“Mao – O Processo da Revolução” –
Márcio Bilharinho Naves
Resenha Livro - “Mao – O Processo da
Revolução” – Márcio Bilharinho Naves – E. Brasiliense
"Na sociedade socialista
continuam a existir as classes e a luta de classes, a luta entre a via
socialista e a via capitalista. Não é suficiente a revolução socialista apenas
na frente econômica, relativamente à propriedade dos meios de produção, o que não
permite assegurar as suas conquistas. E preciso também uma Revolução Socialista
conseqüente na frente política e ideológica" MAO TSÉ TUNG.
Um aspecto que certamente diferencia
a revolução chinesa das demais experiências revolucionárias socialistas ao
longo do século XX é o seu aspecto de longa duração. Entre 1921 quando da fundação
do Partido Comunista Chinês em Xangai e a vitória final do exército vermelho sobre
o Koumitang em 1949 com a proclamação da República Popular da China em Pequim por
Mao passaram-se 28 anos. Praticamente três décadas de guerra civil e de
mobilização geral do povo chinês contra a intervenção imperialista japonesa que
vai de 1931 até 1945 com a derrota dos japoneses.
Neste contexto, este livro, dedicado
ao relato da trajetória de vida e das ideais de Mao Tsé Tung, chama atenção
para aquela que seria a principal contribuição do processo revolucionário
chinês. Contribuição no sentido de suscitar lições históricas de seus feitos e
derrotas: o problema da teoria da transição socialista que na China assumiu
contornos dramáticos, particularmente diante da Revolução Cultural.
Mao Tsé Tung nasceu em 1893 na
província de Hunan, no sul da China. Veio de uma família de camponeses dentro
de uma estrutura familiar rígida e patriarcal, dentro da qual o pai era
autoridade incontestada, muitas vezes surrando os filhos, privando-lhes de
dinheiro e comida. Consta que a mãe de Mao, por outro lado, era uma pessoa amável
e generosa. Costumava doar arroz aos pobres escondida do marido que não
aceitava tal comportamento. Mao trabalhava nos campos desde o 6 anos de idade,
tarefa que acumulou com os estudos aos 8 anos. Aos 16 anos o futuro
revolucionário deixou sua casa definitivamente matriculando-se na escola
primária de XiangXiang.
Em 1919 já em Pequim Mao Tsé Tung
consegue um cargo de bibliotecário na Universidade. O futuro dirigente faz
cursos e integra um grupo de estudos marxistas fundado por Lin Dazhao. Em 1921
dá-se a o primeiro congresso do Partido Comunista Chinês – apenas um ano anos
antes da fundação do nosso PCB aqui no Brasil.
Compareceram ao congresso 13 militantes,
entre os quais Mao Tsé Tung e representantes do Komitern. Num primeiro momento
o programa do partido recusa a colaboração de classes com a burguesia nacional
defendendo assim a independência política e de classe do partido. Tal
orientação seria alterada já no 3º Congresso do PCC sob a influência da III
Internacional. Havia uma política que poderíamos chamar de etapista no horizonte
da internacional segundo a qual os modos de produção suceder-se-iam, do
feudalismo, ao capitalismo, do capitalismo, ao socialismo. Países semi-coloniais
com heranças feudais como a China deveriam defender não a revolução socialista
mas a revolução democrático-burguesa, estabelecendo aliança com a burguesia
nacional para aniquilar as classes feudais que na China efetivamente se
revelavam na classe dos senhores de terra e da burguesia compradora. Este
política orientada no sentido da revolução democrático-burguesa teria como
resultado a defesa de uma aliança política com o partido nacionalista
Koumitang.
Os dirigentes do Koumitang pertencem
às classes dos proprietários, à burguesia nacional, aos bancários e aos
industriais. Em 12.4.1927 ocorre o massacre de Xangai das tropas nacionalistas
de Chiang Kai Shek sobre os comunistas. É importante salientar que a China
tinha uma particularidade que de certa forma possibilitou a articulação do
Partido Comunista e sua mobilização de milhões de camponeses e trabalhadores. A
China fora alvo de uma disputa interimperialista desde tempos remotos e seu
território é disputado pelo imperialismo inglês e japonês – do ponto de vista
militar, os comunistas deveriam tirar proveito das divisões do campo inimigo
para avançar. É a própria divisão do campo imperialista que permite a aliança
do Koumitang com o PCC na luta patriótica contra o invasor Japonês.
Seja como for, foi o exército
comunista que suportou o grosso das batalhas contra o invasor japonês,
particularmente entre 1941-1942. De modo que no término da guerra patriótica
com a derrota do Japão verificou-se que o exército comunista saiu fortalecido.
Havia uma diferença mesmo de concepção do exército que fora propugnado por Mao
e pelos marxistas chineses. O exército deveria ser a expressão armada dos
interesses e aspirações do povo. A libertação territorial do exército vermelho
era acompanhada da abolição da prostituição, fim da escravização de crianças e
do comércio e consumo de ópio. Mao defendia inclusive uma política de clemência
com relação aos prisioneiros de guerra japoneses. Estes não eram humilhados e
mortos: eram antes convencidos pela persuasão a se integrar a tropas
internacionalistas contra os japoneses ou então eram simplesmente liberados. Os
japoneses explicitamente tinham a orientação de aniquilar, destruir e matar. E
o Koumitang intervinha de forma arbitrária, perpetrando a violência e opressão
contra as massas camponesas.
No que se refere às ideias e
formulações teóricas de Mao Tsé Tung, três temas parecem ser mais salientados,
conforme a etapa da própria luta revolucionária na China. Os temas de política
e da arte militar; os temas da filosofia como expressão da luta de classes na
teoria, destacando-se os problemas da contradição e da dialética; e a teoria da
transição que surge no contexto da Revolução Cultural.
Não estamos de acordo com de Márcio
B. Naves com relação ao problema da transição na China não ter sido levado até
as últimas consequenciais, por exemplo, através da política de disseminação das
comunas, ignorando, assim, a natureza política da ditadura de classe desde a
orientação leninista, que não prescinde do partido, do estado e do controle
social dos meios de produção. Também não parece apropriado caracterizar a China
de 1950 como país cuja forma social é a do capitalismo de estado.
A possibilidade da restauração
capitalista através de movimentos supostamente “democráticos” foram, como
demonstra os exemplos do leste europeu, nada mais do que contra-revoluções de
veludo, na expressão de Ludo Martens. Contudo, parece certo que a Revolução
Chinesa efetivamente levou a níveis talvez não antes vistos o problema da
transição socialista, a relação entre a propriedade dos meios de produção e o
partido, a questão da divisão social do trabalho e as necessidade objetiva de
desenvolvimento das forças produtivas para o alcance de novas relações de
produção socialistas.
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