sábado, 20 de novembro de 2021

A CORTE DE D. JOÃO NO RIO DE JANEIRO

 A CORTE DE D. JOÃO NO RIO DE JANEIRO POR LUIZ EDMUNDO




 

Resenha Livro – “A Corte de D. João no Rio de Janeiro” – Luiz Edmundo – 1º Volume – 2ª Edição – Ed. Conquista.

 

“D. João tinha um tipo vulgar. Era curto, era grosso, a cabeça larga e vermelha, surgindo de um conflito de roscas e papadas.

Quando aqui chegou contava quarenta anos de idade. Parecia, porém, um velho de sessenta; o ventre em bola, desentocando de duas grossíssimas coxas que faziam estalar a seda de seus calções cor de pérola. Ar tímido, gestos amolengados. A marchar, marchava como pensava, devagar. Garante-nos o escritor português Oliveira Martins na sua História de Portugal, que ele era homem de pouco asseio, “de resto, como toda a família”, acrescenta, para dizer, logo depois que, ele, que andava, sempre às turras com a mulher, pensando de modo diverso, contrariando-a, em tudo, na hora do banho, com ela, logo ficava de acordo.”.

  

A transferência da Corte Portuguesa no Brasil, decorrência das Guerras Napoleônicas e de uma estratégia, traçada de forma intempestiva, de salvar a Dinastia dos Bragança, manter a aliança política e militar de Portugal com a Inglaterra e abandonar o território do Reino e sua população aos invasores franceses liderados pelo comandante Junot, teve diversas implicações na história do Brasil.

 

Mais exato seria dizer que a fuga da família Real e a instalação extemporânea  da Monarquia no Brasil traria como benefícios aos brasileiros:

 

1   A elevação do Estado do Brasil à condição de Reino Unido de Portugal e Algavres, criando as condições políticas e jurídicas da independência de 1822;

2-      A abertura dos portos às nações amigas, decisão tomada por D. João VI ainda na Bahia, antes mesmo da sua chegada no Rio de Janeiro onde se instalaria até o fim da Guerra Europeia.

3-      Benefícios de ordem cultural como a vinda da missão artística francesa, a fundação da Academia de Belas Artes, a fundação do Banco do Brasil, a criação de escolas de medicina na Bahia e no Rio de Janeiro, o Jardim Botânico e as obras de melhoramento urbano no Rio de Janeiro, que receberia de um dia para a noite cerca de 15.000 pessoas da corte portuguesa, na sua maior parte nobres e seus funcionários particulares.

4-      A criação da imprensa Régia em 13 de maio de 1808, dia do aniversário do príncipe regente D. João (1767-1826). Nela foi editado o primeiro jornal da colônia americana chamado a “Gazeta do Rio de Janeiro”.

 

Tão importantes como as condições geopolíticas da Europa que levaram a fuga da Família Real para o Brasil e os seus efeitos políticos, econômicos, sociais e culturais, é conhecer os bastidores desta grande operação, a intervenção não só do Príncipe Regente, mas das pessoas que o influenciavam, das repercussões destes fatos diante dos olhos do povo, ou melhor, dos povos de Brasil e de Portugal.

 

Quando da saída dos Barcos do Tejo em 1807, caia uma chuva triste e monótona e os portugueses tentavam esconder sua completa indignação diante do abandono de suas elites ante o invasor francês:

 

“- Patifes! Cobardes! Súcia! Então o povo é que fica? Nós o que somos? Abandonam-nos como se fossemos cães!

Há punhos no ar e os monitores do Sr. Intendente da Polícia suplicando calma.”.

 

Já a reação do povo brasileiro à chegada da Corte foi o exato oposto:  festas e folganças, clamores e vivas, foguetes e festas verdadeiramente populares com o povo “cantando, berrando, em meio à patuleia tumultuosa”.

 

Neste livro do escritor carioca Luís Edmundo de Melo Pereira da Costa, o que vemos é uma versão verdadeiramente brasileira dos fatos. A narrativa se parece com um romance, ou uma reportagem, tendo como fontes os arquivos históricos da cidade do Rio de Janeiro e as memórias de pessoas da nobreza e da elite política que tiveram contato direto com D. João IV, sua mãe, Maria I a louca, a libertina Carlota Joaquina, e os filhos D. Pedro e D. Miguel.

 

O livro é de fácil leitura e traz informações sobre os detalhes da viagem, o cotidiano do Rei e de sua família no Rio de Janeiro, as festas e cerimônias, dentre elas, a mais relevante: o beija mão, momento em que todos os tipos sociais, ricos e pobres, podiam fazer requerimentos diretos ao grande Rei.

 

Por expressar um ponto de vista brasileiro, e não português, o livro é de certa forma simpático ao D. João IV, retratado como aquela figura já conhecida: meio grotesca, glutão, pusilânime, mas com um bom coração, misericordioso, amante do Brasil, desconfiado, supersticioso, com medos de trovões, amante da comida (especialmente frangos), triste por ser obrigado pelas Cortes de Lisboa a retornar ao Reino.

 

Um Rei sem nenhuma originalidade ou ideias políticas próprias, levado a tomar decisões pelas pressões e forças dos acontecimentos. Mas, um monarca que não inspirava medo nos seu súditos, mas franca simpatia.  

 

SOBRE O AUTOR

 

Luís Edmundo foi jornalista, poeta, cronista, memorialista, teatrólogo e historiador. Nasceu no Rio de Janeiro, RJ, em 26 de junho de 1878, e faleceu na mesma cidade em 8 de dezembro de 1961. Era definitivamente apaixonado por sua cidade, dedicando boa parte do seu trabalho na pesquisa e publicações de crônicas sobre a cidade. Voltou seu interesse para o século XVIII e imaginou um vasto painel do Rio de Janeiro no tempo dos Vice-reis. Foi a Portugal, pesquisou em arquivos, bibliotecas e conventos de província, depois à Espanha, reunindo material, inclusive iconográfico, para as obras que iria escrever.

 

 

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