Uma História da Amazônia
Resenha Livro –
“História do Brasil Geral e Regional – 1º Volume – Amazônia (Acre – Amazonas –
Pará e Territórios)” – Ernani Silva Bruno – Ed. Cultrix
“Revelada à Europa a existência da América e
descoberto o Brasil, a costa do extremo-norte brasileiro e as margens do baixo
Rio Amazonas passaram a ser de longe e longe abicadas pelas caravelas de um ou
de outro navegante castelhano ou português mais atrevido. Era a madrugada do
século dezesseis, e o mistério das terras e das ilhas de aquém-Atlântico devia
envolver ainda em um clima incomum e quase fantástico de aventura a jornada de
veleiros que se botavam para o Novo Mundo. Mas permaneceu ainda por alguns
decênios desconhecido pelo homem branco – e ignorado pela cultura do “mundo
civilizado” da época – o segredo bárbaro das florestas, dos rios, das ilhas e
dos nativos da região amazônica”.
Missionário
franciscano e governador do Bispado da Bahia, Frei Vicente do Salvador (1564/1639)
foi o primeiro cronista da História do Brasil. Escreveu sobre o território que
então pertencia à colônia portuguesa em dezembro de 1627, pouco mais do que um
século após a chegada de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro.
Ficou famosa a
imagem com que Frei Vicente descreveu do processo de ocupação do território do Brasil
nos primeiros anos da colônia: por negligência dos portugueses, mesmo sendo
grandes conquistadores de terras, não se aproveitaram delas, contentando-se em
“andar arranhando ao longo do mar como caranguejos”.
De fato, no
primeiro século da colonização do Brasil, a ocupação do território limitou-se
às regiões litorâneas, do norte ao sul – daí a conhecida analogia com a forma
como se movem os caranguejos.
Essa situação se
explica por razões econômicas: num primeiro momento, estabeleceram-se feitorias
na costa, onde os navegadores transacionavam o pau brasil e especiarias. E a
partir do século XVI houve a constituição dos engenhos de açúcar, também
situados na costa, dada a proximidade dos mercados europeus. Há também as
razões políticas: a constituição das
capitanias hereditárias em 1534 em núcleos portuários de norte ao sul teve como
causa primordial resguardar o território em face dos assédios dos franceses, ingleses
e holandeses. Ou mesmo antes, por meio do Tratado de Tordesilhas (1494), quando foi atribuído à Portugal a
parcela ao leste de um meridiano traçado a 400 léguas do arquipélago de Cabo
Verde.
O processo de
interiorização da ocupação territorial do Brasil se daria de forma paulatina, a
partir do 1600, seja através das expedições dos sertanistas paulistas na caça
de índios para a escravidão, iniciando com a destruição de missões jesuíticas
ao sul, ampliando as fronteiras do país; deu-se através da pecuária,
especialmente na região do nordeste, servindo como mercado abastecedor das
regiões portuárias; e finalmente através do ciclo da mineração, que também
mobilizou os bandeirantes através de frentes pioneiras em direção ao centro
oeste e norte – em 1651, tendo partido de São Paulo e transposto os Andes, a
bandeira de Antônio Raposo Tavares desceu pelo Rio Amazonas.
Quando falamos
da região da Amazônia, o processo de ocupação populacional daquele vasto
território, que abrange os estados do Acre, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e
Amapá, foi certamente o que encontrou maiores dificuldades.
Ainda hoje, a
baixa densidade populacional é o traço mais característico da região.
A distância com
os mercados europeus fez com que no período colonial houvesse pouco
desenvolvimento da agricultura de exportação na Amazônia. Os índios, ao seu
passo, além de frequentemente trucidarem os poucos colonos que tentaram ocupar
a área, quando pacificados, também não se revelavam aptos e disciplinados ao
trabalho do campo.
As grandes
distâncias, na escala de milhões de km², aliada à vegetação fechada, com rios
caudalosos, chuvas e alagamentos, onças, saúvas e morcegos, tornaram o ambiente
inóspito para a formação de núcleos populacionais em torno de alguma atividade
agrícola. Dada a inadaptação do índio ao trabalho na lavoura, prevaleceu a
economia extrativista – e os poucos engenhos de açúcar da região, distantes dos
centros consumidores, explicam a baixa presença da população africana (escrava)
na Amazônia.
