terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

"O Capital" - Karl Marx



Resenha Livro # 49 – “O Capital – O Processo de Produção do Capital” – Livro I Volume I



Impressões decorrentes de uma visão panorâmica de “O Capital”

Ler a famosa crítica à economia política que é “O Capital” pode parecer ou dar a impressão de ser uma tarefa árdua. De fato, aqueles que tiveram contatos com obras de autores marxistas (ou autores que reivindicam algumas de suas categorias de análise), já devem ter ouvido falar em mais valia absoluta, mais valia relativa, capital constante, capital variável, força de trabalho, modo de produção, meios de produção e capital. E, de fato, “O Capital” é um livro essencialmente analítico e teórico, que se serve das experiências históricas apenas e na medida em que as mesmas ilustram o desenvolvimento de uma teoria, uma teoria para explicar a sociedade do capital, e, em última análise, interpretar o mundo em que vivemos. Em certas passagens estas teorias determinam verdadeiras leis econômicas. (Por exemplo, a determinação do valor da mercadoria a partir do tempo médio socialmente necessário de trabalho para a sua composição).

Ocorre que Marx, além de teórico da mais importante obra de análise crítica do capitalismo, foi, ele próprio, um militante comunista. (O fato de Marx ter participado da construção da 1ª Internacional e o aspecto “militante” da vida do velho Mouro, são sintomaticamente esquecidos por uma parcela da esquerda marxista “academicista”, exclusivamente engajada no debate teórico, sem qualquer compromisso com uma prática política cotidiana e consequente, uma efetiva intervenção na luta política colocando todo o saber e o conhecimento acumulado nas universidades à serviço das lutas e da organização dos trabalhadores).

Pois bem, voltando a Marx, o fato do velho Mouro estar efetivamente engajado nas disputas políticas e ideológicas (“batalha das ideias”) de seu tempo implicou em importante preocupação no sentido de que suas ideias fossem compreendidas, inclusive pelo mais humilde operário. É perceptível o esforço com que Marx tenta ser didático, mesmo quando aborda temas inicialmente bastante abstratos, como “o duplo caráter do trabalho materializado na mercadoria”  ou “a forma relativa de valor” e “a forma equivalente de valor”.

Todos estes conceitos vão sendo enunciados de forma quase exaustiva, por meio de exemplos abstratos ou exemplos da história do capitalismo na Europa, ou até mesmo por fórmulas matemáticas e expressões algébricas: é como se Marx fosse o professor que soubesse que o tema de sua aula é árido e de difícil compreensão, e, especialmente por isso, tenta ser o mais claro/didático possível.

Outrossim, Marx diferencia-se de toda uma tradição de economistas burgueses que são incapazes de ver as relações de exploração e de dominação de classes que existe, que são intrínsecas ao processo de formação de capital. Ao criticar a tradicional economia política burguesa, nestes momentos, a leitura pode ser um pouco mais difícil, já que ele discute temas candentes na época e no contexto por que passava a Europa do séc. XIX, destacando a revolução social introduzida para Revolução Industrial, a luta pela regulação da jornada de trabalho e os efeitos econômicos das distintas jornadas, as novas tecnologias de produção e suas implicações nas condições de vida da classe operária. A diminuição de extração de mais valia absoluta e aumento de extração de mais valia relativa, por meio da intensificação do ritmo de trabalho, sob jornadas de trabalho mais curtas, é relatada por Marx por meio de dados/relatórios oficiais sobre a classe de trabalhadores da Inglaterra a partir de meados do século XIX– o cenário descrito é de penúria, fome, péssimas condições de trabalhos, insalubridade no trabalho e nas instalações onde moram os proletários, jornadas de 10 a 12 horas de trabalho, e presença de crianças de até 5 anos de idade trabalhando nas fábricas.  

Estrutura da Obra

Tivemos acesso ao Livro I Volume I do Capital, publicado pela Ed. Civilização Brasileira, que trata da produção do capital. O Capital é uma relação social que pode ser descrita algebricamente como M (mercadoria força de trabalho) - D (retribuição monetária da força de trebalho correspondente ao mínimo necessário para a reprodução da força de trabalho - M' (valorização do capital por meio da extração de trabalho excedente, a chamada mais valia).

O Livro I foi o único publicado por Marx ainda vivo, e foi o único volume que contou com revisões do próprio autor. A edição da Civilização Brasileira contém o Prefácio da 1ª, 2ª, 3ª e 4ª Edições na Alemanha, além dos prefácios das edições francesas e Inglesas. No Livro 2, publicado em 1885, discute-se o processo de circulação do capital. O livro 3 trata do processo global da produção capitalista (1894) e, finalmente, o Livro 4 – publicado por Karl Kautsky – trata das Teorias da mais valia (1905).

A guiza de conclusão.

Não é nosso objetivo aprofundar cada um dos conceitos e das ideias originais introduzidas por Marx em “O Capital”. Neste ponto, vale ressaltar que a profundidade de diversas passagens do texto com certeza podem ser melhor apreendida a partir de esforço coletivo de leitura e debate da obra, por meio de um grupo de estudos, portanto, estudando e destacando trecho por trecho, destrinchando cada detalhe e buscando traduzir a crítica feita por Marx a partir da  atual conformação do capital: em que medida as análises de Marx permanecem atuais e dão conta de explicar, por exemplo, as crises cíclicas do capital? Como não participamos de tal “grupo de discussão” e como a nossa intenção com as resenhas é apenas a de introduzir o leitor às obras, convidá-lo a lê-las e provocar algum tipo de reflexão crítica, encerramos esta resenha com algumas passagens-chave, em que, por meio de sínteses, Marx dá algumas mostras de sua genialidade. Sua crítica ao capital é o que há de mais avançado em toda literatura da economia política dedicada à análise das sociedades modernas.

“Uma teoria que considera a moderna produção capitalista mero estágio transitório da história econômica da humanidade tem, naturalmente, de utilizar expressões diferentes daquelas empregadas por autores que encaram esse modo de produção como imperecível e final”.


“O reflexo religioso do mundo real só pode desaparecer quando as condições práticas das atividades cotidianas do homem representem, normalmente, relações racionais claras entre os homens e entre estes e a natureza. A estrutura do processo vital da sociedade , isto é, do processo da produção material, só pode depreender-se do seu véu nebuloso e místico no dia em que for obra de homens livremente associados, submetida a seu controle consciente e planejado. Para isso, precisa a sociedade de uma base material ou de uma série de condições materiais de existência, que, por sua vez, só podem ser o resultado natural de um longo e penoso processo de desenvolvimento”.


“A parte do capital, portanto, que se converte em meios de produção, isto é, em matéria-prima, materiais acessórios e meios de trabalho não muda a magnitude de seu valor no processo de produção. Chamo-a, por isso, parte constante do capital, ou simplesmente capital constante.


A parte do capital convertida em força de trabalho, ao contrário, muda de valor no processo de produção. Reproduz o próprio equivalente e, além disso, proporciona um excedente, a mais valia, que pode variar, ser maior ou menor. Esta parte do capital transforma-se continuamente de magnitude constante em magnitude variável. Por isso, chamo-a parte variável do capital ou simplesmente capital variável. As mesmas partes do capital, que do ponto de vista do processo do trabalho, se distinguem em elementos objetivos e subjetivos, em meios de produção e força de trabalho, do ponto de vista do processo de produzir mais valia, se distinguem em capital constante e variável. “      

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