terça-feira, 28 de outubro de 2025

Uma História da Amazônia

 Uma História da Amazônia





Resenha Livro – “História do Brasil Geral e Regional – 1º Volume – Amazônia (Acre – Amazonas – Pará e Territórios)” – Ernani Silva Bruno – Ed. Cultrix

“Revelada à Europa a existência da América e descoberto o Brasil, a costa do extremo-norte brasileiro e as margens do baixo Rio Amazonas passaram a ser de longe e longe abicadas pelas caravelas de um ou de outro navegante castelhano ou português mais atrevido. Era a madrugada do século dezesseis, e o mistério das terras e das ilhas de aquém-Atlântico devia envolver ainda em um clima incomum e quase fantástico de aventura a jornada de veleiros que se botavam para o Novo Mundo. Mas permaneceu ainda por alguns decênios desconhecido pelo homem branco – e ignorado pela cultura do “mundo civilizado” da época – o segredo bárbaro das florestas, dos rios, das ilhas e dos nativos da região amazônica”.

Missionário franciscano e governador do Bispado da Bahia, Frei Vicente do Salvador (1564/1639) foi o primeiro cronista da História do Brasil. Escreveu sobre o território que então pertencia à colônia portuguesa em dezembro de 1627, pouco mais do que um século após a chegada de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro.

Ficou famosa a imagem com que Frei Vicente descreveu do processo de ocupação do território do Brasil nos primeiros anos da colônia: por negligência dos portugueses, mesmo sendo grandes conquistadores de terras, não se aproveitaram delas, contentando-se em “andar arranhando ao longo do mar como caranguejos”.

De fato, no primeiro século da colonização do Brasil, a ocupação do território limitou-se às regiões litorâneas, do norte ao sul – daí a conhecida analogia com a forma como se movem os caranguejos.

Essa situação se explica por razões econômicas: num primeiro momento, estabeleceram-se feitorias na costa, onde os navegadores transacionavam o pau brasil e especiarias. E a partir do século XVI houve a constituição dos engenhos de açúcar, também situados na costa, dada a proximidade dos mercados europeus. Há também as razões políticas:  a constituição das capitanias hereditárias em 1534 em núcleos portuários de norte ao sul teve como causa primordial resguardar o território em face dos assédios dos franceses, ingleses e holandeses. Ou mesmo antes, por meio do Tratado de Tordesilhas  (1494), quando foi atribuído à Portugal a parcela ao leste de um meridiano traçado a 400 léguas do arquipélago de Cabo Verde.  

O processo de interiorização da ocupação territorial do Brasil se daria de forma paulatina, a partir do 1600, seja através das expedições dos sertanistas paulistas na caça de índios para a escravidão, iniciando com a destruição de missões jesuíticas ao sul, ampliando as fronteiras do país; deu-se através da pecuária, especialmente na região do nordeste, servindo como mercado abastecedor das regiões portuárias; e finalmente através do ciclo da mineração, que também mobilizou os bandeirantes através de frentes pioneiras em direção ao centro oeste e norte – em 1651, tendo partido de São Paulo e transposto os Andes, a bandeira de Antônio Raposo Tavares desceu pelo Rio Amazonas.  

Quando falamos da região da Amazônia, o processo de ocupação populacional daquele vasto território, que abrange os estados do Acre, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima e Amapá, foi certamente o que encontrou maiores dificuldades.

Ainda hoje, a baixa densidade populacional é o traço mais característico da região.

A distância com os mercados europeus fez com que no período colonial houvesse pouco desenvolvimento da agricultura de exportação na Amazônia. Os índios, ao seu passo, além de frequentemente trucidarem os poucos colonos que tentaram ocupar a área, quando pacificados, também não se revelavam aptos e disciplinados ao trabalho do campo.

As grandes distâncias, na escala de milhões de km², aliada à vegetação fechada, com rios caudalosos, chuvas e alagamentos, onças, saúvas e morcegos, tornaram o ambiente inóspito para a formação de núcleos populacionais em torno de alguma atividade agrícola. Dada a inadaptação do índio ao trabalho na lavoura, prevaleceu a economia extrativista – e os poucos engenhos de açúcar da região, distantes dos centros consumidores, explicam a baixa presença da população africana (escrava) na Amazônia.

