“O Homem” – Aluísio Azevedo
Resenha
Livro - “O Homem” – Aluísio Azevedo – Iba Mendes Editor Digital – www.poeteiro.com
Aluísio
Tancredo Gonçalves Azevedo nasceu em 14 de abril de 1857 na cidade de São Luís
do Maranhão.
Era
filho de um vice-cônsul português, sendo certo que o próprio escritor
futuramente abandonaria a literatura aos 38 anos, para virar diplomata, tendo
servido na Espanha, Inglaterra, Itália, Japão, Paraguai e Argentina.
O nosso
escritor, quando criança, não era exatamente de família nobre e abastada, mas
certamente nunca passou por privações materiais.
No ano
de 1871, Aluísio se matriculou no Liceu Maranhense à época dirigido pelo
professor Francisco Sotero. No mesmo ano começou a ter aulas de pintura com o
artista italiano Domingos Tribuzzi.
Em 1876
o escritor mudou-se para o Rio de Janeiro, lá permanecendo por dois anos.
Trabalharia na imprensa carioca como caricaturista, se aperfeiçoando no desenho
após obter matrícula na Academia de Belas Artes. Chegou a solicitar à Assembleia
maranhense uma pensão para estudar em Roma, o que lhe foi negado.
Em 1878,
com a morte do pai, Aluísio regressa a sua terra natal, onde colaborará nos
jornais “Pacotilha” e “O Pensador”.
Da
pintura, passando pela caricaturista, é certo que a sua literatura teria alguma
influência desta espécie de arte e manteria interfaces com suas charges: seja a
proposta de uma narrativa objetiva que retratasse a realidade tal como ela é,
seja na criação de tipos sociais com uma intencionalidade de promover crítica
social e até mesmo humor.
“O
Mulato” foi o segundo livro publicado pelo escritor maranhense, lançado no ano
de 1881, mesmo ano, diga-se de passagem, da publicação de Memórias Póstumas de
Brás Cubas de Machado de Assis.
Supracitada
obra não guardaria a mais pálida semelhança com o primeiro trabalho do autor,
chamado “Uma Lágrima de Mulher” (1880).
O
primeiro livro ainda se pode caracterizar como romance folhetinesco, todo ele
se situando inclusive na Itália, sem referências nacionais.
Já o
segundo romance é tido por muitos como a primeira obra naturalista produzida no
país, o que é discutível desde que o menos conhecido Inglês de Souza com sua
proposta de literatura amazônica, já produzia livros naturalistas cerca de uma
década antes d’o Mulato.
Em todo
o caso, temos que o naturalismo literário praticado por Azevedo seria a mais
representativa versão dos livros de Émile Zola no Brasil.
Dentro
desta perspectiva, o homem olha objetivamente a realidade, sem enfeites de
imaginação que, frequentemente, resultam da impossibilidade ou da impotência em
explicá-la. Tal qual um cientista que analisa os fatos da natureza, o escritor
naturalista expressa o mundo onde pousa os seus pés. O individualismo romântico
é substituído pela descrição de tipos sociais que se confundem com o meio, o
que é nitidamente observado no romance “O Cortiço”: o meio e o homem se fundem
em uma única unidade.
Já os
pressupostos teóricos da escola naturalista envolvem o positivismo de Comte, o intelectualismo
de Taine, o determinismo, o darwinismo social e as teorias evolucionistas de
Spencer.
Boa
parte da crítica literária, capitaneada por Antônio Cândido, busca dividir a
obra de Aluísio Azevedo entre os trabalhos propriamente naturalistas, que
seriam os que alcançariam maior expressão e importância literária e outras
obras de menor relevância, de tipo romântico, folhetinesco e mais comerciais.
Dentre
as ditas “grandes obras” do nosso escritor temos “O Mulato” (1881), “Casa de
Pesão” (1883) e “O Cortiço” (1890), este último considerado o melhor livro de
Aluísio Azevedo.
“O Homem”
(1887) segue a mesma matriz naturalista,
sendo um sucesso de público. Além do viés cientificista ligado à descrição de
uma personagem acometida de histeria, o romance também envolve algo de
experimental, já que a realidade se confunde com os sonhos da protagonista, que
culminarão num fim trágico, com o assassinato de duas pessoas perpetrado por
aquela que deixou de ser capaz de diferenciar o real das experiências
imaginárias.
