bicicleta.

 

Lênin, com sua verve irônica e seu marxismo ortodoxo, certamente ridicularizaria os agrupamentos da esquerda pequeno burguesa que hoje em dia defendem políticas identitárias. Em uma carta, manifestou desconfiança com grupos que já ao seu tempo falavam de liberação sexual: dizia que as pessoas que estavam preocupadas com estas questões eram tão obsessivas como um faquir em face de seu próprio umbigo.

 

Em maio de 1922 Lênin sofre o primeiro AVC que o deixou com a fala debilitada. Em dezembro de 1922 um segundo AVC. Faleceu em 21 de Janeiro de 1924, após algum tempo já debilitado, no distrito de Gorki Leninskiye.



[1] LUKÁCS,. G. Lênin. Um estudo sobre a unidade de seu pensamento. São Paulo. Boitempo, 2012. P. 33.

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