A História de São Sebastião do Rio de Janeiro
Resenha Livro – “História do Brasil Geral e Regional. Rio e Minas” – Ernani Bruno – Ed. Cultrix
“Primeiro, os feitores das plagas solitárias
de Cabo Frio e do Rio de Janeiro, abrigados em choças cobertas de folhas de
palmeira, açoitadas pelas chuvas tropicais, resgatando o pau-de-tinta com o
bugre e plantando alguma cana para terem o açúcar com que combater o escorbuto.
Os donatários e povoadores que nas paragens costeiras espírito-santenses e
fluminenses, entravam em contato ou em luta com o índio, edificando povoações e
engenhos, sem se descuidarem do corsário francês interessado na coleta do
pau-brasil e da pimenta nativa. Os padres jesuítas que exilavam nas solidões do
Novo Mundo ensinando a doutrina cristã e os ofícios caseiros nos aldeamentos de
indígenas e nos colégios e casas cobertas de telha que erguiam nas povoações.”.
Os primeiros
contatos do colonizador português com o território onde hoje se situa a cidade
do Rio de Janeiro deu-se quase imediatamente após o “descobrimento” do Brasil
pela expedição de Pedro Álvares Cabral.
Ao invés de se
falar em “descobrimento”, hoje a historiografia com mais propriedade fala
em “achamento” do Brasil.
O verbo “achar”
remete à ideia de algo que sabemos existir, mas não sabemos exatamente onde a
coisa está. E todas as evidências documentais revelam que antes de 1500 ao
menos já se desconfiava da existência do território onde se situaria a maior e
mais importante colônia portuguesa.
A própria data
da assinatura do Tratado de Tordesilhas, que se deu em 1494, reforça a tese.
O tratado não só
dividiu entre Portugal e Espanha as terras recém descobertas como “terras a se
descobrir”. Fato curioso, e pouco ensinado na escola, é que a própria linha de
demarcação, feita seis anos antes da expedição de Cabral, já envolvia parte do
território brasileiro.
Não faria
sentido as duas principais potências marítimas da época firmarem um tratado
diplomático sem informações minimamente consistentes sobre os limites e porções
territoriais que foram repartidos a cada uma das coroas.
O conhecimento
destas terras pelos portugueses muito provavelmente data dos últimos anos do
século XV. Tratava-se de um segredo de estado que seria revelado ao público e
sacramentado através da conhecida expedição cabralina.
Já em 1501, uma
expedição de reconhecimento da costa brasileira bordejou o litoral da porção meridional
ao sul do país e denominou os locais de acordo com impressões e acidentes da
própria viagem: Cabo de São Tomé, Cabo Frio e Rio de Janeiro.
O nome da cidade
que seria no futuro a capital do Brasil foi dado após os portugueses chegarem
na baía da Guanabara, onde se supôs se tratar da foz de um rio. Como a
embarcação lá chegou em 1º de Janeiro de 1502, ficaram aquelas terras
denominadas “Rio de Janeiro”.
Os primeiros
esforços de reconhecimento e povoamento da região foram quase sempre inviabilizados pela resistência dos índios
tamoios, que logo se aliariam aos traficantes franceses que aqui chegaram para
comercializar o pau brasil.
Neste primeiro
momento, foram estruturadas feitorias em Cabo Frio e Rio de Janeiro, com
reduzidas condições de desenvolvimento. A organização da vida econômica dava-se
em torno de atividades de coleta, exploração do pau brasil, pesca e criação de
mandioca, cana e gado.
A primeira forma
de institucionalização do território fluminense deu-se através da criação da
Capitania do Espírito Santo por meio de doação por carta de 1535 a Vasco
Fernandes Coutinho e da Capitania de São Tomé ou da Paraíba do Sul por meio de
doação por carta de 1536 a Pero de Góis Silveira.
Contudo, mesmo
após a criação do Governo Geral (1549), quando Portugal implantou um novo
sistema administrativo para melhor aproveitamento e ocupação humana da colônia,
toda a área costeira do leste meridional brasileiro continuava deserta,
ostentando, em um ou outro ponto, alguns arraiais e feitorias insignificantes
do ponto de vista econômico.
Os poucos
empreendimentos iniciados pelos colonos eram rapidamente atacados e destruídos
pelos bugres tamoios. Não foram poucos os colonos portugueses trucidados por
índios enfurecidos.
A sobrevivência dos
moradores da região estavam condicionadas aos recursos da terra e às roças dos
indígenas. Os recursos alimentícios se limitaram à farinha de mandioca e ao
pescado.
Neste cenário de
vazio populacional, aparece a figura dos traficantes franceses que inicialmente
comercializaram o pau brasil e a pimenta e já em meados do século XVI aqui
estabeleceriam a França Antártica.
A ocupação
francesa e a constituição da França Antártica não decorreu apenas de desígnios
econômicos, relacionados ao contrabando francês, mas a razões religiosas. O rei
da França e seus correligionários protestantes calvinistas pretendiam reservar
para os de sua seita um refúgio seguro no Novo Mundo, confiando a expedição de
conquista ao almirante Durand de Villegagnon.
A fundação da
cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro deu-se no bojo da luta pela expulsão
dos franceses.
Tratava-se de
certa forma de um movimento de libertação nacional levado adiante por
portugueses, mamelucos e índios que encontraria paralelo na heroica luta nacional
pela expulsão dos holandeses já no século XVII.
Muito se fala
hoje em dia na luta anti imperialista dos vietnamitas contra os americanos ou
mais recentemente dos afegãos que se organizaram em torno do talebão para
colocar o inimigo estrangeiro literalmente em fuga desesperada.
No caso da mobilização
pela expulsão dos franceses e holandeses, tratou-se de uma vitória de maior
envergadura. Os mamelucos, mestiços e índios, que constituíam de forma
embrionária o povo brasileiro, lutaram contra grandes potências coloniais
praticamente sem ajuda da Coroa portuguesa ou qualquer apoio que não fosse os recursos
da terra.
Da primeira
expedição militar comandada por Mem de Sá em 1560 até a efetiva vitória sobre o
invasor francês com a campanha levada adiante por Estácio de Sá, foram quase
dez anos de lutas.
A campanha decisiva,
levada adiante por Estácio de Sá, teve auxílio de navios oriundos de Bertioga,
conduzindo índios, mamelucos e colonos vicentinos. A vitória sobre o elemento
estrangeiro seria complementada no ano de 1575 pela guerra vitoriosa travada
pelos moradores da região contra os bugres tamoios.
Ainda assim, o
território fluminense apenas passaria a se constituir como o principal centro
urbano da colônia em meados do século XVIII quando seu eixo econômico deixa de
ser os engenhos de açúcar do nordeste para passar a ser exploração do ouro e
diamante na região onde hoje se situa o estado de Minas Gerais.
Fenômeno que
seria sacramentado com a transferência da sede administrativa colonial de
Salvador para o Rio de Janeiro no ano de 1763, ocorrido no bojo das reformas de
Marquês de Pombal.
Desde então, a
cidade do Rio de Janeiro se constituiu como o mais importante centro político
cultural do país, ao menos até a expansão da economia do café desde o Vale do
Paraíba até o território paulista. Mesmo não sendo hoje o centro econômico mais
importante do Brasil, o Rio de Janeiro segue sendo um dos ou o mais importante
centro de elaboração e orientação nacional em torno do pensamento, das letras e
das artes.
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