segunda-feira, 12 de abril de 2021

“A Escravidão no Brasil” – Jaime Pinsky

 “A Escravidão no Brasil” – Jaime Pinsky



Johann Moritz Rugendas: habitação dos negros

 

Resenha Livro - “A Escravidão no Brasil: as razões da escravidão, sexualidade e vida cotidiana, as formas de resistência” – Jaime Pinsky

 

A escravidão não significa apenas um modo de produção ou uma mera relação sócio-econômica. Ela se caracteriza pela mais completa sujeição de um homem a outro – o escravo não é apenas a propriedade do senhor, mas também sua vontade está sujeita à autoridade do dono e seu trabalho pode ser obtido até pela força.

 

O escravo não é apenas objeto, mas pessoa sujeita a suas vontades: contudo, além de não pode exercer a sua vontade livremente, será obrigado ao trabalho, além de separado sumariamente de seu local de origem e de sua família, obrigado a renunciar sua identidade e até mesmo suas crenças religiosas.

 

Assim que desembarcava no Brasil, o escravo era batizado, mediante sal na boca, recebendo um nome cristão. A religião cumpria a função de ensinar a mansidão e o conformismo: devida ser a religião “um freio para os revoltosos, um consolo para os desanimados, uma esperança para os desgraçados e um alento para os fracos”, como se dizia na época.

 

Como se sabe, no primeiro século de colonização no Brasil, os Portugueses adotaram o regime de trabalho escravo dos índios. Uma certa historiografia e literatura românticas, muito tempo depois, iria sedimentar a ideia de que o índio teria uma inabilidade inata ao trabalho escravo, desde que vivia no seu estado natural, sempre cioso de sua liberdade. Nestes termos, sugeriu-se que o escravo africano seria naturalmente mais adaptado ao trabalho servil do que o índio.

 

Na verdade as razões pelas quais predominou a partir dos séculos XVI e XVII o trabalho escravo negro sobre indígena diziam respeito a questões de ordem prática: a fraca densidade demográfica da população indígena no Brasil, o fato de as tribos ficarem cada vez mais arredias, a própria dizimação dos indígenas por doenças e pela superexploração do trabalho, além da proteção jesuítica ao índio.

 

Ademais, havia o interesse da coroa e dos traficantes: “enquanto a captura do índio era quase um negócio interno da colônia – quando, frequentemente, até o quinto (imposto) devido à Colônia era sonegado – o comércio ultramarino trazia excelentes dividendos tanto ao governo, quanto aos comerciantes. Assim, governo e jesuítas apoiavam indiretamente os traficantes, estabelecendo limitações à escravidão indígena – em nome de Deus”. (Jaime Pinsky)

 

O negro portanto foi trazido para exercer o papel de força de trabalho compulsória numa estrutura organizada para a grande lavoura, inicialmente o açúcar e, posteriormente, o café. Também atuaram na mineração, no cultivo do algodão, no extrativismo vegetal na Amazônia, na pecuária e em trabalhos urbanos.  

 

A violência em face do escravo era institucionalizada. Os castigos mais frequentes eram de açoite, mediante chicote. Muitas vezes sequer era necessário o escravo ter cometido uma infração para ser castigado. Em algumas fazendas, logo quando chegava, o escravo era açoitado para demonstrar que naquelas paragens qualquer rebeldia seria objeto da mais brutal repressão. O negro, após as sessões de tortura, deveria engolir o seu orgulho e não manifestar resistência.

 

Não interessava porém aos proprietários assassinar ou inutilizar um escravo, a não ser em casos de grave rebeldia, como forma de exemplo aos demais. Os escravos eram também uma mercadoria, um instrumento de trabalho de alto valor pecuniário.

 

Neste contexto, as autoridades passaram a estabelecer regras sobre os castigos. No Rio de Janeiro, por exemplo, os açoites eram aplicados entre nove e dez da manhã, precedido de uma cerimônia pública, com a participação de populares. No pelourinho (uma grande pedra, ou um tronco de madeira, com duas argolas laterais) o negro era amarrado e supliciado. Havia também os calabouços: espécie de cadeias onde escravos eram castigados ou mesmo abandonados pelos proprietários.

 

Contrariando a ideologia romântica que afirma a natureza livre do índio em contraponto ao africano, foram diversas as formas de resistência à escravidão pelo negro. Fugas eram recorrentes, não só por não se conformarem com os maus tratos mas pela busca da liberdade, ainda que por pouco tempo, até a captura.

 

Os quilombos foram constituídos através de ajuntamento de fugitivos, alguns com grandes dimensões, como Palmares, que resistiu por mais de 60 anos, reunindo uma população de até 20 a 25 mil pessoas.

 

Havia também os assassinatos aos senhores, envenenamentos, os suicídios, os motins e revoltas urbanas. As mais importantes revoltas que contaram com participação de escravos foi a Balaiada (1838/1841) no Maranhão e a Revolta dos Males (1835) na Bahia.    

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