“A Escravidão no Brasil” – Jaime Pinsky
Johann Moritz Rugendas: habitação dos negros
Resenha Livro - “A
Escravidão no Brasil: as razões da escravidão, sexualidade e vida cotidiana, as
formas de resistência” – Jaime Pinsky
A escravidão não significa
apenas um modo de produção ou uma mera relação sócio-econômica. Ela se
caracteriza pela mais completa sujeição de um homem a outro – o escravo não é
apenas a propriedade do senhor, mas também sua vontade está sujeita à autoridade
do dono e seu trabalho pode ser obtido até pela força.
O escravo não é apenas
objeto, mas pessoa sujeita a suas vontades: contudo, além de não pode exercer a
sua vontade livremente, será obrigado ao trabalho, além de separado
sumariamente de seu local de origem e de sua família, obrigado a renunciar sua
identidade e até mesmo suas crenças religiosas.
Assim que desembarcava no
Brasil, o escravo era batizado, mediante sal na boca, recebendo um nome cristão.
A religião cumpria a função de ensinar a mansidão e o conformismo: devida ser a
religião “um freio para os revoltosos, um consolo para os desanimados, uma
esperança para os desgraçados e um alento para os fracos”, como se dizia na
época.
Como se sabe, no primeiro
século de colonização no Brasil, os Portugueses adotaram o regime de trabalho escravo
dos índios. Uma certa historiografia e literatura românticas, muito tempo
depois, iria sedimentar a ideia de que o índio teria uma inabilidade inata ao
trabalho escravo, desde que vivia no seu estado natural, sempre cioso de sua
liberdade. Nestes termos, sugeriu-se que o escravo africano seria naturalmente
mais adaptado ao trabalho servil do que o índio.
Na verdade as razões pelas
quais predominou a partir dos séculos XVI e XVII o trabalho escravo negro sobre
indígena diziam respeito a questões de ordem prática: a fraca densidade demográfica
da população indígena no Brasil, o fato de as tribos ficarem cada vez mais
arredias, a própria dizimação dos indígenas por doenças e pela superexploração
do trabalho, além da proteção jesuítica ao índio.
Ademais, havia o interesse
da coroa e dos traficantes: “enquanto a captura do índio era quase um
negócio interno da colônia – quando, frequentemente, até o quinto (imposto)
devido à Colônia era sonegado – o comércio ultramarino trazia excelentes
dividendos tanto ao governo, quanto aos comerciantes. Assim, governo e jesuítas
apoiavam indiretamente os traficantes, estabelecendo limitações à escravidão
indígena – em nome de Deus”. (Jaime Pinsky)
O negro portanto foi
trazido para exercer o papel de força de trabalho compulsória numa estrutura
organizada para a grande lavoura, inicialmente o açúcar e, posteriormente, o
café. Também atuaram na mineração, no cultivo do algodão, no extrativismo vegetal
na Amazônia, na pecuária e em trabalhos urbanos.
A violência em face do
escravo era institucionalizada. Os castigos mais frequentes eram de açoite, mediante
chicote. Muitas vezes sequer era necessário o escravo ter cometido uma infração
para ser castigado. Em algumas fazendas, logo quando chegava, o escravo era açoitado
para demonstrar que naquelas paragens qualquer rebeldia seria objeto da mais brutal
repressão. O negro, após as sessões de tortura, deveria engolir o seu orgulho e
não manifestar resistência.
Não interessava porém aos proprietários
assassinar ou inutilizar um escravo, a não ser em casos de grave rebeldia, como
forma de exemplo aos demais. Os escravos eram também uma mercadoria, um
instrumento de trabalho de alto valor pecuniário.
Neste contexto, as autoridades
passaram a estabelecer regras sobre os castigos. No Rio de Janeiro, por
exemplo, os açoites eram aplicados entre nove e dez da manhã, precedido de uma
cerimônia pública, com a participação de populares. No pelourinho (uma grande
pedra, ou um tronco de madeira, com duas argolas laterais) o negro era amarrado
e supliciado. Havia também os calabouços: espécie de cadeias onde escravos eram
castigados ou mesmo abandonados pelos proprietários.
Contrariando a ideologia romântica
que afirma a natureza livre do índio em contraponto ao africano, foram diversas
as formas de resistência à escravidão pelo negro. Fugas eram recorrentes, não
só por não se conformarem com os maus tratos mas pela busca da liberdade, ainda
que por pouco tempo, até a captura.
Os quilombos foram
constituídos através de ajuntamento de fugitivos, alguns com grandes dimensões,
como Palmares, que resistiu por mais de 60 anos, reunindo uma população de até
20 a 25 mil pessoas.
Havia também os
assassinatos aos senhores, envenenamentos, os suicídios, os motins e revoltas
urbanas. As mais importantes revoltas que contaram com participação de escravos
foi a Balaiada (1838/1841) no Maranhão e a Revolta dos Males (1835) na Bahia.
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