Dado interessante é que a abolição da escravidão na província do Amazonas ocorreu em 1884, quatro anos antes da Lei Áurea. O que se explica não por algum bom senso da classe dominante daquela província, mas pela pouca importância do trabalho escravo na região.

Do ano de 1500 quando surgiram as primeiras viagens de reconhecimento até meados do século XIX quando se abriu a etapa do ciclo da borracha, a economia da região Amazônia centrou-se em atividades coletoras e na agricultura de subsistência. A fonte de alimentação, seguindo a tradição do índio e do caboclo (“tapuia”) se dava através da caça, da pesca. Houve o desenvolvimento de alguns poucos engenhos de cana de açúcar, a produção do algodão, do cacau mas a predominância deu-se em torno da atividade coletora dos produtos das florestas, designadas “drogas do sertão” (castanha, anil, urucum e salsaparrilha).

Essa economia do tipo coletora e extrativista foi um fator de dispersão do povoamento e estabeleceu uma dificuldade crônica de criação de cidades ou vilas com alguma duração no tempo: encerrando-se determinado ciclo produtivo, as áreas eram logo abandonadas, o que se evidenciou de maneira dramática durante o período do ciclo da borracha, quando muitos tapuios abandonaram as suas fazendas para se lançar à extração da seringueira. 

Desde o período colonial até o século XX o principal e em muitos casos o único meio de transporte se dava através da navegação fluvial. Para se ter uma ideia, até meados do século XIX, uma viagem da província de Belém até a capitania de Rio Negro (hoje Estado do Amazonas) levava 40 dias de viagem a barco. Essa situação melhoraria em 1853 com a criação da navegação a vapor:  durante os primeiros 300 anos da colonização as viagens eram feitas em barcos movido à vela ou através do remo puxado pelos bugres.

É possível dividir a História da Amazônia em algumas grandes fases: (i) de 1500 e 1640 quando o território esteve em disputa aberta e as fronteiras indefinidas entre as coroas de Portugal, Espanha, Inglaterra e Holanda; (ii) de 1640 quando há a consolidação do domínio português até o declínio econômico e social causado pelos cinco anos de guerra civil, até o término da revolta da cabanagem em 1840; e (iii) a partir de 1850 com o advento da navegação à vapor e do ciclo da borracha – a produção dos seringueiros inicia-se em 1860 e sofre um impulso 1895 com a criação do pneumático que seguiu à vulgarização do carro. Data de 1911 o apogeu e início do declínio da borracha, que só teria depois um pequeno surto de recuperação durante a II Guerra para atender às demandas dos aliados.

Os primeiros registros históricos de expedições do colonizador europeu na região amazônica remetem às primeiras décadas do 1500. O Tratado de Tordesilhas (1494) era bastante vago na delimitação das fronteiras da região norte do Brasil, tornando difusa a presença de portugueses, espanhóis, ingleses e holandeses.

Inclusive, as primeiras expedições oficiais de reconhecimento do território partiram da Espanha – tendo como ponto de partida o Vice Reinado do Peru, em 1541 partiu de Quito o espanhol Francisco Orellana com cinquenta e sete companheiros, descendo o Rio Amazonas até sair no Atlântico.

A partir de fins do século XVI, aventureiros ingleses e holandeses fazem viagens de reconhecimento e instalam feitorias e pontos de negócio. E em 1616 partiu a expedição portuguesa sob a chefia de Francisco Caldeira Castelo Branco, saindo do Maranhão, tendo como objetivo tomar posse das terras do Grão Pará; foi assim fundada a povoação de Nossa Senhora da Graça – núcleo da atual cidade de Belém.