Dado interessante
é que a abolição da escravidão na província do Amazonas ocorreu em 1884, quatro
anos antes da Lei Áurea. O que se explica não por algum bom senso da classe
dominante daquela província, mas pela pouca importância do trabalho escravo na
região.
Do ano de 1500
quando surgiram as primeiras viagens de reconhecimento até meados do século XIX
quando se abriu a etapa do ciclo da borracha, a economia da região Amazônia centrou-se
em atividades coletoras e na agricultura de subsistência. A fonte de
alimentação, seguindo a tradição do índio e do caboclo (“tapuia”) se dava
através da caça, da pesca. Houve o desenvolvimento de alguns poucos engenhos de
cana de açúcar, a produção do algodão, do cacau mas a predominância deu-se em
torno da atividade coletora dos produtos das florestas, designadas “drogas do
sertão” (castanha, anil, urucum e salsaparrilha).
Essa economia do
tipo coletora e extrativista foi um fator de dispersão do povoamento e estabeleceu
uma dificuldade crônica de criação de cidades ou vilas com alguma duração no
tempo: encerrando-se determinado ciclo produtivo, as áreas eram logo
abandonadas, o que se evidenciou de maneira dramática durante o período do
ciclo da borracha, quando muitos tapuios abandonaram as suas fazendas para se
lançar à extração da seringueira.
Desde o período
colonial até o século XX o principal e em muitos casos o único meio de
transporte se dava através da navegação fluvial. Para se ter uma ideia, até
meados do século XIX, uma viagem da província de Belém até a capitania de Rio
Negro (hoje Estado do Amazonas) levava 40 dias de viagem a barco. Essa situação
melhoraria em 1853 com a criação da navegação a vapor: durante os primeiros 300 anos da colonização
as viagens eram feitas em barcos movido à vela ou através do remo puxado pelos
bugres.
É possível
dividir a História da Amazônia em algumas grandes fases: (i) de 1500 e 1640
quando o território esteve em disputa aberta e as fronteiras indefinidas entre
as coroas de Portugal, Espanha, Inglaterra e Holanda; (ii) de 1640 quando há a
consolidação do domínio português até o declínio econômico e social causado
pelos cinco anos de guerra civil, até o término da revolta da cabanagem em 1840;
e (iii) a partir de 1850 com o advento da navegação à vapor e do ciclo da
borracha – a produção dos seringueiros inicia-se em 1860 e sofre um impulso
1895 com a criação do pneumático que seguiu à vulgarização do carro. Data de 1911
o apogeu e início do declínio da borracha, que só teria depois um pequeno surto
de recuperação durante a II Guerra para atender às demandas dos aliados.
Os primeiros
registros históricos de expedições do colonizador europeu na região amazônica
remetem às primeiras décadas do 1500. O Tratado de Tordesilhas (1494) era
bastante vago na delimitação das fronteiras da região norte do Brasil, tornando
difusa a presença de portugueses, espanhóis, ingleses e holandeses.
Inclusive, as
primeiras expedições oficiais de reconhecimento do território partiram da
Espanha – tendo como ponto de partida o Vice Reinado do Peru, em 1541 partiu de
Quito o espanhol Francisco Orellana com cinquenta e sete companheiros, descendo
o Rio Amazonas até sair no Atlântico.
A partir de fins
do século XVI, aventureiros ingleses e holandeses fazem viagens de
reconhecimento e instalam feitorias e pontos de negócio. E em 1616 partiu a
expedição portuguesa sob a chefia de Francisco Caldeira Castelo Branco, saindo
do Maranhão, tendo como objetivo tomar posse das terras do Grão Pará; foi assim
fundada a povoação de Nossa Senhora da Graça – núcleo da atual cidade de Belém.
