sexta-feira, 14 de agosto de 2020

BREVES NOTAS SOBRE CARLOS MARIGHELLA

 

BREVES NOTAS SOBRE CARLOS MARIGHELLA  

 

 

 

“E que eu por ti, se torturado for, possa feliz, indiferente à dor, morrer sorrindo a murmurar teu nome”. Liberdade  - Carlos Marighella – 1939.

 

Carlos Marighella nasceu em 5.11.1911 na cidade de Salvador, Bahia. Seu pai, Augusto Marighella, era imigrante italiano, oriundo de São Paulo, operário metalúrgico e motorista de caminhão de lixo. Sua mãe, Maria Rita do Nascimento, era ex-empregada doméstica e descendente de escravos.

 

Aos 18 anos de idade Carlos Marighella iniciou o curso de Engenharia na Escola Politécnica da Bahia. Tornou-se militante do Partido Comunista Brasileiro em 1932 e neste mesmo ano foi preso pela primeira vez após escrever um poema contendo críticas ao interventor da Bahia Juracy Magalhães.

 

Em 1934 já era um militante profissional do PCB, transferindo-se para o Rio de Janeiro. Em 1936 foi novamente preso durante 23 dias quando enfrentou terríveis torturas da polícia do RJ. Esta segunda prisão ocorreu no contexto de perseguição aos comunistas oriunda do fracassado Levante Comunista em 1935 promovido pela Aliança Nacional Libertadora com o apoio do PCB contra o governo de Getúlio Vargas.

 

Carlos Marighella voltaria ao cárcere em 1939, sendo mais uma vez torturado de forma brutal na Delegacia de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo.  Foi recolhido depois ao presídio de Fernando de Noronha e Ilha Grande pelos seis anos seguintes, desenvolvendo trabalho de educação cultural e política junto companheiros de cadeia.

 

O dirigente do PCB foi anistiado em abril de 1945, participando do processo de redemocratização do país e da reorganização da reorganização do Partido Comunista na legalidade, tendo sido eleito deputado federal na Constituinte de Dutra, pelo estado da Bahia.

 

Analisando os artigos de Marighella por esta época verifica-se um tom político bastante diferente do que depois haveríamos de verificar no seu contexto de rompimento com o PCB e defesa da urbana guerrilha no Brasil.

 

Neste contexto, imediatamente posterior à II Guerra Mundial, ainda estava em vigência a estratégia da frente ampla em defesa da democracia e contra o fascismo. No discurso “A democracia Está em Marcha” proferido por Marighella em ato promovido pelo Movimento de Unificação dos Trabalhadores em 18.6.1945, o autor sinaliza bem a política levada à cabo pelos comunistas em defesa da democracia e da paz:

 

“Uma coisa era o dever que tínhamos de impedir a marcha ascendente do fascismo, combatendo-o de armas da mão. Outra, a nossa obrigação de ajudar pacificamente a democracia quando é ela que vai em marcha ascendente no mundo. (...) 1935 representava uma fase em nossa evolução política. Era o ascenso do fascismo. 1945 é o ascenso da democracia. Em 1935 o integralismo estava da legalidade. E o Partido Comunista na ilegalidade. A democracia estava debilitada e ameaçava soçobrar, porque o Partido Comunista – o seu maior esteio – estava perseguido e fora da lei. Em 1945 quem está na ilegalidade é o integralismo. O Partido Comunista está na legalidade. A democracia está se reforçando e será uma realidade, porque o Partido Comunista – seu maior esteio – tem vida legal e está dentro da lei”.

 

Em 1945 a linha do PCB é a de colaboração de classes com a burguesia nacional progressista no esteio da luta antifascista e da constituição de uma frente ampla nacional. O programa dos comunistas também envolve a luta pela revolução democrática contra o latifúndio e o que se entendia como “resquícios do modo de produção feudal” no Brasil.

 

Contudo, pouco tempo depois, já sob a influência crescente da Guerra Fria, Dutra colocaria o PCB na ilegalidade.    

 

Nesse sentido, escritos posteriores de Marighella, como seus artigos na revista “Problemas – Revista Mensal de Cultura Política” dão ênfase ao problema da intervenção imperialista norte americana na política nacional. Dutra é caracterizado nestes artigos como uma governo de “traição nacional”. Vejamos um artigo de Marighella redigido em outubro de 1948:

 

“Nunca é demais repetir, como assinalou Zhdánov, que o principal perigo para a classe operária consiste atualmente na subestimação de suas próprias forças e na superestimação das forças do campo imperialista. (...) Daí por que devemos nos colocar à frente das massas, na sua resistência em todos os domínios ao imperialismo americano e ao governo de Dutra, seja no terreno político, estratégico militar, econômico e ideológico. (...) Reunindo nossas forças às de todos os patriotas, firmemente ligados às grandes massas, seremos capazes de derrotar a política de guerra de Dutra e os planos agressivos do imperialismo americano, e assegurar para o nosso povo a paz e o caminho de sua independência nacional.”.

 

Três grandes eventos certamente tiveram um impacto especial junto a Marighella implicando na sua ruptura com o PCB em 1966/68.

 

Em primeiro lugar, entre 1953 e 1954, Marighella esteve na China,  conhecendo de perto o país a luz da revolução camponesa e popular vitoriosa de 1949.

 

Em 1959 triunfa a Revolução Cubana colocando no centro do debate da esquerda revolucionária a viabilidade das guerrilhas.

 

E, finalmente, o golpe militar no Brasil em 1964 expos a debilidade dos comunistas que vinham até então atuando sob a direção da burguesia nacionalista. A derrota expos a pouca atenção que os comunistas davam ao campesinato, privilegiando a aliança do proletariado com a burguesia nacional. A derrota expos a confiança que os comunistas depositavam ao dispositivo militar, esquecendo a natureza de classes das forças armadas.  

 

A carta à comissão executiva do Partido Comunista Brasileiro foi escrita por Carlos Marighella em 1.12.1966 sob o impacto daqueles três grandes eventos: revolução chinesa, revolução cubana e golpe militar de 1964.

 

Marighella critica a direção do PCB que interditava a discussão no seio do partido. Mas o mais importante era mesma o despreparo ideológico e político dos comunistas diante do golpe. Marighella critica a tese de que a burguesia seria a força dirigente da revolução brasileira, subordinando a tática do proletariado à tática da burguesia. A ditadura busca institucionalizar-se por meio de eleições farsescas em que apenas candidatos coniventes com o regime golpistas podem ser eleitos – neste sentido, Marighella insiste no sentido de que o momento não é de chancelar a farsa eleitora. Diz a carta: “a saída do Brasil – a experiência atual está mostrando – só pode ser a luta armada, o caminho revolucionário, a preparação de insurreição armada do povo, com todas as consequências e implicações que daí resultarem”.

 

Em fevereiro de 1968 Carlos Marighella fundou a Ação Libertadora Nacional, organização guerrilheira que defendia a ação direta revolucionária através de assalto a bancos, sequestros e justiçamentos. Neste período Marighella chega mesmo a defender “terrorismo vermelho”. Livros como Por que Resisti à Prisão e Mini Manual do Guerrilheiro Urbano indicam bem a orientação política de Marighella neste último período. Os objetivos políticos das guerrilhas são dois: expulsar o imperialismo norte americano do país e derrubar pela força o regime militar.

    

FIM

 

Quando Marighella foi morto, em 4.11.1969, aos 57 anos, verificou-se que o dirigente comunista estava seguindo as próprias orientações do seu manual do guerrilheiro urbano. Portava um revolver na cintura e duas cápsulas de cianureto.

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