quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

“O Homem” – Aluísio Azevedo

 “O Homem” – Aluísio Azevedo




 

Resenha Livro - “O Homem” – Aluísio Azevedo – Iba Mendes Editor Digital – www.poeteiro.com

 

 

Aluísio Tancredo Gonçalves Azevedo nasceu em 14 de abril de 1857 na cidade de São Luís do Maranhão.

 

Era filho de um vice-cônsul português, sendo certo que o próprio escritor futuramente abandonaria a literatura aos 38 anos, para virar diplomata, tendo servido na Espanha, Inglaterra, Itália, Japão, Paraguai e Argentina.

 

O nosso escritor, quando criança, não era exatamente de família nobre e abastada, mas certamente nunca passou por privações materiais.

 

No ano de 1871, Aluísio se matriculou no Liceu Maranhense à época dirigido pelo professor Francisco Sotero. No mesmo ano começou a ter aulas de pintura com o artista italiano Domingos Tribuzzi.

 

Em 1876 o escritor mudou-se para o Rio de Janeiro, lá permanecendo por dois anos. Trabalharia na imprensa carioca como caricaturista, se aperfeiçoando no desenho após obter matrícula na Academia de Belas Artes. Chegou a solicitar à Assembleia maranhense uma pensão para estudar em Roma, o que lhe foi negado.

 

Em 1878, com a morte do pai, Aluísio regressa a sua terra natal, onde colaborará nos jornais “Pacotilha” e “O Pensador”.  

 

Da pintura, passando pela caricaturista, é certo que a sua literatura teria alguma influência desta espécie de arte e manteria interfaces com suas charges: seja a proposta de uma narrativa objetiva que retratasse a realidade tal como ela é, seja na criação de tipos sociais com uma intencionalidade de promover crítica social e até mesmo humor.

 

“O Mulato” foi o segundo livro publicado pelo escritor maranhense, lançado no ano de 1881, mesmo ano, diga-se de passagem, da publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas de Machado de Assis.

  

Supracitada obra não guardaria a mais pálida semelhança com o primeiro trabalho do autor, chamado “Uma Lágrima de Mulher” (1880).

 

O primeiro livro ainda se pode caracterizar como romance folhetinesco, todo ele se situando inclusive na Itália, sem referências nacionais.

 

Já o segundo romance é tido por muitos como a primeira obra naturalista produzida no país, o que é discutível desde que o menos conhecido Inglês de Souza com sua proposta de literatura amazônica, já produzia livros naturalistas cerca de uma década antes d’o Mulato.

 

Em todo o caso, temos que o naturalismo literário praticado por Azevedo seria a mais representativa versão dos livros de Émile Zola no Brasil.

 

Dentro desta perspectiva, o homem olha objetivamente a realidade, sem enfeites de imaginação que, frequentemente, resultam da impossibilidade ou da impotência em explicá-la. Tal qual um cientista que analisa os fatos da natureza, o escritor naturalista expressa o mundo onde pousa os seus pés. O individualismo romântico é substituído pela descrição de tipos sociais que se confundem com o meio, o que é nitidamente observado no romance “O Cortiço”: o meio e o homem se fundem em uma única unidade.

 

Já os pressupostos teóricos da escola naturalista envolvem o positivismo de Comte, o intelectualismo de Taine, o determinismo, o darwinismo social e as teorias evolucionistas de Spencer.

 

Boa parte da crítica literária, capitaneada por Antônio Cândido, busca dividir a obra de Aluísio Azevedo entre os trabalhos propriamente naturalistas, que seriam os que alcançariam maior expressão e importância literária e outras obras de menor relevância, de tipo romântico, folhetinesco e mais comerciais.

 

Dentre as ditas “grandes obras” do nosso escritor temos “O Mulato” (1881), “Casa de Pesão” (1883) e “O Cortiço” (1890), este último considerado o melhor livro de Aluísio Azevedo.