Foi nesta primeira fase que se criaram alguns mitos em torno do El Dorado amazônico: as expedições respondiam a alguns mitos e histórias contadas pelos índios sobre terras povoadas de ouro. Falava-se de terras longínguas na América onde o ouro e a prata eram tão abundantes que os próprios indígenas não compreendiam a importância dada a essa riqueza pelos europeus. Foi nessa primeira etapa das expedições de reconhecimento do território amazônico que surgiram também alguns mitos fundadores da região: na embocadura do Rio Jamundá (Nhamundá) começava a boa terra e senhoria das Amazonas, mulheres lendárias e guerreiras que viviam isoladas do seu senhorio, “eram alvas e altas”, apenas coabitavam de tempos a tempos com os homens e só conservavam os filhos quando pertenciam ao seu próprio sexo.

Seria a partir de 1640 que se consolidaria o domínio português na região do extremo norte brasileiro. Desde meados do século XVII até meados do século XIX, a região passou por uma fase de conquista e povoamento. Já em 1621 houve a criação do Estado do Maranhão e Grão Pará, com jurisdição separada do resto do Brasil e no ano de 1755 houve a criação da Capitania de Rio Negro, futuro estado do Amazonas.

A conquista do Acre é mais recente – ela foi produto de conflito de interesses entre a Bolívia e seringueiros brasileiros que atuavam na região, passando a integrar o território brasileiro após negociações diplomáticas conduzidas pelo Barão de Rio Branco consolidada no Tratado de Petrópolis, firmado em 17.11.1903.

Papel fundamental dentro desse processo de conquista e povoamento se deu através da atividade das missões jesuíticas. Foram justamente nos aldeamentos onde se pode desenvolver alguma atividade agrária mais duradoura, servindo-se do trabalho dos índios. E após as reformas pombalinas que acarretaram a expulsão dos missionários, os aldeamentos subsistiram através da criação de Diretórios – na prática, foi colocado fim ao poder temporal dos padres, mas mantida a mesma situação precária do índio.

A guerra da cabanagem (1835/1840) colocou em oposição os tapuios (caboclos, filhos do branco e do índio que falavam a língua tupi) e os reinóis – foram cinco anos de guerra civil que causaram 40 mil mortos e o retrocesso da economia, ao abandono e destruição das fazendas.

O ciclo da borracha remonta à terceira e última grande onda de desenvolvimento da Amazônia.

Essa fase criou uma nova composição populacional do território com a vinda massiva de emigrantes do nordeste, fugidos da seca, que se lançavam nos mais desconhecidos pontos da selva para exploração do ouro negro.

A revolução da borracha foi acompanhada da utilização da navegação à vapor, um sistema de transporte que facilitou o desenvolvimento da indústria, como ainda serviu como meio difusor de ideias. Em seu apogeu, o ciclo da borracha levou ao enriquecimento de uma elite local e ao desenvolvimento urbano de Belém e Manaus: ficou conhecido como exemplo o suntuoso edifício do Teatro Amazonas inaugurado em 1897 em Manaus.

Nos dias de hoje, a Amazônia ainda carrega traços marcantes do seu passado.

Baixa densidade populacional, composição étnica da população na figura dos tapuios e índios, baixo desenvolvimento industrial, comunicações terrestres dificultadas pelas longas distâncias e forte presença da economia coletora e extrativista, contando agora com a expansão do agronegócio e da pecuária – ainda que no caso da pecuária, o seu desenvolvimento na Ilha de Marajó remonta aos anos de 1600.

Muito de sua riqueza ainda é desconhecida e um novo ciclo de desenvolvimento prescinde de um combate político intransigente em face de Ongs financiadas pelo imperialismo europeu e norte americano; são os interesses exógenos que remontam historicamente aos assédios de contrabandistas holandeses, franceses e ingleses desde 1590/1640. Hoje, os grupos estrangeiros e os seus prepostos brasileiro visam paralisar qualquer iniciativa oficial de exploração das riquezas naturais da Amazônia, incluindo o Petróleo – sob a propaganda de defesa do meio ambiente e do índio, o objetivo é manter a biopirataria e as formas clandestinas de espoliação, sem prejuízo da criação de uma “reserva natural” que possa depois servir aos países estrangeiros seja através de movimentos separatistas ou da campanha em torno da “internacionalização da Amazônia”.  

 

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