OS PODERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
O tema dos poderes administrativos essencialmente se relaciona à análise das prerrogativas de que dispõem os agentes públicos para o exercício do poder do Estado e a consecução dos seus fins sociais.
Trata-se, portanto, de uma das
formas da exteriorização daquele que talvez seja o mais famoso princípio do
direito administrativo: o da supremacia do interesse público sobre o particular.
Decorre desse princípio que,
existindo conflito entre o interesse público e o interesse particular, deverá
prevalecer o primeiro, tutelado pelo Estado, respeitados, entretanto, os
direitos e garantias individuais expressos na Constituição, ou delas
decorrentes.
Os poderes da administração
pública, neste contexto, podem ser conceituados como uma prerrogativa especial
de Direito Público e instrumento dado aos agentes públicos para o exercício de
suas atividades legalmente estabelecidas, tudo no interesse da coletividade.
São sempre irrenunciáveis, ou
seja, devem ser obrigatoriamente exercidos por seus titulares.
Em se tratando de prerrogativas
que incidem sobre a propriedade e liberdade individuais, o exercício do poder
administrativo não deve ultrapassar certos limites definidos em lei, sob pena
de abuso de poder, seja por excesso, seja por desvio de finalidade.
Há o excesso de poder pela administração
pública quando o agente público, embora detentor legal da competência para a
realização de determinado ato, age desbordando os limites de sua competência,
invadindo área para a qual não possui competência.
Já o desvio de finalidade ocorre
quando o agente público realiza ato desvirtuando os fins que a norma legal
almeja. Por exemplo: quando uma autoridade pública decreta a desapropriação de
um terreno alegando utilidade pública, mas visando, na realidade, satisfazer
interesse pessoal próprio.
Pode-se dizer que os Poderes
Administrativos são o gênero dentro do qual há as seguintes espécies: (i) PODER
VINCULADO; (ii) PODER DISCRICIONÁRIO; (iii) PODER DISCIPLINAR; (iv) PODER
NORMATIVO; e (v) PODER DE POLÍCIA.
O PODER VINCULADO decorre das
situações em que a lei de forma exauriente determina que o agente público deve
necessariamente intervir de determinada forma, sem margem para
discricionariedade. Decorre da descrição exauriente no próprio texto legal que
não deixa margem para o agente público agir de forma diversa do que prescrito
em lei.
O exemplo mais conhecido é o da
concessão de licença. Quando forem cumpridos todos os requisitos legais para a
sua concessão, não pode o administrador público negar a entrega da licença,
razão pela qual está inteiramente vinculado à norma jurídica. A licença, em
outras palavras, não “cria” um direito. O direito à licença é pré-exeistente
mas inexequível enquanto Administração
não constatar os requisitos previamente previstos na lei. Havendo a observância
dos requisitos pelo particular, a entrega da licença é obrigatória, ou seja, é
um ato vinculado.
Já o PODER DISCRICIONÁRIO decorre
de autorização legal para que o agente público tenha certa margem de atuação
para estabelecer o motivo e o objeto do ato administrativo. Não é possível ao
legislador prever todas as situações fáticas que ensejarão a atuação da
administração, sendo por isso autorizado pela própria lei a possibilidade do
exercício de um poder discricionário, observado sempre o juízo de conveniência,
oportunidade, legalidade e proporcionalidade. O exemplo mais conhecido é a
concessão de autorização, quando o administrado de forma precária se vê
autorizado a exercer determinado Direito que pode a qualquer momento ser
revogado, caso seja conveniente e oportuno ao Estado.
Discricionariedade não se
confunde com arbitrariedade. A liberdade dada pelo poder discricionário não
autoriza o gestor público agir de forma contrária ou divergente à finalidade da
lei e ao interesse público.
O PODER HIERÁRQUICO está
relacionado à estruturação dos trabalhos da administração pública. Envolve a
distribuição e escalonamento dos órgãos, funções e agentes do Estado. Seus
objetivos são o de ordenar, coordenar e controlar as atividades da
administração. Servem ainda para corrigir erros através de atividade revisora
dos superiores por atos de seus subordinados.
O PODER DISCIPLINAR é aquele que
permite a aplicação de sanção ao agente público ou a todo aquele que esteja
vinculado à administração pública por relações de qualquer natureza. Trata-se da
faculdade de punir internamente as infrações funcionais de servidores e
qualquer outra pessoa de alguma forma relacionada à administrador público. A
aplicação da penalidade pode se dar não só para um servidor concursado, mas,
por exemplo, para particulares que tenham alguma relação com o Estado. É com
base no poder disciplinar que uma escola pública pode punir com suspensão ou
até expulsão um aluno com conduta inadequada.
O PODER NORMATIVO autoriza a
Administração Pública editar normas que explicam, complementam ou facilitam a
execução da lei. A norma editada pela administração pública serve para a fiel
execução da lei, não podendo ser contra legen ou ultra legen. Não
podem essas normas administrativas instituírem direitos e obrigações não
previamente determinadas em lei em sentido formal.
Hoje, fala-se igualmente em
princípio da juridicidade. Além de o administrador público estar adstrito ao
que diz a lei, deve igualmente observar com obrigatoriedade os princípios
contidos no ordenamento jurídico. A edição de um ato normativo, mesmo para
regulamentação de lei em sentido estrito, sem observância dos princípios da
impessoalidade, moralidade ou eficiência, não deve ser admitida.
Por fim, o PODER DE POLÍCIA
consiste na atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando
direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato,
em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos
costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades
econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade
pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos,
tudo nos exatos termos do artigo 78 do CNT.
Basicamente, por meio do poder de
polícia, a administração limita ou disciplina a ação, o direito ou a utilização
de bens em caráter individual em prol do interesse coletivo. Por meio do poder
de polícia, o Estado estabelece restrições ao exercício de determinadas
atividades ou direitos como a imposição pelo Município de obrigação de
construir ou derrubar muros caso haja dificuldade do trânsito em pessoas. Em se
tratando de uma limitação de direito individual para a consecução do interesse
coletivo, trata-se, novamente, de uma expressão direta da supremacia do
interesse público sobre o particular.
O poder de polícia pode ser
delegado a particulares?
A jurisprudência tradicionalmente
disse não a essa pergunta. Contudo, mais recentemente, o STJ adotou o
posicionamento pela possibilidade parcial do exercício do poder de polícia por
particulares, no caso, aplicação de multas de trânsito por sociedade de
economia mista. (RESP 817.534/MG).
Para a Corte, seria possível a
delegação quanto aos atos de consentimento e fiscalização, não sendo possível o
Estado delegar ao particular os poderes de editar normas e de aplicar sanções.
E, ainda, a delegação do Poder de
Polícia só pode ser feita para pessoas que integrem de alguma forma a
Administração Pública, como é o caso das empresas estatais.
DELEGAÇÃO DO PODER DE POLÍCIA |
|
Necessariamente por
pessoa jurídica que integre a administração pública, incluindo empresas estatais |
Somente é possível a
delegação dos atos relativos ao consentimento e à fiscalização. Em
consequência, os atos relativos à legislação e aplicação de sanção são
indelegáveis e permanecem na competência das pessoas jurídicas de direto
público. |
BIBLIOGRAFIA
DAMAZIO, Wagner. “Poderes Administrativos”. 2020.
Quadro: "Estudo Para Frei Caneca" - Antônio Parreiras
Paulo Marçaioli | OAB/SP 431.751 | Contatos: paulomarcaioli@gmail.com
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