quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Trotsky Hoje (Org. Ovaldo Coggiola) - Ed. Ensaio

Resenha Livro #39 Trotsky Hoje (Org. Osvaldo Coggiola). Ed. Ensaio



Após 61 anos de sua morte, Leon Trotsky ainda hoje é fonte de controvérsia, mesmo dentro da esquerda revolucionária. Dirigente do partido Bolchevique, líder do exército vermelho, participou ativamente das revoluções de fevereiro e outubro de 1917. Após a morte de Lênin, deparou-se com embates, não só frente à contra-revolução e os assédios do imperialismo diante da primeira experiência exitosa de uma revolução socialista no mundo. Deparou-se igualmente com graves embates com setores políticos dentro do movimento revolucionário. Viveu e morreu denunciando o processo de burocratização do poder político em URSS, que levaria à degeneração do projeto socialista em detrimento de um modelo político caracterizado por alguns como “estado operário degenerado” e por outros como “capitalismo de estado”.

O fato é que não é possível fazer uma crítica séria da experiência socialista no século XX desconsiderando Trotsky, seja no sentido de endossar suas teses, seja no sentido de negá-lo em bloco.

Como teórico, elaborou a idéia da “teoria da revolução permanente”, em contraponto à proposta stalinista da construção do socialismo em um país só. (A teoria da revolução em Trosky é “permanente” do ponto de vista vertical e horizontal: a revolução em Rússia passaria por “transcrescimento”, superando as tarefas democráticas das revoluções burguesas apontando para o socialismo (sentido vertical); a revolução em Rússia (e aqui Trotsky em nada se diferencia de Lênin) só seria vitoriosa com a repercussão e generalização de revoluções pelo mundo – o sentido "internacionalista" da revolução remete ao seu caráter também horizontal).

“Trotsky hoje” é uma coletânea de ensaios, feitos por ocasião do “Simpósio Internacional ‘Trotsky: passado e presendo do Socialismo”, evento realizado pelo departamento de História da USP em 1990. Destacam-se do texto, aliás, algumas projeções de debates dentro da esquerda então em voga naquele momento: o problema do desmoronamento da URSS, do fim do "socialismo real" e da crise do movimento socialista – crise que repercute e assombra a esquerda ainda nos dias de hoje.

Assim, os conferencistas abordam em particular as denúncias de Trotsky ao papel contra-revolucionário que o stalinismo jogou, particularmente no sentido de conter processos revolucionários no leste europeu e em China, articulando as críticas de Trostky aos problemas de então.

Outro ponto polêmico, abordado por alguns ensaístas e ainda hoje em aberto, refere-se ao significado histórico da derrocada do socialismo real – a “restauração capitalista” para alguns, sinalizaria um retrocesso, desde que, mesmo se admitindo os desvios do projeto socialista na URSS, tratar-se-ia ainda de uma experiência pós-capitalista. Salta a vista aqui a importância da análise/interpretação histórica do movimento socialista internacional já que cada perspectiva terá desdobramentos práticos bastante concretos, particularmente num momento de turbulência e confusão dentro da esquerda, como deve ter sido os anos de 1990.

Dentre os articulistas, destacamos o trabalho de Isabel Maria Loureiro, estudiosa de Rosa Luxemburgo e que busca encontrar pontos comuns entre o pensamento da revolucionária alemã e Trotsky. Para o revolucionário russo, os Sovietes correspondem à “organização-tipo” da revolução, enquanto Rosa igualmente destaca o caráter central da auto-organização espontânea das massas, apontando para uma relação entre socialismo e democracia. Outros artigos igualmente importantes foram escritos por intelectuais diferentes entre si como Jacob Gorender ( ex-PCB, aborda o caráter da revolução/golpe de estado na Rússia de 1917), Florestan Fernandes, Michel Löwy (que escreve um interessante ensaio sobre o aspecto da “fé” na revolução) e Esteban Volkov Trotsky (neto de Trotsky e autor de um informativo relato pessoal da vida familiar e íntima de seu avô, das relações entre seu grupo e o governo do México, da tentativa de assassinato e do dia em que o dirigente foi morto por agente de Stálin).

Citação Final


“Trotsky não pode ser compreendido como historiador ascético. Se muitas de suas análises e previsões se mostraram acertadas também para as gerações que puderam ver o desenrolar sucessivo dos acontecimentos, outras não o foram. Mas nenhum sentido teria um balanço de acertos e erros. Trotsky deve ser visto como era e quis ser até que a picareta de Ramón Mercader parou aquele cérebro destacado. Como procuramos destacar, deve ser compreendido como dirigente político revolucionário. Como homem de aão, que queria organizar e educar militantes para agir”.
(Tullo Vigevani – Trotsky: sua análise da segunda guerra mundial).

Não poderia ser melhor dito. Para além da lógica do "fla-flu", Trotsky deve ser visto a partir da sua contribuição teórica e prática confrontada com os movimentos (avanços e retrocessos) do socialismo no mundo – tema pelo qual dedicou sua vida. Isto significa agregar ideias ainda hoje atuais (como a teoria da revolução permanente), não desconsiderando o fato de Trotsky, como um homem de um determinado momento histórico, também estar eivado de contradições. Como todos nós.

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