O HOMEM  





“O Homem” (1887)  segue a mesma matriz naturalista, sendo um sucesso de público. Além do viés cientificista ligado à descrição de uma personagem acometida de histeria, o romance também envolve algo de experimental, já que a realidade se confunde com os sonhos da protagonista, que culminarão num fim trágico, com o assassinato de duas pessoas perpetrado por aquela que deixou de ser capaz de diferenciar o real das experiências imaginárias.

 

Magdá, a protagonista, é filha do Conselheiro Pinto Marques, reside no bairro de Botafogo no Rio de Janeiro. Lá viviam uma tia chamada Dona Camila e Fernando, um afilhado do patriarca.

 

Fernando e Magdá passaram a infância juntos, cresceram juntos, foram amigos e posteriormente se apaixonaram, fazendo promessas de que se casariam após a conclusão dos estudos do afilhado do Conselheiro.

 

Pouco antes de cumprir a promessa do casamento, Pinto Marques intervém, negando consentimento ao enlace. Neste momento, o Conselheiro foi obrigado a confessar que na verdade Fernando e Magdá são irmãos: o afilhado na verdade fora fruto de uma relação extraconjugal, fato que fora omitido até aqui, para se evitar escândalos.

 

Após a descoberta da verdade, Fernando decide se mudar para a Europa e Magdá fica em estado de prostração e melancolia.

 

Orientado pelo médico, o Dr. Lobão, o pai de Magdá se esforça para encontrar um casamento para a filha, que sistematicamente vai negando consentimento a todos os pretendentes.

 

Gradualmente, a protagonista vai manifestando aquilo que os médicos caracterizavam como histeria: Magdá inicialmente sofre ataques de nervosismo e manias de rezas. Pode-se frequentemente observá-la fazendo monólogos a meio voz e apresentando sobressaltos sem causas aparentes.

 

Em certo passeio com o pai, Magdá observa trabalhadores braçais de uma pedreira (cavoqueiros), com corpos másculos e bem definidos que a estimula a ter sonhos eróticos – nesta passagem, o livro foi particularmente atacado pela crítica.

 

Consta, efetivamente que o  Rio de Janeiro se viu escandalizado ao ler os devaneios eróticos da protagonista, descritos para tratar do tema da histeria feminina:

 

“O trabalhador que se ofereceu para conduzir Magdá era um mocó de vinte e tantos anos, vigoroso e belo de força. Estava nu da cintura para cima e a riqueza dos seus músculos, bronzeados pelo sol, patenteava-se livremente com uma independência de estatua. Os cabelos, empastados de suor e pó de pedra, caíram-lhe sobre a testa e sobre o pescoço, dando-lhe uma satírica feição de ingenuidade ingênua.

 

O rapaz passou um dos braços na cintura da Magdá e com o outro a suspendeu de mansinho pelas curvas dos joelhos, chamando-a toda contra o seu largo peito nu. Ela soltou um longo suspiro e, na inconsciência da síncope, deixou pender molemente a cabeça sobre o ombro do cavoqueiro.”

 

Magdá passa a ter sonhos com o cavouqueiro Luís, estimulada pela abstinência sexual, tida como “não natural” dentro das premissas naturalistas. Efetivamente, o médico Lobão insistentemente pressiona o conselheiro a casar sua filha para, objetivamente, fazê-la concretizar o ato sexual: o contrário disso é uma violação das leis da natureza.

 

Sem o casamento, agrava-se a histeria, passando a protagonista a expressar a sua concupiscência sexual quando dorme: através dos sonhos eróticos, o orgulho de mulher decente abre luta contra a degradante lubricidade e luxúria dos sonhos com o cavouqueiro.  

 

A despeito do escândalo causado pelo livro, “O Homem” foi um sucesso de público.

 

O Cidade do Rio (11 out. 1887, p. 1) noticiou que nas mesas das confeitarias na rua do Ouvidor só se falava do novo livro de Aluísio Azevedo. Cinco dias depois do lançamento já estava quase esgotada a primeira edição (A Semana, 15 out. 1887, p. 1), que se referia geralmente ao primeiro milheiro.

 

O sucesso do livro foi um feito excepcional para livros brasileiros, e foi através dele que o escritor foi convidado para integrar a editora Garnier, responsável pela publicação dos livros de Machado de Assis.

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