sábado, 11 de outubro de 2014

“Casa de Pensão” – Aluísio de Azevedo

Resenha Livro # 128- “Casa de Pensão” – Aluísio de Azevedo – Editora Escala



“Casa de Pensão” foi livro publicado em 1884, correspondendo a um dos mais conhecidos romances do escritor naturalista Aluísio de Azevedo, junto a “O Mulato” (1881) e “O Cortiço” (1890).  O escritor maranhense, nascido em 1857, é provavelmente o mais importante expoente daquela escola literária no Brasil, que teve origem na frança a partir dos romances de E. Zola.
Basicamente, o naturalismo tem como ponto de partida as ideias cientificistas muito em voga na Europa e no Brasil em fins do séc. XIX. Na literatura estas ideias fazem contraponto ao subjetivismo da escola romântica e buscam sempre explicar a conduta das personagens a partir das orientações dos instintos, dos traços biológicos ou mesmos de caracteres raciais ou ambientais. Há nos romances de Aluízio de Azevedo o determinismo, que significa basicamente a ideia de que o homem não está capacitado a agir pelo livre arbítrio mas está sempre sujeito de forma incondicional às forças do meio, dos instintos sexuais e de impulsos de certa forma incontroláveis.
Há de se constatar que será justamente em fins do séc. XIX que uma série de acontecimentos históricos coincidem com esta projeção no âmbito da história das ideias.
O recrudescimento do imperialismo europeu e a partilha da Ásia e da África por países de unificação tardia como Alemanha e Itália em fins do XIX e início do XX (fenômenos que iriam posteriormente engendrar a 1ª Guerra Mundial) seriam ideologicamente justificados por teorias racistas, como as ideias de Spencer e seu darwinismo social. Enquanto o Darwinismo advoga a seleção natural e a sobrevivência da espécie mais forte, o Darwinismo social faz uma analogia com as “raças” apontando os brancos como os mais adaptados e assim como autorizados a dominar negros, asiáticos, etc. Aluísio de Azevedo não demonstra um racismo tão explícito, todavia, tal visão social de mundo racista está bastante presente em fins do séc. XIX e, vale destacar, é uma decorrência da ligação entre a biologia e ciências sociais.
Esta coincidência entre as ideias da ciência e da biologia e da vida social seriam também observadas de uma certa forma nos romances naturalistas, não necessariamente num viés escancaradamente racista, mas definitivamente caracterizada pela: (i) objetividade na descrição dos personagens; (ii) pelo determinismo, ou seja, pelo homem condicionado pelo meio e muitas vezes vítima de seu próprio instinto; (iii) pela temática da crítica social e dos costumes, o que já vinha sendo prenunciado pela 3ª fase do Romantismo (a 1ª fase trata do nacionalismo e do indianismo, e a 2ª fase refere-se ao byronismo e especificamente à temática amorosa).
No que se refere à linguagem ou à forma descritiva, Aluísio de Azevedo assimila um tom objetivo procurando repercutir de forma fiel os diálogos das personagens, incluindo as interjeições (“arres”, “ixes”, etc), remetendo a narrativa naturalista a uma fonte histórica preciosa para aqueles que desejam conhecer a sociedade, a cultura, o universo estudantil e boêmio do Rio de Janeiro de fins do séc. XIX. Em outras palavras, por se pautar pela objetividade, o romance naturalista tanto corresponde à peça literária quanto à uma fonte histórica, ainda que baseada em ficção.
A história da "Casa de Pensão" refere-se à história de Amâncio de Vasconscelos, maranhense, filho de comerciantes ricos, que vem à corte (Rio de Janeiro) estudar medicina e aqui, pela primeira vez, aos vinte anos, longe da disciplina familiar, viria a buscar pela primeira vez uma vida de liberdade. A sua expectativa na corte está muito longe de avançar nos seus estudos – esta é a última das preocupações de Amâncio, ainda que consiga com muito esforço ser aprovado no primeiro ano de curso. O jovem estudante vivera uma infância marcada pela rígido controle disciplinar e falta de afeto do pai, apenas compensado pelos cuidados da mãe.
Amâncio chegou ao Rio de Janeiro, provavelmente como muitos outros jovens, muito mais interessado nos bailes, nos passeios públicos, na boemia e especialmente nas formosas damas da corte. E assim a narrativa se desenvolve, com o estudante se instalando primeiro na casa do comerciante Campos, amigo de seu pai, o velho Vasconcelos, e posteriormente, na pensão de Coqueiros.
As aventuras e desaventuras amorosas de Amâncio e seu trágico fim ficam por conta do leitor. Por suposto esta resenha não detalhará o enredo da história para cativar a leitura de “Casa de Pensão”. Terá uma boa oportunidade de conhecer particularidades da sociedade carioca de fins do séc. XIX que passam despercebidas dos livros de história mais tradicionais por não se referirem aos denominados “grandes eventos” (fatos políticos) mas à história do cotidiano – o dia a dia na casa de pensão, os almoços e jantares familiares, os relacionamentos amorosos bem como as traições conjugais, as pandegas dos estudantes, os processos judiciais e suas repercussões nos pasquins e jornais populares, e um longo etc.

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