terça-feira, 21 de julho de 2015

”A Vanguarda Operária” – Celso Frederico

”A Vanguarda Operária” – Celso Frederico



Resenha Livro –180 “A Vanguarda Operária” – Celso Frederico – Editora Símbolo / Coleção Ensaio e Memória 24

Este ensaio sociológico buscou de forma pioneira pesquisar a questão da consciência da classe trabalhadora brasileira: o objeto de estudo, realizado no início da década de 1970, veio a coincidir com um momento histórico especial, de reorganização e despertar para novas lutas operárias desde a indústria automobilística da região do ABC. Quando da realização da pesquisa sobre a consciência de peões e ferramenteiros da indústria automobilística de São Bernardo do Campo, a reorganização sindical ainda dava seus primeiros passos naquela região e o que o pesquisador pôde observar, no que se refere às formas de resistência dos operários, eram ainda formas embrionárias que iam da sabotagem individual, da destruição de máquinas e peças, à operação tartaruga, individual ou coletiva, além de pequenas paralisações espontâneas: não há de se esquecer que o contexto histórico é o da ditadura militar que não consentia o direito de greve e colocava à disposição dos patrões auxílio policial para reprimir qualquer forma de contestação.

O sociólogo ao definir o seu tema de estudo, o problema da consciência operária, constatou a dificuldade de se aferir informações sobre o tema a partir dos métodos tradicionais de pesquisa de campo: formulários e questionários a serem respondidos a partir dos quais se extrai uma “média aritmética” que retrataria como os trabalhadores pensam. E isso por alguns motivos. Em primeiro lugar, existiria um certo desnivelamento ou deslocamento entre o pesquisador e seu objeto de estudo o que engendraria sempre numa relação de desconfiança dos trabalhadores. Estes entendem mesmo intuitivamente o trabalho como a fonte originária de uma série de conflitos pessoais e sempre, nas entrevistas de campo, “procurariam desvencilhar-se de perguntas incômodas, mudar de assunto, fazer observações visivelmente contraditórias, ou permanecer num silêncio significativo”.

“A ambiguidade das informações assim obtidas apontavam para a questão que a sociologia não sabe ou não pode resolver: a dissimulação mais ou menos consciente que está na base das relações que o operário estabelece com o pesquisador”. 

Esta lógica da dissimulação é uma arma de defesa dos oprimidos e explorados em épocas de paz: o explorado ou oprimido, como um povo subjugado pelo colonialismo pode, segundo Otávio Paz, citado por Frederico, manter uma atitude reservada com seus algozes, dissimulando o seu ódio. Esta lógica da dissimulação perpassa a relação de estranhos supostamente interessados em conhecer de perto a consciência dos explorados.

A alternativa metodológica buscada pelo sociólogo foi então a de sondar a consciência dos explorados a partir dos “operários avançados”. Trata-se dos setores mais politizados que poderíamos (a revelia do autor que não utiliza estra expressão) designar como “vanguarda” dos peões – certamente, o termo deve ser utilizado com reservas já que no momento da pesquisa o nível organizativo ainda era baixo e não se cogitava o salto nas mobilizações que daria ensejo ao movimento do novo sindicalismo.

O que caracteriza os operários avançados é a sua tipicidade: eles manifestam de forma mais aberta e expressiva aquilo que os demais ainda elaboram, desde o ponto de vista da sua  consciência de classe, de forma ainda embrionária.

“Os operários avançados são operários típicos, no que diz respeito à consciência de classe, porque eles se destacaram, diferenciando-se do conjunto dos trabalhadores, ao se colocarem na linha de frente das lutas sociais. Na indústria automobilística, eles aparecem como o ponto mais avançado e, portanto, mais concreto da consciência de classe. Pois o concreto, como ensina Alfredo Bosi, na sua origem etimológica quer dizer: crescer junto, formar-se em densidade “concrescer”

Os operários avançados formam um setor cuja consciência cresceu junto com a classe na luta diária contra a dominação capitalista. Nessa luta, e somente nela, pôde a consciência enriquecer-se de determinações, desenvolver-se, pois aí se expressa praticamente o ser da classe operária a que Marx se referia”.

Observa-se aqui então dois critérios metodológicos distintos. Um de orientação positivista baseado em coleta “fria” de números e amostragens, revelando uma suposta neutralidade que na verdade revela a aparência do fenômeno – a lógica da dissimulação. E uma metodologia orientada desde o ponto de vista dos operários avançados que corporificam a consciência operária em sua concretude naquele determinado ambiente – fábrica, nos departamentos dos ferramenteiros, na linha de montagem, etc.

Esta segunda metodologia se serve dos depoimentos pessoais dos operários avançados bem como sobre manifestações culturais ou artísticas dos trabalhadores – há na pesquisa a transcrição de uma peça redigida por um trabalhador que descreve o cotidiano dos peões da indústria automobilística, o drama de sair de casa às 05:00 e retornar às 11:00 e não ver os filhos crescerem, a iniciativas individuais de protestos que envolvem discussões e bate boca com gerentes – a história parece um ciclo sem fim, remete ao “fim de partida” de Samuel Beckett, com um final inconcluso, como se a vida do trabalhador, alienado, fosse despropositada, sem sentido....

A pesquisa do sociólogo avança desde as formas mais individuais de resistência, que é a destruição ou inutilização de peças e máquinas, até a greve, que, conforme dito, começava a ser organizada e agitada quando da realização da pesquisa a partir de 1968. A organização propriamente dita dos trabalhadores ainda persegue sendo um dos problemas atuais na indústria automobilística e do movimento operário brasileiro como um todo. Mesmo diante do reconhecimento formal (legal) dos sindicatos, fica pendente a associação dos trabalhadores com fins que extrapolam a mera representação dos empregados e o assistencialismo. Trata-se da organização com a finalidade de pôr abaixo o regime de exploração capitalista. E o próprio capitalismo engendra tal organização:

“Numa tal situação, torna-se mais do que nunca, impossível harmonizar os interesses contraditórios. A completa realização da exploração capitalista – agora levada ao limite – vai gerar necessariamente sua “negação”: a união dos trabalhadores. Após ter organizado os operários num mesmo local, durante 12 horas por dia, a fábrica ainda precisa aproximá-los em pequenos grupos, tanto por um imperativo do processo de produção, quanto pela necessidade de dinamizar o trabalho através da formação de um “espírito de equipe”. Assim, a fábrica acaba criando os pré-requisitos de uma outra forma de associação que, certamente, não estava nos planos da gerência industrial.

É a própria organização capitalista do trabalho que prepara as condições que irão propiciar a emergência do contrapoder operário. Consciente desta articulação dialética que acompanha os desdobramentos da realidade social, um operário escreveu: “o dono da fábrica e seus cupinchas têm o controle da produção, e nós vamos politicamente a mão de obra para paralisar a produção”. 

Um comentário:

  1. Eu via que a midia dava espaço muito grande as açoes de lula não entendia mas quando acabou a fase aurea da ditadura e ele montou o PT e este recebeu as benesses d midia entedi tudo era a esquerda que a direita queria para arrazar com os que ainda tivesse sobreviviveu dos nacionalista por isso preste se uniu ao PDT

    ResponderExcluir