segunda-feira, 22 de abril de 2019

“Manual de Direito do Trabalho” – Sérgio Pinto Martins


“Manual de Direito do Trabalho” – Sérgio Pinto Martins



Resenha Livro - “Manual de Direito do Trabalho” – Sérgio Pinto Martins – Ed. Saraiva Jur

O Direito do Trabalho no Brasil tem origem histórica no contexto da Era Vargas. O Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio foi criado em 1930, passando a expedir decretos e regulamentar o trabalho das mulheres (1932), o salário mínimo (1936)  e a Justiça do Trabalho (1939). Esta último foi até a constituição de Dutra uma instituição ligada ao Poder Executivo – e desde 1946 até o momento passou a justiça do trabalho a pertencer ao Judiciário como justiça especializada tal qual a justiça eleitoral e a justiça militar.

A primeira Constituição a tratar de direito do Trabalho foi a de 1934 (GV), garantindo ao menos formalmente a liberdade sindical, isonomia salarial, repouso semanal e férias anuais remuneradas.

Mas é importante destacar aqui que os direitos concedidos envolviam um contexto histórico de crise do sistema capitalista (com destaque para a quebra da bolsa de 1929) e a emergência de movimentos anti-capitalistas, com a consolidação da vitória da revolução russa na dianteira do movimento operário mundial. A regulamentação dos conflitos oriundos do capital e trabalho era uma exigência concreta e que envolvia não só a concessão, mas o controle da atividade organizada dos trabalhadores por meio do estado. Neste caso, o controle era exercido especialmente sobre os sindicatos.

Na constituição de 1937, influenciada diretamente pela Carta de Lavoro da Itália de Mussolini, a greve e o lockout são consideradas atividades antissociais, nocivos ao trabalho e ao capital e incompatíveis com os superiores interesses da produção nacional. (art. 139). Em que pese o direito de greve ser reconhecido e assegurado pela constituição de 1988, a própria legislação infraconstitucional, delimita o exercício do direito: a greve pela lei é considerada a “suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a empregador.” (art. 2º da Lei 7783/89).

A exata compreensão da evolução histórica do direito do trabalho certamente envolverá a contextualização do desenvolvimento das relações capitalistas no Brasil e no mundo. Sem capitalismo não há direito e direito do trabalho: a abolição da escravidão no Brasil extremamente tardia em 1888 fez do direito do trabalho na Brasil um fenômeno retardatário. As leis de trabalho se originam no contexto da revolução industrial, ainda que de forma tímida. O Tratado de Versalhes de 1919 prevê a organização da OIT (Organização Internacional do Trabalho) e revela uma comunhão de interesses das potencias do mundo quanto à questão social.

É sintomática que a maior alteração promovida pela CLT desde sua origem no ano de 1943 tenha sido no inverno de 2017, no Brasil pós golpe de estado, com a direita e a extrema direita na ofensiva política buscando executar um amplo projeto de contra-reformas neoliberais. Apenas para citar algumas barbaridades aprovadas pela reforma trabalhista:

O art. 394-A da CLT permitirá o trabalho da mulher gestante o trabalho em locais insalubres de grau médio ou mínimo mediante atestado médico. A NR 15 elenca entre outros como ambientes insalubres os que envolvem exposição ao calor, a raios ionizantes, a agentes químicos e limites de tolerância de poeiras mineirais. O atestado poderá ser dado ou não pelo médico da empresa.

O art. 452-A que traz à luz do direito formal o “bico” a que a CLT referiu-se como o trabalho intermitente, no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador. Neste período de inatividade o empregado não recebe salário. Diferentemente do sobreaviso e da prontidão. Vale disser, ao invés da lei postular a estabilidade das relações de trabalho e prestigiar sua formalização, fazendo valer o direito de todos ao trabalho digno, a lei que busca “modernizar as relações de trabalho” chancela o trabalho informal.

Uma contradição da própria norma aprovada envolve à extinção da exigência de homologação da rescisão contratual trabalhista. A antiga redação do art. 477 da CLT determinava a homologação da rescisão dos contratos junto ao sindicato ou qualquer órgão competente. Agora empregado e empregador estarão desobrigados da homologação junto ao sindicato, podendo acordarem em formalizar o desligamento na própria empresa, independentemente do tempo de emprego. Quem atua na área justrabalhista sabe que de 40% a 50% das verbas postuladas pelo trabalhados na justiça do trabalho envolvem verbas rescisórias, qual seja, os valores decorridos com o fim do contrato, como Aviso Prévio, férias proporcionais e vencidas, Multa fundiária de 40%, etc. Sem a homologação o mais provável são o aumento do inadimplemento dos empregadores e maior ajuizamento de reclamações trabalhistas. Insegurança que pode ser atenuada com o procedimento de quitação anual de débitos trabalhistas também prevista para reforma. O problema é que a quitação plena e irrevogável das verbas do termo vão se dar no curso do contrato de trabalho quando o empregado situa-se em situação de subordinação e, provavelmente, desmotivado em contestar os valores.

A possibilidade de redução de direitos previstas em lei por meio de negociação coletiva a partir do novo art. 611-A da CLT e as novas regras relativas à perempção e pagamento de custas de honorários sucumbenciais e de perito são exemplos de retrocessos aos trabalhadores no direito do trabalho e no direito processual do trabalho com a reforma trabalhista.

O que dizer da inatividade da classe trabalhadora brasileira diante dos ataques? Em primeiro lugar a situação do desemprego, da informalidade e da precarização do trabalho não é uma novidade e nem foi inventada pela reforma trabalhista. Seria errado crer que os trabalhadores saíssem ou saiam em defesa de direitos que nunca lhe foram efetivamente concedidos. E menos ainda em defesa do judiciário trabalhista e do estado capitalista que nada mais é do que um instrumento de dominação de uma classe pela outra. A destruição de direitos vinculadas a “modernização” das relações do trabalho é um capítulo da crise brasileira que, pelas suas próprias contradições, inevitavelmente caminha para a polarização e para o enfrentamento. Batalhas serão perdidas mas só à classe que produz pertence o futuro.

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