“Lênin” - Sua Vida e
Sua Obra – Instituto Marx, Engels, Lênin e Stálin
Resenha Livro - “Lênin” -
Sua Vida e Sua Obra – Instituto Marx, Engels, Lênin e Stálin – Editora Vitória
“Os mencheviques e os social revolucionários sustentavam
abertamente o poder burguês. No I Congresso dos Soviets da Rússia (junho de
1917), o chefe menchevique Tsereteli declarou que, sem o poder burguês e sem a
aliança com a burguesia a revolução pereceria. Afirmava categoricamente que não
existia partido, na Rússia, que quisesse, sozinho, todo o poder. Lênin
aparteou, de sua bancada: “Este partido existe!”. Suas palavras repercutiram
como um raio em céu sereno. “O partido bolchevique – declarou Lênin – está apto
a assumir totalmente o poder, a qualquer momento... Dai-nos vossa confiança, e
vós daremos nosso programa”.
Esta biografia de Lênin teve uma edição brasileira pela
editora Vitória. A edição brasileira foi traduzida da edição em francês,
publicada pelas Edições em Línguas Estrangeiras (Moscou, 1946), segundo o texto
russo preparado pelo instituto Marx-Engels-Lênin-Stálin, correspondente à
edição russa de 1945.
É importante atentar-se para a data da publicação desta
biografia pra uma melhor compreensão da orientação política do trabalho.
Efetivamente, trata-se de uma história oficial, que atende à uma situação
política bastante específica da URSS no pós II Guerra.
Como se sabe foi a União Soviética o instrumento militar que
aniquilou o nazi-fascismo com todas as consequências que esteve fato teve e tem
para os destinos da humanidade. O exército vermelho dirigido pelo partido
comunista e a direção stalinista granjeou o respeito de trabalhadores de todo o
mundo. E mais: a vitória do exército vermelho no leste implicou num risco
objetivo de derrocada do capitalismo mundial. Na Europa, os soldados voltavam
do front e lidavam em seus países com os capitalistas que havia atuado como
colaboracionista dos nazis. Os trabalhadores e soldados retornaram do front
armados, desafiando ainda mais a ordem constituída. Diante do respeito da URSS
granjeado a partir da vitória militar, do apoio aos movimentos de libertação
nacional e as próprias vitórias do socialismo, pode-se dizer que o capitalismo
esteve no pós-guerra em risco iminente. O mais provável é que o período
stalinista da URSS constituiu-se como os momentos em que o capitalismo mundial
esteve mais ameaçado em sua existência, particularmente no terceiro mundo, o
que explica a campanha ideológica perpetrada em face do dirigente georgiano,
ininterrupta do pós guerra até o presente momento.
Em todo o caso, esta biografia de Lênin, história oficial redigida
no contexto do pós-guerra, como não poderia deixar de ser, tem uma linha
política nitidamente traçada – mas peca por um certo tom laudatório que implica
não exatamente na falsificação, mas numa parcialidade e numa teleologia, como
se os personagens considerados justos e injustos estivessem desde o princípio
atuando de forma coerente a favor ou contra o país dos soviets. Para ficarmos
nos exemplos da atuação de Trótsky. Como é cediço, pelo menos desde o II
Congresso do POSDR, Trótsky tinha uma atuação centrista, frequentemente de
conciliação junto aos mencheviques, em oposição à Lênin que sempre prezou pela
pureza ideológica do partido. Mas também é inegável a participação pessoal de
Tótsky na insurreição de Outubro 1917, fato este completamente omitido nesta
biografia. Stálin teve uma participação menor na insurreição de Outubro de 1917,
mas esta participação é realçada através da parcialidade e da teleologia ao
inverso. O sentido da história parece estar pré-determinado, desvirtuando a
própria história para a narrativa dos mitos.
Este trabalho tem um caráter informativo e
deve ser lido, sempre se sopesando os limites supracitados da narrativa. A
história pessoal do Lênin, um precursor das ideias marxistas na Rússia desde a
Emancipação do Trabalho em fins do XIX, até a criação do partido Social
Democrata e sua intervenção na revolução de 1905-7, no período
contrarrevolucionário e nas jornadas de fevereiro e outubro de 1917.
Todos os principais fatos do desenvolvimento revolucionário
remetem às intervenções de Lênin, que temperou e preparou o núcleo mais sólido,
decidido e revolucionário do movimento russo a partir de polêmicas com os
desvios de direita e de esquerda. Ainda em fins do XIX, a hegemonia do movimento
revolucionário russo estava nas mãos dos populistas. Estes nutriam a crença de
que o capitalismo na Rússia tinha um caráter acidental e contingente e viam nas
comunidades medievais camponesas da Rússia (“Mir”) um embrião da sociedade
igualitária. Neste cenário, Lênin dedicaria um largo esforço com estudo da
economia camponesa da Rússia de modo a estabelecer uma interpretação
efetivamente materialista da realidade russa, demonstrando como o capitalismo
não era um fenômeno isolado e acidental, mas uma tendência irresistível e
necessária, conformando desde já a classe operária nas cidades, classe
verdadeiramente protagonista da revolução.
Por este exemplo verifica-se que a história pessoal de Lênin
é também a história do movimento revolucionário e da própria revolução russa,
considerando que a liderança leninista se impôs como a melhor intérprete do
movimento histórico (desde que baseada na teoria mais eficiente para guiar a
ação).
Por outro lado, neste biografia estamos diante de uma
história oficial, um pouco laudatória, que não explora, por exemplo, a vida
pessoal e íntima de Lênin, sua infância em Kazan, sua relação conjugal, sua
vida cotidiana no exílio na Sibéria, ou em Genebra, dirigindo o movimento russo
e construindo uma nova internacional ante a falência da II Internacional e sua
capitulação à guerra imperialista.
Lênin como um herói ou como um mito: justifica-se a
narrativa ante o contexto histórico em que foi produzida, mas é indubitável que
este trabalho não substitui uma biografia que seja propriamente história, de
modo a revelar o que há de mais humano e ao mesmo tempo singular na personagem
delineada.
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