“Notas
Sobre a Revolução Iraniana”
“Em
janeiro de 1979, depois de retirar dos bancos elevadas quantias de dinheiro da
família real, Mohammed Reza Pahlavi fugiu do Irã. Quinze dias mais tarde, em 31
de janeiro de 1979, o Aiatolá Ruhollah Khomeini voltou triunfante para o seu
país. Jornalistas presentes em Teerã calcularam que mais de 2 milhões de
pessoas foram recebê-lo. No decorrer dos últimos meses ele havia ganho o apoio
de quase todos os grupos de oposição e sua popularidade era dominante. Mas a
ascensão ao poder de Khomeini e a fuga do xá eram o coroamento de uma série de
outros acontecimentos” (GORDON, Matthew).
A
Revolução Iraniana de 1979 corresponde a mais um capítulo de tantos outros
levantes e revoluções populares de países periféricos em face da dominação
imperialista norte-americana e europeia.
Mobilizações
neste sentido foram frequentes a partir do pós II Guerra Mundial, começando
pela Revolução Chinesa de 1949, passando pela Revolução Cubana de 1959, pela
Guerra Vietnamita e pelos incontáveis levantes de orientação anticolonialista
na África. Contudo, o problema da religião, no caso do islamismo xiita,
certamente deu contornos específicos à experiência iraniana e, em certa medida,
já sinalizou os próprios limites daquele movimento – uma revolução baseada
antes na luta contra a “ocidentalização” do país e, por conseguinte, contra a
infidelidade religiosa. Não se tratou de um movimento que passaria da etapa
democrática e anti-imperialista para a revolução propriamente socialista e
anticapitalista, como em Cuba e China.
ANTECEDENTES
A
tradição islamita no Irã, antiga Pérsia, não deve ser negligenciada para a
compreensão da Revolução. Isto porque, desde o ponto de vista da doutrina
xiita, quando um governo se mostra cruel e corrupto, é legítimo o levante para
destitui-lo. São antigas as imbricações entre política e religião na história
do islamismo xiita.
“Depois
do século XVI houve um número crescente de exemplos de ulemás xiitas que
ousaram falar contra governantes opressores. Eles desenvolveram uma tradição de
ativismo político. Um produto tardio dessa tradição seria o próprio Khomeini.
Organizando a oposição ao xá, ele provaria ser um hábil estrategista político,
um religioso capaz de aliar os princípios doutrinários com uma visão adequadas
dos diferentes momentos políticos. Além disso, Khomeini também se revelaria um
excelente orador, com uma capacidade notável para infundir num só discurso as
reivindicações, a história do Islã e as necessidades do povo iraniano”. (GORDON,
Matthew).
De
certa maneira, naquela sociedade religiosa de tipo milenar, as lideranças
religiosas e, em especial, os núcleos formados nas universidades não laicas em
Teerã e Qum, corresponderam ao papel dos nossos partidos políticos quanto à
organização para oposição, combate e derrubada do regime de Reza Pahlavi.
O
termo “aiatolá” tem o significado de guia espiritual, “milagroso sinal de
Deus”. Há o grupo dos “Ulemás” e
“Mulás”, homens de instrução religiosa que foram paulatinamente se opondo ao
regime do Xá, considerando que as suas reformas ocidentalizantes contrariavam o
islamismo.
SOBRE
AIATOLÁ KHOMEINI
Khomeini
era uma destas lideranças religiosas que granjeou apoio popular por sua
oposição à monarquia bem como pela defesa da instituição de uma república islâmica
sob novas bases constitucionais.
Consta
que Ruhollah Khomeini nasceu numa pequena vila em Khomein, na Pérsia. O país
passaria a se chamar Irá no ano de 1935, sob o regime de Reza Xá.
Mustafá,
pai de Khomeini também era um Mulá e direcionam, assim, o filho para a cidade
de Arak, a fim de estudar a lei e a religião islâmica. Em 1921, Khomeini
prossegue seus estudos em Qum, cidade que viria a ser no futuro um dos centros
de efervescência da Revolução de 1979. Já em 1931, Khomeini passaria a lecionar
na escola Faizieh e, posteriormente, participar da vida política do país.