Magdá, a
protagonista, é filha do Conselheiro Pinto Marques, reside no bairro de
Botafogo no Rio de Janeiro. Lá viviam uma tia chamada Dona Camila e Fernando,
um afilhado do patriarca.
Fernando
e Magdá passaram a infância juntos, cresceram juntos, foram amigos e
posteriormente se apaixonaram, fazendo promessas de que se casariam após a conclusão
dos estudos do afilhado do Conselheiro.
Pouco
antes de cumprir a promessa do casamento, Pinto Marques intervém, negando
consentimento ao enlace. Neste momento, o Conselheiro foi obrigado a confessar
que na verdade Fernando e Magdá são irmãos: o afilhado na verdade fora fruto de
uma relação extraconjugal, fato que fora omitido até aqui, para se evitar
escândalos.
Após a
descoberta da verdade, Fernando decide se mudar para a Europa e Magdá fica em
estado de prostração e melancolia.
Orientado
pelo médico, o Dr. Lobão, o pai de Magdá se esforça para encontrar um casamento
para a filha, que sistematicamente vai negando consentimento a todos os
pretendentes.
Gradualmente,
a protagonista vai manifestando aquilo que os médicos caracterizavam como
histeria: Magdá inicialmente sofre ataques de nervosismo e manias de rezas.
Pode-se frequentemente observá-la fazendo monólogos a meio voz e apresentando sobressaltos
sem causas aparentes.
Em certo
passeio com o pai, Magdá observa trabalhadores braçais de uma pedreira
(cavoqueiros), com corpos másculos e bem definidos que a estimula a ter sonhos eróticos
– nesta passagem, o livro foi particularmente atacado pela crítica.
Consta,
efetivamente que o Rio de Janeiro se viu
escandalizado ao ler os devaneios eróticos da protagonista, descritos para
tratar do tema da histeria feminina:
“O
trabalhador que se ofereceu para conduzir Magdá era um mocó de vinte e tantos
anos, vigoroso e belo de força. Estava nu da cintura para cima e a riqueza dos
seus músculos, bronzeados pelo sol, patenteava-se livremente com uma
independência de estatua. Os cabelos, empastados de suor e pó de pedra,
caíram-lhe sobre a testa e sobre o pescoço, dando-lhe uma satírica feição de ingenuidade
ingênua.
O rapaz
passou um dos braços na cintura da Magdá e com o outro a suspendeu de mansinho
pelas curvas dos joelhos, chamando-a toda contra o seu largo peito nu. Ela
soltou um longo suspiro e, na inconsciência da síncope, deixou pender molemente
a cabeça sobre o ombro do cavoqueiro.”
Magdá
passa a ter sonhos com o cavouqueiro Luís, estimulada pela abstinência sexual,
tida como “não natural” dentro das premissas naturalistas. Efetivamente, o
médico Lobão insistentemente pressiona o conselheiro a casar sua filha para,
objetivamente, fazê-la concretizar o ato sexual: o contrário disso é uma
violação das leis da natureza.
Sem o
casamento, agrava-se a histeria, passando a protagonista a expressar a sua concupiscência
sexual quando dorme: através dos sonhos eróticos, o orgulho de mulher decente
abre luta contra a degradante lubricidade e luxúria dos sonhos com o cavouqueiro.
A
despeito do escândalo causado pelo livro, “O Homem” foi um sucesso de público.
O Cidade
do Rio (11 out. 1887, p. 1) noticiou que nas mesas das confeitarias na rua do
Ouvidor só se falava do novo livro de Aluísio Azevedo. Cinco dias depois do
lançamento já estava quase esgotada a primeira edição (A Semana, 15 out. 1887,
p. 1), que se referia geralmente ao primeiro milheiro.
O
sucesso do livro foi um feito excepcional para livros brasileiros, e foi através
dele que o escritor foi convidado para integrar a editora Garnier, responsável
pela publicação dos livros de Machado de Assis.
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