quarta-feira, 12 de junho de 2013

“140 anos da Comuna de Paris” – Milton Pinheiro (org)

Resenha livro 60 # “140 anos da Comuna de Paris” Ed. Outras Expressões. Uneb – Cemarx



               
Como se sabe a Comuna de Paris foi a primeira insurreição operário-popular da modernidade. O levante ocorreu entre 18 de março e 28 de Maio de 1871. Houve aqueles que entendessem ser o movimento dos comunardos uma extensão tardia das batalhas da revolução francesa. Sabe-se, nesse sentido, que o horizonte marxista, a perspectiva política difundida a partir da Associação Internacional dos Trabalhadores (1ª Internacional), era minoritária dentre os comunardos. 

Entretanto, o mais correto é interpretar aquele evento não como o último suspiro revolucionário da burguesia, mas como o primeiro grande levante dos trabalhadores da história. Suas lições permanecem atuais, especialmente considerando-se medidas que foram tomadas na perspectiva da superação das instituições jurídico-políticas típicas da burguesia e a criação de uma nova forma de poder, com representantes para executar tarefas políticas, de segurança e judiciária, por meio de mandatos controlados pela base, a qualquer momento revogáveis e a unificação dos corpos legislativos e executivos em um mesmo órgão. 

Enquanto assistimos José Dirceu e outros “companheiros” do PT e da CUT que “enricaram” como políticos profissionais, é mais do que nunca atual e necessário reivindicar a tradição da comuna que determinou que cada representante popular não ganhasse nenhum centavo a mais do que o salário de um operário comum

Em outro aspecto a Comuna de Paris vai além do âmbito jacobino e da Revolução Francesa e já se insere como parte da tradição socialista: seu internacionalismo consequente, fazendo com que belgas, alemães e comunardos de diversas nacionalidades não só estivessem nas trincheiras de batalha, mas assumindo em condições de igualdade os cargos de representação. Por outro lado, Marx, desde as cartas e informes da Associação Internacional do Trabalho, apontava para limitações daquele movimento. Uma delas foi a de não confiscar o Banco de Paris, que persistiu financiando a reação desde Versalhes, sem que os revolucionários tomassem-no de assalto.   Outra erro político importante foi o do movimento não ter, logo de início, aproveitado a dispersão e confusão no seio da burguesia francesa e seu governo de Thiers, tomando a dianteira e avançando sobre Versalhes, onde posteriormente seriarealocada a sede do governo da reação. Houveram levantes em apoio a Paris em algumas províncias, ainda que a maioria da população da França, camponesa, havia sufragado eleitoralmente apoio massivo ao governo que viria a trucidar a comuna de paris. Entretanto, com a tomada de Versalhes, criaria-se maior dificuldade para a reação se organizar, além de significar a ampliação da experiencia da comuna para além da cidade de Paris. 

A comuna e sua composição política 

A composição política mais importante daquele movimento envolvia os adeptos de A. Blanqui por um lado e militantes que tinham como norte político o proudhonismo, o cooperativismo e a construção de associações para o trabalho, por outro. Os elementos mais próximos da posição de Marx e Engels e da AIT eram, portanto, minoria na comuna de Paris.  É válido pincelar algumas informações sobre as correntes não marxistas daquele movimento. 

Os Blanquistas vinham de uma tradição política segundo a qual a transformação social não se apoiaria na mobilização independente e autônoma das massas e dos trabalhadores. Viam tal perspectiva como "obreirista". Entendiam que uma sociedade degenerada criava indivíduos e classes sociais igualmente degenerados, defendendo, assim, a criação de um núcleo político de militantes incansáveis, altamente disciplinados e coesos, que assumiria para si, enquanto partido político, a responsabilidade de dirigir a revolução e a sociedade pós-revolucionária.

Tratava-se portanto de uma corrente substitucionista exatamente na medida em que, ao não confiar plenamente na capacidade política dos trabalhadores e na sua auto-emancipação, tinham como estratégia um plano de assalto ao poder pelo alto e a tomada do poder por esta vanguarda de lutarores intransigentes e incorruptíveis, vanguarda  que deveria estar preparada para dirigir  a sociedade do futuro. Como se sabe, o substitucionismo de tipo “salvacionista” da corrente política de Blanqui não se confude com o marxismo e com o pensamento do próprio Marx, que desde a juventude já sinalizava para a centralidade do mundo do trabalho na conformação das sociedades e na capacidade das classes sociais agirem enquanto sujeitos históricos. A burguesia que atuou contra o feudalismo desde a revolução francesa agia como um sujeito histórico num momento em que sua intervenção era progressiva, de 1789 até 1848, com o encerramento momentâneo das lutas e revoluções democráticas e nacionalistas na Europa, deslocando a classe burguesa para o campo político da reação e elevando a classe trabalhadora como novo sujeito histórico com potencial revolucionário. (Não é a toa que o Manifesto Comunista foi escrito em...1848). 

Blanqui também se afastava do marxismo quanto à perspectiva de eliminação do aparato repressivo-ideológico do estado. Entre suas teses econômicas, defendia uma espécie de cooperativismo, a criação de associações profissionais de um mesmo ramo de produção, as Oficinas Nacionais, financiadas pelo Estado. O lucro seria dividido entre o Estado, os associados e para fins assistenciais ao restante da sociedade. Igualmente Proudhon, que polemizara em vida com Marx, também defendia as associações de trabalhadores para o trabalho e cooperativas. Não tinha uma clara delimitação de classes tendo sido acusado pelos comunistas de defender união entre operários e burgueses. Neste sentido, foi caracterizado pelo marxismo como um expoente do socialismo utópico. Entretanto, é importante apontar que Proudhon foi o ou um dos primeiros pensadores/ativistas a reivindicar a si mesmo a posição política de anarquista, buscando ressignificar o termo em um sentido não pejorativo.

Balanços da Comuna

A reação burguesa sobre a comuna de Paris foi Brutal. A França, que perdera a guerra para a Prússia, obteve de Bismarck autorização para liberação de dezenas de milhares de presos de guerra para reprimir a comuna. A semana sangrenta dividiu de um lado 100.000 homens do exército francês contra 15 000 milicianos defendendo a cidade. As tropas oficiais executaram 20 000 pessoas, número que, somado às baixas em combate, provavelmente alcançou a cifra dos 80 000 mortos. 40 000 pessoas foram presas e muitas delas foram torturadas e executadas sem qualquer comprovação de que fossem de fato membros da Comuna. As execuções só pararam por iniciativa da burguesia – ainda que desejosa de perpetuar o banho de sangue, mas com medo de que a quantidade imensa de cadáveres pudesse causar uma epidemia de doenças[1]

Alguns dos comunardos mandados para o exílio foram enviados para a Nova Caledônia, um arquipélago situado nos confins do oceano pacífico a 1500 km da Austrália. Fala-se que ainda hoje é possível observar nas paredes das antigas prisões onde estiveram os comunards riscos feitos a faca com os dizeres “Viva a Comuna” e “A Comuna não morreu”.   A esperança vida daqueles lutadores que se desafiaram a criar uma sociedade sob bases igualitaristas deve servir hoje como fonte de força e perseverança na luta pelo socialismo e pelo comunismo. 

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