A
crescente perda de popularidade da dinastia Pahlavi estava relacionada com a
brutal repressão política aos seus opositores patrocinada pela polícia política
SAVAK. Em 5 de Junho de 1963 Khomeini é preso por acusar o regime do xá de
querer destruir o islamismo: seguem-se na sequencia várias revoltas e a
decretação da lei marcial. Em outubro de 1964, o futuro Aiatolá é preso
novamente por criticar a lei que garante imunidade aos militares
norte-americanos no Irã, forçando-o a exilar-se na Turquia, posteriormente no
Iraque e, nas vésperas da revolução, na França.
Desde
o exílio, Khomeini fez intensa propaganda política: seus discursos eram distribuídos
clandestinamente em fitas cassetes no Irã.
Além
da repressão política, da corrupção e da ingerência dos EUA nos negócios
internos, as críticas de Khomeini direcionavam-se também ao pouco de
democrático que havia dentro das reformas levadas a cabo pelo Xá. Não só
Khomeini, mas a poderosa classe dos Ulemás se posicionaram contra a extensão do
direito de voto às mulheres iranianas e a instituição do ensino laico – ainda
que a iniciativa da reforma educacional também estivesse destinada a
enfraquecer a liderança Ulemá em benefício do Xá.
Seria
importante salientar o papel desempenhado pelo Partido Tudech (Partido
Comunista Iraniano) na oposição ao xá. Este grupo mantinha ligações com a URSS
e a China e foi perseguido posteriormente pelo Khomeini, praticamente
aniquilando a organização em 1984.
Reza Pahlavi
DA
REVOLUÇÃO
No
ano de 1973 o Xá do Irã esteve nos EUA em visita ao presidente Richard Nixon,
que chamou o xá de um “estadista de primeira linha”. Por de trás destas
relações, havia o interesse norte-americano nas reservas de petróleo iranianas,
em regime de exploração desde a década de 1940 e em boa parte controladas por
companhias estrangeiras. Havia também o interesse de manter o país como uma
espécie de polícia subordinada da região do golfo pérsico.
A
corrupção no Irã era generalizada e fortemente denunciada pelos Ulemás. Estas
lideranças religiosas eram seguidas pelos estudantes, sendo certo que o
movimento estudantil contribuiu decisivamente nas ruas para a radicalização da
revolução – basta lembrar que foram estudantes que em 4.11.1979 tomaram de
assalto a embaixada norte-americana em Teerã e mantiveram como reféns 52
pessoas por 444 dias.
A
data de 7.8.1978 ficou conhecida como a “Sexta feira Negra”. Durante o protesto, mais de 100 manifestantes
foram mortos pela polícia em Teerã. Em 11.12.1978, 1 milhão de pessoas tomaram
as ruas da capital protestando contra o Xá.
Cerca de 30 dias depois, Mohammed Reza Pahlavi fugiria do Irã, abrindo o
caminho para a ascensão de Khomeini e a instituição de uma República Islâmica.
Aliados
da revolução passaram a ser perseguidos, como o já mencionado partido Tudech.
Estima-se que nos primeiros cinco anos da Revolução Iraniana, houve 10 000
executados e 40 000 presos políticos pelo novo regime. Outro desdobramento da
revolução iraniana foi a Guerra entre este país e o Iraque, presidido então por
Saddam Hussein.
REVOLUÇÃO
PERDIDA?
A
transformação radical das estruturas econômicas, sociais, políticas e
culturais, bem como a aceleração dos tempos históricos são os traços que
caracterizam as revoluções. Nem sempre as revoluções assumem contornos
anticapitalistas e apontam para a alternativa societária socialista/comunista.
Na verdade, a maioria das revoluções corresponde a oportunidades perdidas:
mesmo o seu triunfo inicial com a queda de um regime odiado pela população não
garante a transformação qualitativa do regime político, das formas sociais e da
estrutura econômica. Outra dificuldade criada pela história dos movimentos
revolucionários: Como dar um fim à revolução vitoriosa sem rejeitá-la no plano
ideológico e prático?
BIBLIOGRAFIA:
GORDON, Matthew. “Khomeini – Os Grandes Líderes” – Ed. Nova Cultural. 1987.
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