Foi nesta
primeira fase que se criaram alguns mitos em torno do El Dorado amazônico: as
expedições respondiam a alguns mitos e histórias contadas pelos índios sobre
terras povoadas de ouro. Falava-se de terras longínguas na América onde o ouro
e a prata eram tão abundantes que os próprios indígenas não compreendiam a
importância dada a essa riqueza pelos europeus. Foi nessa primeira etapa das
expedições de reconhecimento do território amazônico que surgiram também alguns
mitos fundadores da região: na embocadura do Rio Jamundá (Nhamundá) começava a
boa terra e senhoria das Amazonas, mulheres lendárias e guerreiras que viviam isoladas
do seu senhorio, “eram alvas e altas”, apenas coabitavam de tempos a tempos com
os homens e só conservavam os filhos quando pertenciam ao seu próprio sexo.
Seria a partir
de 1640 que se consolidaria o domínio português na região do extremo norte
brasileiro. Desde meados do século XVII até meados do século XIX, a região
passou por uma fase de conquista e povoamento. Já em 1621 houve a criação do
Estado do Maranhão e Grão Pará, com jurisdição separada do resto do Brasil e no
ano de 1755 houve a criação da Capitania de Rio Negro, futuro estado do
Amazonas.
A conquista do
Acre é mais recente – ela foi produto de conflito de interesses entre a Bolívia
e seringueiros brasileiros que atuavam na região, passando a integrar o
território brasileiro após negociações diplomáticas conduzidas pelo Barão de
Rio Branco consolidada no Tratado de Petrópolis, firmado em 17.11.1903.
Papel
fundamental dentro desse processo de conquista e povoamento se deu através da
atividade das missões jesuíticas. Foram justamente nos aldeamentos onde se pode
desenvolver alguma atividade agrária mais duradoura, servindo-se do trabalho
dos índios. E após as reformas pombalinas que acarretaram a expulsão dos
missionários, os aldeamentos subsistiram através da criação de Diretórios – na
prática, foi colocado fim ao poder temporal dos padres, mas mantida a mesma situação
precária do índio.
A guerra da
cabanagem (1835/1840) colocou em oposição os tapuios (caboclos, filhos do
branco e do índio que falavam a língua tupi) e os reinóis – foram cinco anos de
guerra civil que causaram 40 mil mortos e o retrocesso da economia, ao abandono
e destruição das fazendas.
O ciclo da
borracha remonta à terceira e última grande onda de desenvolvimento da Amazônia.
Essa fase criou
uma nova composição populacional do território com a vinda massiva de
emigrantes do nordeste, fugidos da seca, que se lançavam nos mais desconhecidos
pontos da selva para exploração do ouro negro.
A revolução da
borracha foi acompanhada da utilização da navegação à vapor, um sistema de
transporte que facilitou o desenvolvimento da indústria, como ainda serviu como
meio difusor de ideias. Em seu apogeu, o ciclo da borracha levou ao
enriquecimento de uma elite local e ao desenvolvimento urbano de Belém e Manaus:
ficou conhecido como exemplo o suntuoso edifício do Teatro Amazonas inaugurado
em 1897 em Manaus.
Nos dias de
hoje, a Amazônia ainda carrega traços marcantes do seu passado.
Baixa densidade
populacional, composição étnica da população na figura dos tapuios e índios,
baixo desenvolvimento industrial, comunicações terrestres dificultadas pelas
longas distâncias e forte presença da economia coletora e extrativista,
contando agora com a expansão do agronegócio e da pecuária – ainda que no caso
da pecuária, o seu desenvolvimento na Ilha de Marajó remonta aos anos de 1600.
Muito de sua
riqueza ainda é desconhecida e um novo ciclo de desenvolvimento prescinde de um
combate político intransigente em face de Ongs financiadas pelo imperialismo
europeu e norte americano; são os interesses exógenos que remontam historicamente
aos assédios de contrabandistas holandeses, franceses e ingleses desde
1590/1640. Hoje, os grupos estrangeiros e os seus prepostos brasileiro visam
paralisar qualquer iniciativa oficial de exploração das riquezas naturais da
Amazônia, incluindo o Petróleo – sob a propaganda de defesa do meio ambiente e
do índio, o objetivo é manter a biopirataria e as formas clandestinas de
espoliação, sem prejuízo da criação de uma “reserva natural” que possa depois
servir aos países estrangeiros seja através de movimentos separatistas ou da
campanha em torno da “internacionalização da Amazônia”.

Nenhum comentário:
Postar um comentário