domingo, 5 de dezembro de 2010

Os Corumbas - Amando Fontes

Resenha Livro #7 - Os Corumbas - Amando Fontes




Sobre o Autor

Amando Fontes foi jornalista, advogado e deputado estadual constituinte em 1946. Filho de um farmacêutico e uma dona de casa, ficou órfão ainda criança e foi criado pelos avós: passou a infância em Aracaju, residiu durante a vida no Rio de Janeiro, Salvador e Curitiba. Fontes escreveu apenas dois romances: “Os Corumbas” lançado em julho de 1933 e que já conta com 25 Edições (ainda que identificamos desconhecimento generalizado do autor e da obra) e o ainda menos conhecido “Rua do Siriri”, ambos lançados pela Ed. José Olympio.

O Que há de Particular em Fontes

A origem social pequeno burguesa e o relativo isolamento do autor frente aos circuitos literários e culturais de meados do séc. XX (apenas tardiamente Fontes junta-se ao grupo do poeta Augusto Schmidt) fizeram provavelmente com que seu texto se diferencie daqueles autores dedicados à literatura social. Sua narrativa dá voz aos trabalhadores e aos setores populares sem certa estigmatização correspondente ao olhar externo e mais ou menos descritivo da situação de sofrimento popular (tradição que é inaugurada já no naturalismo de “O Cortiço” de Aluízio de Azevedo) ou numa intervenção mais panfletária como os primeiros romances de Jorge Amado.

O que a gente vai percebendo conforme conhece a história de trabalhadores livres e pobres do Aracaju dos anos 1920-30 é uma humanização radical das personagens, como se houvesse um reconhecimento (naquele momento pioneiro) da condição de sujeitos: dos operários da fábrica de algodão, dos camponeses forçados a abandonar suas terras, dos setores populares da cidade, prostitutas, soldados e das donas de casa.

Antônio de Alcântara Machado em resenha escrita de quando do lançamento de Corumbas, enxerga a abertura de um novo caminho para a literatura nacional, comparando Fontes ao escritor e dramaturgo russo Aleksei Górki. Isto significa olhar para o povo e para os trabalhadores menos sob um olhar folclórico, idealizado, estereotipado ou tipicamente “descritivo” e mais sob uma forma mais ou menos equivalente ao retrato da sociedade burguesa sobre a qual a literatura realista do séc. XIX se ocupou – o senso humano ao qual nos referíamos diz respeito ao reconhecimento inclusive das superstições, preconceitos e mesquinharias dentre os proletários de Aracaju.

No Brasil, acreditamos que Graciliano Ramos também opera neste nível e já adianta – particularmente em Vidas Secas e Angústia – descrições psicológicas de personagens do povo num âmbito mais profundo. Ainda, Graciliano fala de funcionários públicos (Luís- Angústia), fazendeiros empobrecidos (Paulo – São Bernardo), jornalistas e profissionais liberais (Caetés) ou retirantes da seca (Vida Seca). Fontes fala de trabalhadores do campo e proletários da cidade.

Sobre Corumbas

Sá Josefa e Seu Gerado são dois agricultores do interior do Sergipe. Conhecem-se emblematicamente numa festança popular de comemoração da ocorrência das chuvas. Casam-se e tem filhos – alguns sobrevivem e trabalham desde cedo, outros morrem. As águas viabilizam sobrevida na roça: entretanto, o tempo passa, a chuva vai ficando escassa, os usineiros e senhores de engenho vão pagando cada vez menos pela cana e a vida no campo torna-se insuportável. O casal parte para Aracaju em busca de emprego nas fábricas de tecido. Àquela altura a família de retirantes conta com 3 mulheres e um homem, cada qual havendo de se empregar nas recém-construída indústria de algodão da capital.

A jornada de trabalho é descrita por Fontes contemplando as diferentes percepções das personagens à exploração da força de trabalho barata dos corumbas.

Alguns personagens reagem com ressentimento, rancor individual que se encaminha no abandono da família – este é o caso de Rosenda, a filha mais velha, a primeira a fugir com um namorado para o desgosto de Sá Josefa. Outros reagem à revolta através do riso – este é o caso da filha Albertina, personagem particularmente interessante em sua forma de encarar o trabalho pesado na fábrica, o assédio moral de patrões e o relacionamento com os homens. O seu fim, porém, se assemelha ao de sua irmã mais velha, com o agravante: mesmo tendo sido sempre cética em relação ao amor, apaixona-se, é violada, abandonada e apenas lhe resta a prostituição.

Pedro, o filho homem, é uma pessoa calada e fechada em seu mundo. Trava amizade com um intelectual que lhe introduz textos de Lênin e se junta a grupo que, pela primeira vez, organiza uma greve geral na capital do Sergipe – seu destino é a prisão, após a traição de advogado pessoalmente simpático à causa dos operários, mas ligado organicamente ao Estado.

A desagregação crescente e gradual dos corumbas conflui para que Sá Josefa e Geraldo tenham de perceber(e sentir) os efeitos perversos da vida na cidade e a derrocada dos seus sonhos. Todos os filhos se vão, só restam os pais. Não vamos dizer o que ocorre finalmente com o casal, evidentemente.

Uma passagem: a reação dos patrões

“As fábricas sentiram, então, toda a gravidade do perigo. Esqueceram questões de concorrência, que as havia afastado desde muito, e passaram a deliberar como um só corpo, unidas e solidárias. As suas diretorias, incorporadas, foram até a presença do chefe da polícia, que prometeu tomar as mais severas providências”.

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